Capítulo 6

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6 dias para o Natal

O único problema de vir para casa antes das férias do Luca é que os cinco quartos se transformam em dez, o loft vira um prédio de vinte andares, os fantasmas do sótão acordam e todos fazem barulho ao mesmo tempo. Acho que tem a ver com a história dessa casa.

Eu e Tom morávamos com Victor, Tommy e Angie em um apartamento espetacular na cidade, perfeito para pessoas ricas e sem filhos que queriam aproveitar a vida de Londres. Coisa que não éramos. Ok, éramos ricos, mas tínhamos filhos, aliás, três deles. Era muito conveniente para o Tom, que pouco parava em casa e que não tinha, ao contrário de mim, de pegar o carro cada vez que quisesse levar as crianças para tomar ar fresco, mas eu comecei a obcecar que queria uma casa com jardim, um quintal com balanços, tanque de areia e casa na árvore e, do mesmo jeito que quero uma corça no Natal, passei a perturbar tanto o Tom que terminamos aqui.

A Linda Casa foi um presente de aniversário, concebida e reformada (inúmeras vezes) para se tornar um lar. Meus filhos cresceram e foram felizes aqui, Luca nasceu nessa mesma sala, Victor, Angie e Tommy cruzaram essa porta para ir à faculdade, e o fato de Lily ter cruzado a porta do Tom, e não a minha, é uma ferida que ainda está aberta no meu instinto maternal. E agora Luca quer fazer o mesmo, e o pior, em um país que nem é o dele, em um apartamento que foi alugado com o único intuito de eu fazer tratamento. Com meu bebê ruivo finalmente crescendo, termina minha missão de mãe e Deus, e fico me perguntando se não seria arriscado demais ter mais um filho na minha idade para eu continuar brincando de casinha.

Não é que eu não goste da Suíça. Mas não faço amizades com facilidade e não consegui formar nenhum relacionamento duradouro, mesmo que quisesse. É que sempre tive a impressão de que estava lá de passagem. Talvez fosse a forma que encontrei para lidar com o fato de estar longe dos meus bebês morenos, de ter separado Eddie de Emily, de ter separado Luca dos irmãos e dos amigos com quem cresceu. Eu passei esses dois anos dizendo: "Tudo bem, é por pouco tempo", como forma de aliviar a minha consciência e me recusei a criar qualquer tipo de raiz em Uster. Quando me referia à casa, sempre tinha essa em mente, a "casa eterna", como a Lily diz.

Estou encarando a geladeira, pensando no que posso comer e lembrando da época em que a cozinha vivia cheia, todo mundo falando ao mesmo tempo, Eddie queimando ovos, Victor invariavelmente derramando leite no balcão, Angie dando uma bronca em Tommy porque ele havia feito algo errado (e ele sempre fazia), Emily e Lily cantando, Rosa, nossa empregada na época, ouvindo o rádio nas alturas, cachorro latindo, quando escuto alguém tentando abrir o portão. Imediatamente meu coração acelera e pego uma faca de cortar carne enquanto tento lembrar onde deixei meu celular para ligar para a polícia.

-Não dava para ter aberto mais rápido? Vai estragar a surpresa!

-O que vai estragar a surpresa é você berrando! Como eu ia saber que o alarme estava desligado?

-Olhe a hora, cabeção! Por que ele estaria ligado?

Mas são os ladrões com as vozes mais adoráveis do mundo!

A constatação imediatamente me leva a fazer contas, o que por sua vez me leva a enfiar minha cabeça novamente na geladeira, e fico encarando as prateleiras como uma péssima atriz até que escuto a porta abrir com escarcéu e quatro pessoas falarem:

-Supresa! Feliz aniversário!

Meus bebês!

Lily segura um bolo lindamente confeitado, enquanto Tommy traz uma garrafa de Coca-Cola e um presente debaixo do outro braço e, Angie e Emily, mais presentes. Eu levo a mão ao peito e digo, afetada:

-Não acredito! É meu aniversário?

-Para, mamãe, que a gente sabe que esse ano você lembrou – Lily fala.

Quando Dezembro ChegarWhere stories live. Discover now