A vida de Abby foi minuciosamente planejada anos atrás. Hoje ela está noiva de um homem que possui todas as características que ela poderia desejar em um marido, seu curso de graduação é melhor do que ela poderia esperar e ela recebe a oportunidade...
O tilintar leve dos talheres no andar inferior é o que me acorda. As cortinas do quarto de Eddie ainda estão fechadas, mas ele não está ao meu lado como na noite anterior. Provavelmente já acordou e se juntou aos nossos pais. Dobro os lençóis rapidamente e passo em meu quarto para lavar o rosto antes de descer.
Escuto os barulhos comuns da casa, portas batendo, a grama sendo aparada no jardim e comida sendo mastigada, porém ninguém fala nada. Uma manhã habitual na casa dos Hendersons.
─ Aí está ela. ─ minha mãe anuncia quando eu chego à sala de jantar e o barulho dos talheres cessa.
Da cabeceira da mesa, meu pai ergue os olhos castanhos em minha direção e ensaia um sorriso frouxo que logo desaparece. Em seguida volta a ler o jornal em suas mãos. Ele está vestido como se estivesse prestes a sair, mas eu me pergunto se ele só voltou do trabalho agora. À sua esquerda meu irmão come uma torrada em silêncio e do outro lado minha mãe está fingindo selecionar algumas framboesas para colocar em seu iogurte. Todos nós sabemos que tem alguma coisa errada neste cenário, porém ninguém se esforça para tentar consertar.
─ Eu pedi para a Beth lavar a roupa que você trouxe ─ minha mãe diz sem tirar os olhos da tigela e eu acho engraçado ela estar se esforçando para falar alguma coisa. ─ Você pretende ir embora ainda hoje?
─ Não. ─ ao me ouvir ela levanta as sobrancelhas e eu tento pensar em algo convincente para dizer. Sei que ela me repreenderia se eu dissesse que tive problemas com meu colega de quarto e resolvi fugir durante o final de semana. ─ Eu quero levar o carro ao mecânico, preciso dele para andar na cidade.
─ Lamento que seu pai não tenha feito isso por você ─ ela o repreende sutilmente. ─ Você acha que depois de consertá-lo estará livre?
─ Não sei. ─ eu me assusto ao imaginar o que minha mãe está prestes a falar.
─ E quando você vai saber Abigail? ─ suspira. ─ Nós precisamos começar a fazer os acertos para o casamento. Você já escolheu uma data?
Eu me detenho no meio do caminho até a mesa, torcendo para que ninguém repare na minha hesitação. Andrew e eu combinamos que iríamos marcar o casamento para depois das minhas provas, mas não definimos nada.
─ Planejamos a cerimônia para o mês de dezembro.
─ Daqui a quatro meses? Abigail, vai ser muito difícil conseguir gente competente em tão pouco tempo. ─ ela leva uma mão até a testa e suspira dramaticamente. ─ Vou falar com meus contatos e ver o que eu consigo fazer. Você quer visitar uma loja de noivas comigo mais tarde? Encontrei alguns modelos fabulosos e você vai ficar linda neles, só precisamos decidir o melhor. Também mandei fazer alguns modelos de convite para você ver.
─ Você fez tudo isso sem considerar a minha opinião?
─ Você é minha filha e eu sei o que você gosta. O que você acha de realizar a festa no clube? Seu pai pode falar com Clarice Morris. Sei que o prazo é curto, mas ele tem bastante influencia na diretoria do clube, não é Ronald?
─ O que você disse, Ellen? ─ Meu pai finalmente tira os olhos do jornal.
─ Francamente, qual é a dificuldade em deixar seus problemas de lado por dois segundos para prestar atenção na sua família? ─ Minha mãe pergunta com raiva. Apesar de manter o rosto inexpressivo, sua voz é grave o bastante para enfurecer meu pai.
─ Talvez porque eu preciso resolver esses problemas para ter como sustentar a minha família? ─ ele rebate e eu percebo que os dois estão prestes a começar uma discussão.
─ Pessoal, ─ intervenho e eles voltam a me olhar como se nada tivesse acontecido.
─ Ah, claro. Eu estava dizendo que você poderia tentar alugar o espaço do grande salão para o casamento. ─ minha mãe finge tirar uma linha invisível de sua calça de ginástica.
─ Sim. Vou falar com a Clarice ainda hoje, Abby. ─ satisfeito, meu pai se levanta e leva o jornal para seu escritório.
Volto minha atenção para Edward, que até o momento estava nos estudando em silêncio. Seus olhos estão mais tristes que o normal e eu me pergunto se tem sido assim desde que eu o deixei.
─ Abby, eu sei o quanto você está ocupada com os estudos, por isso decidi fazer uma busca inicial. Procurei por algumas empresas cerimoniais e fiz algumas pesquisas. Eu não quero que você se preocupe com isso, porque eu estou aqui para te ajudar.
Pelo sorriso insistente em seus lábios finos eu percebo que ela está sendo sincera. Esta é a primeira vez em minha vida que ela se preocupa em fazer algo por mim e por este único motivo eu concordo. Sei que quando se trata de eventos ela é a melhor pessoa para se trabalhar, pois ela vive para esse tipo de coisa e ter a chance de exibir sua família em um casamento é imperdível.
─ Obrigada por confiar em mim.
Ela se levanta satisfeita e caminha até mim. Por um minuto eu tenho a impressão de que ela irá me abraçar e sinto meu peito acelerar. Sem saber o que fazer, eu sorrio e apanho uma maçã na fruteira.
─ Obrigada, mãe. Eu vou sair agora para consertar logo o carro.
─ Tudo bem. ─ tenho a impressão de ver mágoa em seus olhos, mas ela se recompõe rapidamente. ─ Eu tenho hora marcada na academia do clube e depois vou almoçar com as meninas. Tchau, querida.
Ela passa por mim, deixando para trás o rastro de seu perfume chique. Meu irmão solta um suspiro frustrado à mesa e se levanta.
─ Eddie, ─ corro atrás dele e paramos no meio da escada.
─ Eu vou jogar um pouco. Ontem à noite o meu clã foi atacado por inimigos e agora a nossa guild está toda online para acabar com eles. Vou ficar ocupado o dia todo.
Sem entender muito do que ele diz, eu finjo que concordo e o deixo voltar para o quarto. Meu pai passa por mim sem se despedir e deixa a casa, minutos depois de minha mãe ter saído.
Sabendo que eu ficarei sozinha pelo resto do dia, apanho algumas das roupas que ficaram em meu armário e em seguida chamo o mecânico para trocar os pneus do carro por um conjunto novo. Quando ele finalmente termina, no meio da tarde, eu penso na possibilidade de dirigir até a casa de Barbara e convidá-la para ir à piscina do clube aproveitar os últimos dias de verão, porém desisto da ideia imediatamente. Ela provavelmente iria recusar, não apenas pelo clube trazer lembranças de Zander, mas também porque ela deve estar aproveitando o pouco tempo que tem com os pais.
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