Um CEO de Natal

By raiosouza

7K 1K 253

Dean Rodwell odeia o natal. O CEO da Rodwell Inc nunca gostou de comemorar o caos natalino e faz de tudo para... More

.
personagens
dedicatória
Introdução
Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capitulo 11
Capitulo 12
Capitulo 13
Capitulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16

Capítulo 2

490 69 27
By raiosouza

Dean Rodwell

O banheiro pequeno e abafado era o melhor lugar da casa. Sem barulho, quentinho e onde eu podia finalmente mijar.

Foi uma surpresa eu conseguir me manter em pé, quando meu corpo inteiro ainda sacudia por dentro com frio. Mas pelo menos não estava lá fora, e não ia morrer com hipotermia. Era um alivio.

Entretanto, nem todas as ameaças foram eliminadas, a mulher raivosa na sala parecia bem determinada em jogar meu corpo na neve. Mas se ela iria contra o princípio da empatia, então eu iria contra o princípio da educação, e permaneceria na sua casa até arrumar um jeito de sair dessa espelunca caída o mais rápido possível.

Por Deus, nem água quente tinha. Como elas tomavam banho? Só as primeiras gotas do chuveiro me fizeram pular para atrás de tão geladas.

Arrumei o edredom ao meu redor e saí do banheiro. As duas ainda estavam na sala.

— Onde está o meu celular? — Perguntei.

Fodam-se os táxis e o meu vice-presidente, eu gastaria uns bons dólares se fosse preciso, mas sairia aqui.

A mulher me entregou meu Iphone com uma visível indiferença no rosto.

Um rosto bonito, devo dizer. Um que eu estava admirado até agora, porque carregava tantas emoções explicitas ali, na curva dos lábios cheios e do nariz arrebitados, mas principalmente nos olhos verdes e selvagens, me desafiando com um simples olhar.

Fascinante, pensei. Mas ainda assim, assustador.

— Ele não funciona — ela disse.

— Como assim não funciona?

— É o que acontece quando você deixa seu celular molhar. Ele para de funcionar — Explicou com sarcasmo.

Tentei ligar meu Iphone, mas tive o mesmo sucesso que ela. Nenhum. A tela continuava preta, não importava o meu desespero.

Suspirei, alto. Não sou um cara que perde a cabeça com facilidade, mas já estava chegando perto do meu limite.

— Então me dê o seu — ordenei. Não dei nenhum espaço para ela recusar o meu pedido.

— Não mesmo.

— Então prefere que eu fique na sua casa pelo resto da noite?

Ela hesitou. Eu levantei uma sobrancelha. Ainda estava enrolado naquele edredom que parecia não servir para nada. Meus pés estavam congelando também, descalços na casa fria.

Voltei para o sofá, me abraçando com mais força e me encolhendo em uma bola patética.

A mulher tirou o celular do bolso e estendeu na minha direção.

— Você tem cinco minutos pra dar o fora daqui, entendeu?

— Até parece que eu quero ficar nesse lugar, senhora.

Agarrei o aparelho e disquei o número da emergência, já que era o único que eu sabia decorado. Mas eles não atenderam. Tentei outras duas vezes, sem sucesso.

Foi aí que o desespero realmente bateu.

Eu sou um homem organizado, sabe? Toda minha vida é cronometrada em uma agenda. Quando acordo, quando como, que horas trabalho, para onde vou, quem vou ver hoje... Eu vivo o sentido literal da palavra rotina, sem surpresas durante o mês inteiro. Eu tenho o controle de tudo. E agora...

Agora estou preso na casa de uma estranha que tem grande capacidade de ser uma assassina. Sem carro, sem roupa, sem comunicação.

Eu disse que o natal era meu pesadelo? Bom, mudei de ideia.

— Cinco. Minutos. — A mulher rosnou, entredentes.

— Não vai rolar — respondi. Devolvi seu celular e voltei a me enrolar, tentando parecer despreocupado. — Estou preso aqui com você.

Ela começou a hiperventilar. Parecia que eu tinha dito que uma bomba iria estourar em Nova York. Ela correu até a janela da sala e olhou para fora.

— Por que estou recebendo esse castigo, meu Deus? — A ouvi suspirar.

Então sussurrei a mesma pergunta.

Não queria mesmo atrapalhar a noite delas. Não era minha intenção ser uma praga desgraçada que se instala na sua casa sem seu consentimento, mas eu não tinha muita escolha, tinha? Entre incomodar e sobreviver, eu preferia ser um pé no saco.

Deitei a cabeça no encosto duro do sofá desconfortável e pequeno. Me coloquei a pensar radicalmente. Sou um empresário de 36 anos, que conquistou tudo o que tem com a mente brilhante, com um histórico acadêmico invejável e a lista de derrotas zerada. Eu posso sair desse fim de mundo.

Senti alguém sentar do meu lado e abri apenas um olho. A garotinha estava tão embrulhada quanto eu. Ela usava um gorro que quase escondia seu cabelo loiro curtinho. Agora, no claro, não negavam ser mãe e filha, tinham o mesmo rosto e a selvageria no olhar.

A TV foi ligada e o noticiário apareceu. Atentamente, ouvi o meteorologista falar sobre a tempestade de neve que Nova York estava enfrentando, sem esperanças de aumento da temperatura durante todo o dezembro. Seria o período mais frio do ano registrado em décadas e alguns eventos foram cancelados devido ao frio antártical.

— Que droga, hein?

Olhei para a pequena do meu lado, me encarando com seriedade.

— É.

— Estou apostando comigo mesma que minha mãe te mata antes do frio congelar a gente.

Que garota mórbida.

— Não acha que eu poderia matar ela?

— É porque você não sabe onde se enfiou. — Ela estendeu a mão enluvada na minha direção. — Sou Elizabeth, mas pode me chamar de Lizzy.

Apertei sua mão, reclamando do frio que entrou pela brecha no edredom.

— Eu sou Dean Rodwell. É um prazer, senhorita.

— Não diga isso, vai se arrepender.

A curiosidade me bateu com força. O que era raro de acontecer.

— Quantos anos você tem? Me parece pessimista demais para uma criança.

— Não sou criança. Sou adolescente. Tenho doze anos, mas minhas pernas são curtas.

— Essa é sua desculpa?

— A sua é melhor, por acaso? — Me desafiou com o olhar. Não era o mesmo verde claro da sua mãe, mas tinha a mesma intensidade assustadora. — Você vai ficar essa noite?

Olhei para a janela, mas a mulher não estava mais lá. Vi a neve caindo com perversidade do lado de fora, o frio já embaçava os vidros e escurecia ainda mais a noite.

Pensei no meu Aston Martin perdido. Já devia estar escondido debaixo de um manto branco de gelo, pelo menos assim ninguém o roubava. Suspirei ao imaginar minha cobertura no centro, meu sofá gigante e meu tão amado aquecedor, que estava do outro lado da cidade, interditado por meio mundo de neve e um possível engarrafamento.

Doía ter que dizer:

— Sim, eu vou ter que ficar aqui.

— Legal — me respondeu sem muito ânimo, trocando os canais da TV sem procurar nenhum especificamente. — Se a gente ao menos tivesse Netflix. A TV aberta não passa nada legal.

Nunca assisti televisão. Quer dizer, nunca tive o hábito de fazê-lo. Meu pai era um tirano irredutível sobre como a televisão afeava nosso raciocínio. Devo dizer que hoje em dia eu concordo com ele. Alguém como eu não tinha tempo para gastar em frente à um painel, e confesso que também não sentia falta, mas a garotinha parecia triste e entediada, presa em casa. E se eu ficaria como hóspede, devia agradar e contribuir com alguma coisa. Para começar, a netflix devia servir.

Tomei o controle da sua mão, e ela me encarou com dúvida. Abri o aplicativo do streaming e coloquei minha conta. Para ser sincero eu nem sabia que tinha realmente uma conta na netflix, mas meu assistente deve ter cuidado disso pra mim. Usava o mesmo e-mail para todas as contas, e a senha seguia um padrão de dígitos, mais o nome do aplicativo em questão.

O site se abriu e Elizabeth deu um grito alegre do meu lado. Isso despertou a ursa feroz, que chegou do meu lado tão rápido quanto sumiu.

— O que houve?! — Me encarou com a colher de pau na mão e uma carranca no rosto.

— Temos netflix! — Lizziy respondeu, pegando de volta o controle da TV. — Dean vai nos emprestar a conta dele. Obrigada, Dean.

Logo a menina se perdeu ao vasculhar o catálogo.

— Não ouse começar a se acomodar no meu sofá — a mulher me disse.

Era estranho que nem mesmo o seu nome eu sabia. A chamaria de ursa, então. Mamãe ursa? Ursa maior?

— Seu sofá é tão ruim que jamais daria pra se sentir minimamente acomodado nele.

Ela me deu um ínfimo sorriso.

— Que bom, então. Já resolveu como vai embora?

— A menos que eu vire a Frozen, não vai rolar.

— Então é melhor já começar a cantar Let It Go, princesa, porque você não ficar na minha casa.

Língua afiada, foi a segunda coisa que destaquei sobre a mulher que não conhecia o nome.

Suspirei e me levantei, sentindo meus músculos reclamarem. O frio ainda torturava cada junta do meu corpo, mas já estava bem melhor do que antes. Acho que senti o peso da idade naquele exato momento.

Fui até minha bolsa de viagem que ainda estava jogada no chão. Tirei minha carteira, e avaliei por um momento minhas coisas totalmente molhadas. Se eu conseguisse ao menos secar aquele suéter...

Voltei até onde a mãe estava, parada de braços cruzados ao me encarar.

— Eu não sou um parasita — disse, abrindo a carteira. Tirei todo o dinheiro que tinha ali. — Vamos fazer esse acordo. Enquanto eu ficar aqui...

— Você não vai ficar aqui.

— Dá pra parar de ser tão teimosa?! Não está vendo que o frio lá fora não me deixa sair? Olha, eu também não queria estar aqui, mas não tenho nenhuma escolha, e você também não. Portanto... — Peguei sua mão e coloquei as notas de cem na sua palma. Não sei quando havia ali, mas devia ser suficiente para as despesas de uma noite. — Aceite o dinheiro, como um pagamento pela minha estadia.

Ela torceu o nariz e me devolveu os dólares.

— Não quero esmola.

Eu fiz o processo outra fez e paguei a ela.

— Não é esmola, é um acordo.

— Eu não quero nenhum acordo nenhum. Quero você fora, Elsa do Frozen.

— Você não tem muito querer no momento. Isso vai pagar as despesas e o transtorno que eu vou causar.

— Ah, mas é justamente o transtorno que eu quero evitar.

O dinheiro continuava sendo passado de mão em mão. Como um jogo de ping-pong.

— Você pode me receber na sua casa com pagamento, ou sem. Você que escolhe.

— Eu quero escolher a opção de não escolher.

— Não tem essa alternativa. E pegar ou pegar.

Seu olhar verde me atingiu com força. Se eu prestasse bastante atenção, conseguiria ver tudo na sua íris clara. A aura arisca, o raciocínio afiado e a teimosia irritante.

Sim, a grande terceira coisa. Teimosa feito uma mula.

— Quer saber? — Lizzy se levantou com um pulo e veio até nós. — Eu fico com a grana sem nenhum problema.

Sua mãe a olhou com surpresa.

— A garota pelo menos é esperta — eu disse, entregando as notas para a menina, mas sua mãe tomou da minha mão antes que eu fizesse.

— Você não pode sair por aí dando tanto dinheiro pra crianças! — A mamãe Ursa reclamou.

— Você não aceitou.

— Eu não sou criança! — Lizzy interrompeu, com raiva. — Sou adolescente. Minhas pernas é que são curtas!

A mais velha suspirou com aquele pequeno caos na sua sala pequena de estar. Avaliou o dinheiro na mão. Contou as notas. Suspirou outra vez.

Não há nada que o dinheiro não compre. Graças a Deus eu tenho muito.

— Eu não gosto da ideia — revelou.

— Já deu pra perceber. — Apertei ainda mais o edredom ao meu redor. — Eu também não gosto.

Nós nos encaramos por um instante. Dois adultos na sua situação mais deplorável. Eu sei bem que ela precisava a todo custo aceitar o dinheiro. Quer dizer, pelo estado da sua casa, era algo que estava fazendo muita falta.

— Dê um jeito de ir embora amanhã — mandou, guardando o dinheiro no bolso. — Não costumo ser tolerante assim.

— Nem piedosa, pelo visto — acrescentei.

— Dificilmente dou segundas chances, então é melhor ficar esperto antes que eu mude de ideia, senhor Rodwell.

Balancei a cabeça, assentindo sem muito animo.

— Você sabe o meu nome, mas eu ainda não sei o seu.

Ela não era tão baixa assim, mas não chegava a igualar sua testa com o meu queixo. E não dava para saber seu tamanho exato debaixo daquele moletom folgado que usava, mas as bochechas eram redondas e rosadas, e o rosto tinha o formato de um coração, com o queixo arrebitado e imperioso.

— Não que você precise guardar esse nome, já que vai embora amanhã e jamais voltaremos a nos ver novamente, mas eu sou Ayla. Ayla Auburn.

— Bom, eu diria que é um prazer te conhecer. Mas não é.

Ela arrebitou ainda mais o nariz.

— Não, não é. Vou fazer você correr daqui, não vai se importar com a neve lá fora.

— Bom, eu duvido muito.

— Vai sair cantando Let it go daqui, senhor Rodwell.

— Isso é o que vamos ver, senhora Auburn.

Continue Reading