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Foi tudo culpa dela. Foi ela quem insistiu para que ela e Fernanda saíssem essa noite para desestressar. Foi ela quem arrastou sua melhor amiga de anos e colega de quarto há cinco anos para a boate mais badalada do Rio. Ela nem conseguia mais lembrar o nome. O chamavam de Zag ou Bug ou algo criativo do gênero americanizado. Todas eram a mesma coisa de sempre; escuras, barulhentas e cheios de gente que ia desde anônimos a jovens estrelas globais, que era o caso de Pitel e Fernanda, hoje já estabelecidas com suas carreiras.

De qualquer forma, era ali que algo estava prestes a acontecer. Ali era onde Pitel finalmente explodiria e mataria alguém com golpes de defesa pessoal que aprendeu quando mais nova. Tudo parecia estar a levando a isso; ela estava bêbada o suficiente, Fernanda tinha sumido para ir ao banheiro, e o cara musculoso que tomou o lugar de Fernanda no bar ao lado dela era apenas mais um olhar de desejo sobre Pitel que ela não gostaria de estar recebendo.

Ele era enorme, estava claramente suado e cheirava a cerveja misturada com alguma colônia barata. Mesmo se ela fosse hétero, jamais encostaria nesse cara. Mas ele estava completamente alheio a sua falta de interesse; se achava, estava todo presunçoso, sorrindo com dentes à mostra e piscadas lentas, falando sem parar sobre conseguir um papel de figurante numa próxima novela.

Pitel sempre guardava um anel no bolso para situações como essa. No momento em que o autoproclamado galã a encarou, ela discretamente deslizou o anel para seu dedo anelar. Agora era a hora. Seu trunfo.

"Você quer ir para um outro lugar?" ele perguntou, inclinando-se sobre ela e aproximando-se até demais com seu hálito de cerveja.

Pitel deu uma risada forçada. "Desculpe, mas eu já sou comprometida" ela disse mexendo a mão esquerda em frente ao rosto dele e se afastando. "Sou noiva."

Ela viu seus olhos se focarem no anel e suas sobrancelhas se arquearam até a testa. Ela prendeu a respiração. Geralmente isso bastava. Geralmente o cara recuava quando pensava que ela pertencia a outra pessoa, o que a deixava furiosa, mas certamente era útil em momentos como esses.

Mas não para o pseudogalã. Não, esse idiota teve a audácia de sorrir para ela e se inclinar mais para perto.

"Comprometida não quer dizer casada", ele disse sorrindo sugestivamente e Pitel se encolheu. "Além disso, não o vejo em lugar nenhum."

Era isso. Pitel iria para a prisão por matar esse cara com seus punhos pequenos.

"É porque ela está bem aqui." Pitel ficou tão aliviada com o som da voz rouca de Fernanda que quase caiu da banqueta do bar.

Lá estava ela, toda de preto e batom vermelho, abrindo caminho entre Pitel e o cabeça de vento com uma sobrancelha arqueada e uma carranca no rosto. Sua mão pousou no joelho de Pitel, apertando-o gentilmente, em um gesto destinado a tranquilizar Pitel e dissuadir o pretendente.

Pitel sorriu quando notou o anel combinando no dedo anelar de Fernanda.

Há algum tempo, Fernanda havia tomado para si um par de anéis de sua mãe e desde então elas os usavam para afastar possíveis perseguidores sem noção. Embora essa fosse a primeira vez que usavam em conjunto.

"Nanda", Pitel suspirou aliviada e Fernanda lhe deu um sorriso breve antes de voltar sua atenção para seu novo amigo inconveniente.

O homem tinha tropeçado um pouco quando Fernanda o empurrou para fora do caminho, mas agora ele havia recuperado o equilíbrio e estava olhando entre elas lentamente.

"Perdeu alguma coisa aqui?" Fernanda exigiu, encarando-o. Seu sotaque incisivo e duro marcava as palavras. As pessoas mais próximas a eles no bar pareciam estar notando o conflito em potencial e Pitel avistou pelo menos dois smartphones apontados para eles.

Amanhã, outro diaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora