Philip está em pé de costas do outro lado do corredor, e Loki está sentado ao lado dele. Assim que ouvem movimento, eles se viram.
— Podem ir, eu falo com ele — digo para Lucas e Mere.
— Certeza? — Lucas pergunta. — Não quer que a gente fique?
O Philip é muito reservado, não quero que ele se sinta constrangido. Além disso, Mere e Lucas devem estar exaustos, é melhor eles descansarem um pouco, nunca sabemos quando vamos precisar dos dois de novo.
Além disso, o Lucas deve estar ansioso para encontrar a mãe e o irmão. Espero que eles já estejam aqui.
— Sim, é melhor deixá-lo mais à vontade — digo baixinho para que ele não me ouça.
Os dois concordam e se afastam, enquanto Philip caminha devagar na minha direção.
— Como ele está? — apressa-se a perguntar.
Olho para Loki que o acompanhou e tem olhos questionadores, como se estivesse esperando a minha resposta ou como se tivesse certeza que eu sei onde está o dono dele.
— Está bem, mas bastante sedado agora — respondo. — Apesar de tudo, ele teve sorte. O tiro no abdômen foi de raspão, e não tivemos problema para remover o projétil da perna. Também havia muitos cortes nos braços, nas costas e no rosto, alguns ainda estavam com pedaços de vidro.
— Vidro? — pergunta confuso.
— Sim! Parecia vidro de janela do carro. Mas só vamos saber quando falarmos com a Clairy e a Lisa.
— Certo.
— Ele teve que levar pontos até no rosto, mas foi perto da sobrancelha, não vai ficar muito visível a cicatriz.
Philip parece engolir em seco e não sei exatamente o que significa a expressão no rosto dele: se está aliviado pelo Thomas estar fora de perigo ou aterrorizado por ele ter passado por tudo isso.
Eu me pergunto se ele faria tudo igual de novo, se colocaria o Thomas nesta situação para ajudar uma pessoa que ele acabou de conhecer.
— Quanto tempo vai demorar para ele se recuperar? — pergunta.
Lembro-me do tiro de raspão que levei na perna e foram necessárias algumas semanas para eu voltar a andar sem mancar e sentir dor. Por isso, tenho certeza que a recuperação do Thomas será ainda mais dolorosa, já que a bala realmente se alojou no corpo dele.
— Algum tempo — digo, sem conseguir conter um suspiro, porque sei o que isso implica. — Vai depender do repouso que ele tiver.
— Repouso? O Thomas? — ele dá um sorriso que não chega aos olhos. — Ele não consegue ficar parado.
— Com uma muleta ele vai conseguir andar em breve, mas quanto mais forçar, maior será o tempo de recuperação.
— E ele vai ter que ficar aqui?
Sinto que ele não quer ouvir uma resposta positiva, mas não posso fugir da verdade.
— Receio que sim.
— Não só pelos ferimentos, mas por ele poder saber a nossa localização, certo? — pergunta.
Balanço a cabeça de forma afirmativa.
— Mas vamos nos reunir ainda com o Nathan e decidir o que fazer em relação a isso, está bem? Não sabemos se até onde ele viu o caminho, se viu os mapas. Talvez não seja preciso — digo para tentar animá-lo.
— Ele não vai facilitar a nossa vida se vocês o prenderem aqui.
Lembro-me de quando passamos o mesmo com o Kyle, mas eu sei que o Thomas é diferente.
— Nós vamos encontrar um jeito de fazê-lo acreditar que é para o bem dele. — A expressão no rosto do Philip é de total descrença de que vamos conseguir isso. — Você quer entrar para vê-lo? — pergunto mudando de assunto.
— Não. — Apesar da negação, a insegurança na voz dele me diz o contrário. — Eu não... — ele para de falar hesitante, como se estivesse decidindo se me diz a verdade ou não —, eu não queria ter que falar com ele.
— Ele está dormindo — digo. — Você pode apenas vê-lo para ter certeza de que está bem. Talvez, isso faça você se sentir menos culpado.
Sou sincera demais.
Mesmo não conhecendo tão bem o Philip, eu já gosto dele ao ponto de me sentir triste por toda esta situação. Queria que ele se sentisse melhor.
Então, ele respira fundo e assente.
Andamos de volta até a porta onde o Lucas deu ordem para um soldado ficar e não deixar ninguém entrar.
— Você tem certeza? — o soldado me pergunta. — Pode ser perigoso e você sabe que tenho ordens para não deixar ninguém visitar o prisioneiro.
— Ele não é um prisioneiro — apresso-me a dizer. — E não estou sozinha.
Ele me olha cheio de incertezas, mas, por fim, concorda:
— Tudo bem.
Abre a porta descontente e nos dá espaço para passar.
— Você também pode entrar— digo, fazendo um carinho na cabeça do Loki que me olha nos olhos.
Eu toquei em alguns cachorros antes, mas pequeninos.
Este é grande, e se ele não tivesse essa cara de bobo, seria bastante assustador.
Os pelos do peito e das patas são brancos, assim como da metade do focinho dele. Em cima dos olhos, há dois pontos dourados que se destacam no pelo preto da cabeça que se estende pelo resto do corpo.
É lindo e meigo, e só consigo pensar em como ele não combina com o Thomas.
— Ele não tentou resistir? — Philip pergunta curioso enquanto paramos na porta. Dou um pouco de álcool em gel para ele passar nas mãos e faço o mesmo nas minhas.
Ele não estava por perto quando o trouxemos para a enfermaria, provavelmente deve ter ido alimentar e dar água para o cachorro. Ou apenas não queria ter que falar com o Thomas naquele momento ou não queria vê-lo sofrendo.
— Tentou — digo, esforçando-me para não mostrar como foi difícil. — Principalmente quando ele viu o Lucas. Mas estava fraco demais para conseguir nos impedir.
Loki cheira o cotovelo do Thomas que está um pouco do lado de fora da maca e, a seguir, deita em baixo dela, esticando as duas patas da frente e pousando a cabeça nelas.
Meus olhos sobem para o mercenário mais procurado de Gaia.
Os braços tatuados estão pousados ao lado dele que usa uma bata azul. Meus olhos correm para o rosto e só agora tenho uma noção da beleza dele.
A pele do rosto não apresenta nenhuma imperfeição, com exceção dos pontos no corte próximo à sobrancelha. O cabelo loiro quase branco brilha com a luz. Encontro um pequeno inchaço na têmpora, onde provavelmente amanhã veremos um hematoma.
Observo o Philip se aproximar hesitante da maca e tentando não fazer nenhum barulho.
Aproveito para regular um pouco o soro que está pingando muito devagar, mas não consigo deixar de notar o que o Philip faz.
Ele toca a mão do Thomas.
Os dedos dele sobem pelo dorso da mão de forma carinhosa enquanto encara fixamente o rosto dele. Ele fecha os olhos por alguns segundos e se afasta quando o Thomas se mexe um pouco, assustando-o.
Philip dá uns passos para trás e eu tento não fazer nenhum barulho também.
Na mesa ao lado dele, tem uma bandeja com todos os acessórios que o Thomas estava usando: anéis, brincos, pulseiras, cordão.
Philip olha para os objetos e permanece calado, mas então algo chama a atenção dele.
Ele retira uma peça e a olha com curiosidade.
É um anel preto cravado com pedras que parecem diamantes.
— Ele estava usando isso? — quer saber.
— Sim.
— Em qual dedo? — a pergunta parece que sai mais ansiosa do que ele queria, mas agora ele não tem mais tempo para se arrepender.
E eu não sei se minto dizendo que não fui eu quem tirou os anéis dos dedos do Thomas ou se digo a verdade. Eu sei porque ele está perguntando, é uma típica aliança.
E a verdade pode machucar o Philip.
Eu não quero dar uma notícia que ele não vai gostar. Não quero dizer que o anel estava realmente no dedo de compromisso.
Porque eu não sei o que ele e o Thomas são.
Então penso que ele próprio pode ter dado o anel e, por isso, o reconheceu.
Decido ser um pouco indiscreta para poder saber que resposta dar para ele.
— Foi você quem deu o anel? — pergunto, tentando parecer casual, mas sinto o rosto corar.
— Foi — responde. — Eu não sabia que ele ainda o usava.
Então decido falar a verdade. Se ele tivesse dito que outra pessoa tinha dado o anel, eu omitiria.
— Estava no dedo do compromisso — digo.
Desvio o olhar do rosto dele, mas ainda consigo ver os olhos brilharem.
Então o Kyle estava certo, eles tiveram um relacionamento. E fico curiosa para saber como isso aconteceu.
Como um soldado, alguém como o Philip, tem qualquer tipo de relacionamento com um criminoso? E não parece ter sido algo casual, marcou o Philip, e esse anel também diz que marcou o Thomas.
Nesses momentos que eu queria ter a indiscrição do Kyle e da Mere e tentar descobrir o que aconteceu, mas eu apenas mudo de assunto.
— Vamos agora? — pergunto. — Precisamos nos reunir com a Clairy e a Lisa para saber o que aconteceu.
Eu também quero saber se o Nathan já voltou. Tenho certeza que ele teria me procurado se já estivesse na Fortaleza, e isso me causa um frio na barriga.
— Claro — Philip responde.
Sinto que algo nele mudou depois de saber do anel.
— Você pode guardar os pertences do Thomas? — pergunto baixinho enquanto pego no armário uma caixa pequenina. — É melhor não corrermos o risco de perder nada.
— Você tem razão. — Ele começa a guardar os acessórios tentando não fazer barulho. — Há coisas aqui de valor sentimental para ele.
Depois de tudo guardado, confirmo se está tudo bem com o soro e andamos até a porta.
Philip chama o Loki uma vez, mas ele apenas levanta a cabeça. Então chama a segunda e, apesar de ele se levantar, anda devagar na nossa direção, quase como se não quisesse deixar o Thomas sozinho.
Ele olha uma última vez e respira fundo antes de fechar a porta.
Gave my all and more
But I need room to be me
You're my all and more
But I need room to breathe
Eu dei tudo de mim e mais
Mas eu preciso de espaço para ser eu mesmo
Você é tudo para mim e mais
Mas eu preciso de espaço para respirar
(Breathe | Lauv)
E então, esse novo casal?
Thomas não tirou o anel, fez um favor pra Resistência por causa do Philip... Algum palpite sobre o que aconteceu a esses dois?
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