Me sinto com a orelha atrás da porta, com o copo cravado na parede para ouvir. Uma sensação ligeira de que estou roubando um espaço íntimo. Um exercício de confiança e sensibilidade este que você me trouxe. Tenho a predileção em passar muitas horas do dia, quando consigo ter esse dia, decorando cartas de pessoas e ouvindo suas entrevistas. A carta consegue alcançar uma vocalidade, ela tem um jeito de encostar o sopro no ouvido. É teatral. A carta é uma eventualidade dramatúrgica porque ela já inaugura uma licença para ser lida em voz alta. Uma carta alarga o nosso imaginário porque entre as palavras temos a paisagem daquela pessoa que nos enviou, temos o cheiro, temos o tom mais adequado para ler cada frase. Tem outra coisa que existe em uma carta que me deixa muito interessado: ela é diretamente endereçada, ela é enviada para uma pessoa exclusiva.