Viver com Eles

By Lady_Butterfly

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Vivia uma vida bem normal, rodeada de amigos. Talvez fosse mais do que normal já que tinha direito a luxos ao... More

Viver com Eles
1º Capítulo
2º Capítulo
3º Capítulo
4º Capítulo
5º Capítulo
6º Capítulo
7º Capítulo
8º Capítulo
9º Capítulo
10º Capítulo
11º Capítulo
12º Capítulo
13º Capítulo
14º Capítulo
15º Capítulo
16º Capítulo
17º Capítulo
18º Capítulo
19º Capítulo
20º Capítulo
21º Capítulo
22º Capítulo
23º Capítulo
24º Capítulo
25º Capítulo
26º Capítulo
27º Capítulo
28º Capítulo
29º Capítulo
30º Capítulo
32º Capítulo
33º Capítulo
34º Capítulo
35º Capítulo
36º Capítulo
37º Capítulo
38º Capítulo
39º Capítulo
40º Capítulo
41º Capítulo
42º Capítulo
43.º Capítulo
Epílogo

31º Capítulo

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By Lady_Butterfly

Passaram-se alguns dias após essa visita. Nada mais se ouviu sobre Leonel e apesar da vigilância de Ricardo se manter, as conversas tendiam a terminar quando a rapariga percebia que ele procurava saber se ela havia pensado no que tinham conversado.

Dalila não queria tocar nesse assunto. A ideia ainda lhe parecia absurda por muito que soubesse que era verdade que conversar e estar com o feiticeiro da água fosse diferente do que estar com qualquer outra pessoa. Ainda assim, a ideia de uma relação assustava-a. Isso acontecia sobretudo pelo medo da relação falhar e todo o resto ficar comprometido.

- Ligaram da agência. Querem falar contigo. Importas-te, Ricardo?

- Claro que não. – Disse, levantando-se. – Disse que essa parte era da minha responsabilidade.

Dalila continuava a tentar acabar um trabalho para entregar na aula seguinte. Os testes e outros trabalhos, e sobretudo a sua cabeça cheia de pensamentos conflituosos deixaram muita coisa acumular-se. Tinha receio que as suas notas caíssem naquele final de segundo período.

Já Ricardo ia conseguindo organizar o seu tempo e também ajudar a turma mais uma vez a organizar uma viagem, desta vez apenas com fins recreativos. Não se falava em outra coisa.

A viagem para a Ilha das Sereias.

No princípio, Dalila pensara que seria a mesma ilha em que estivera quando teve que tomar conta do filho daquele casal perseguido pelos feiticeiros, apenas por um deles ser um bruxo.

No entanto, Filipe explicara-lhe que se tratava de outro lugar onde costumavam ir todos os anos. Não por acaso, mas como um ritual necessário aos quatro elementos. No caso, apenas aos três que restavam mas permitia-lhes regressar ao local onde a sua alma nascera. Segundo percebera, para ser feiticeiro não era preciso necessariamente ter um laço de sangue. Assim, segundo as histórias antigas dos feiticeiros, existe um lugar sagrado para as almas dos feiticeiros. Os quatro elementos partilham o mesmo local e essas almas poderiam ter ido para pessoas que nada tivessem a ver com feitiçaria.

 - É um sítio muito giro, vais gostar. – Comentou Jéssica com os braços de Tiago em torno da sua cintura, sendo que ele estava encostado à mesa diante de Dalila.

- Um bosque imenso. – Disse Tiago, fechando os olhos.

- Um vulcão infernal. – Acrescentou Filipe.

- Paraíso finalmente. – Concluíram os dois feiticeiros rindo-se em seguida.

- Já vi que a ilha tem tudo para vos agradar. – Falou Dalila, observando a satisfação com que falavam daquele local.

- É como se fosse um regresso a uma casa que sendo familiar, visitamo-la apenas uma vez por ano. Renovamos também o pacto que temos para com o mundo humano. – Disse Tiago.

- Pacto? – Perguntaram Dalila e Jéssica ao mesmo tempo.

- Nós somos os responsáveis pelo equilíbrio da Terra, por isso somos os elementos reais. Ao regressarmos a esse local todos os anos em troca de novas energias, também deixamos alguma lá para alimentar o ciclo da Terra.

- Vocês nunca tinham nos falado disso. – Comentou Jéssica.

- É um ritual privado e de que não se fala muito mas já que vocês as duas sabem deste mundo aparte, porque não contar isto? – Perguntou Filipe. – É algo muito importante para nós.

- Essa troca que fazemos alimenta-nos e alimenta a Terra. Se quebrássemos este ritual, catástrofes maiores se abateriam sobre o planeta. – Explicou Tiago.

- Mais do que já há nos dias que correm? – Perguntou Dalila.

- Não é totalmente da nossa responsabilidade que os humanos destruam o planeta e como tal, não podemos interferir sempre. Contudo, podemos procurar alertá-los e sensibilizá-los. Embora a consciência de cada um, também tenha um papel importante. – Disse Tiago. – Não podemos obrigar-vos a nada.

- E nem devíamos precisar que nos sensibilizassem, nós devíamos ter consciência dos nossos actos. – Comentou Dalila, espreguiçando-se. – Acabei.

No fim das aulas, Cristina pediu que Dalila fosse com ela até uma loja porque queria comprar uma roupa e precisava de uma opinião. Disse-lhe também que se calhar, podia conhecer o namorado dela e uma vez que Tiago ia dar uma volta com Jéssica e Filipe desaparecera a meio da última aula, significava que teria que ir sozinha com Ricardo para casa. Diante dessa possibilidade, decidiu acompanhar Cristina.

- Fica-te muito bem! – Elogiou Dalila ao ver a sua colega com umas calças no provador.

- Levo?

- Sim, ficam-te bem.

- Ok, pegas nesse casaquinho aí e levas para o balcão? Vou já ter contigo. – Falou Cristina, fechando a cortina do provador.

- Ok. – Disse Dalila, pegando nas roupas.

Poucos minutos depois, a rapariga estava sentada na mesa de um café com as compras de Cristina que fora à casa de banho. Enquanto esperava, lia uma mensagem que Mafalda lhe enviara a perguntar sobre o próximo ensaio no fim-de-semana e quando acabou de enviar a resposta, ouviu a cadeira ao seu lado ser puxada.

- Demoraste, Cristina. Pensei que te tinhas per… - A sua voz deteve-se ao ver outra pessoa.

- Olá Dalila.

- Henrique? O que estás aqui a fazer? – Perguntou num tom apreensivo.

“De todas as pessoas que tinha que ver, calha-me este feiticeiro chanfrado”.

- Vim ter com a minha namorada. – Disse, levantando-se e ao tentar tocar “sem querer” na mão de Dalila, sentiu a sua mão ser repelida. – Um dia destes vou saber que raio de feitiço é esse que te puseram.

- A tua namorada? Não me digas que…

- Oh amor, vieste cá ter. – Disse Cristina, beijando Henrique assim que chegou.

- Disse que te vinha buscar. Espero não ter vindo demasiado cedo. – Respondeu o feiticeiro com um sorriso.

- Não. Já te apresentei? Dalila é o…

- Henrique, eu sei. – Afirmou, achando melhor dar uma explicação de seguida. – Competimos nas provas de atletismo. Lembro-me dele daí.

- Ah é verdade! Até foi nesses dias de competição que o conheci. – Disse Cristina, encostando-se ao seu namorado.

- O melhor prémio que me podiam ter dado. – Disse Henrique, beijando a sua namorada.

“Ou ele gosta dela…ou isto está meloso demais para ser verdade”.

- Bem, vou andando. – Falou Dalila, sentindo-se cada vez mais desconfortável naquela situação.

- Podíamos jantar os três! – Sugeriu Cristina.

- Por mim pode ser. – Disse Henrique, sorrindo de lado.

- Ah, pois… acho que…

- Ela já tem coisas combinadas comigo.

Dalila virou-se e deu de caras com Ricardo com o seu ar nada amigável na direcção de Henrique que mantinha um sorriso claramente falso e desdenhoso ao ver o outro feiticeiro.

- É, é isso. Vemo-nos no colégio, Cristina. – Disse, acenando-lhes e empurrando Ricardo. – Ufa, por momentos pensei que se fossem ‘pegar’ dentro do shopping no meio de toda a gente.

- Não devias andar perto dele. – Comentou Ricardo.

- E tu achas que andava à procura dele? Não fazia a mínima ideia de que ele namorava com a Cristina. – Disse Dalila, ainda atordoada com a ideia.

- Ele namora com a tua amiga? – Perguntou surpreendido.

- Parece que sim. E posso pedir-te um favor?

- Diz-me o que é. – Disse o rapaz, parando para olhar para Dalila.

- É colega, ok? Se há coisa que aprendi desde que passei a viver cá, é que amigos conto pelos dedos e colegas tenho muitos. Com os amigos partilho várias coisas da minha vida. Segredos. Coisas que não digo à generalidade das pessoas.

- Estás certa, eu concordo contigo até aí.

- Até aí?

- Há coisas que te contei a ti porque não tive coragem ou sequer vontade de partilhar com mais ninguém, nem mesmo com os meus irmãos. Isso e outras coisas que me fizeram com que concluísse que isto não é uma simples amizade.

- Chama-lhe colorida se quiseres mas vamos mudar de assunto. – Disse a rapariga, corando e começando a andar.

- Não queres jantar por aqui? – Sugeriu o feiticeiro, algo divertido com a vergonha da rapariga que seguia a passos rápidos à sua frente.

- Vamos para casa. Preciso de pôr matéria em dia porque os testes vão enlouquecer-me

- Queres ajuda? – Ofereceu e recebeu o silêncio em resposta. – Sei que queres evitar-me, ou melhor, queres evitar o assunto ao qual procuro uma resposta. Ainda assim sabes que posso ajudar-te a estudar e tens a minha palavra que não falo em mais nada que não tenha a ver com a matéria que tens que estudar.

- Não precisas… - Ia tentar argumentar Dalila mas o rapaz concluiu com:

- Estou a dar-te a minha palavra.

- Está bem. - Concordou, olhando de esguelha para o rapaz.

Em outras ocasiões e nunca perguntando directamente porque não queria alimentar ainda mais o ego do rapaz, chegara a fazer-lhe algumas perguntas indirectas sobre algum aspecto de algo que haviam estudado e ele acabava por dar-lhe explicações mais úteis do que tentar adivinhar o português, por vezes, enigmático dos seus manuais.

Contudo, nunca lhe pedira abertamente que estudassem juntos e apercebeu-se de como ele se dedicava a deixar todo e qualquer ponto totalmente claro sem nunca perder a concentração ou divagar exageradamente. Sempre associara o estudar em grupo ou a pares a alguma conversa que acabasse por se desviar totalmente do assunto. Porém Ricardo não era assim e mais uma vez ela concluía como ele era pouco descontraído. Claro que essa concentração excessiva resultava em notas que rebentavam a escala, mas na opinião da rapariga também deixavam lacunas em outras áreas da sua vida, nomeadamente a social que só melhorava um pouco quando se envolvia na organização de viagens de turma.

Graças ao estudo, os testes e trabalhos correram melhor do que Dalila julgava e fez questão de agradecer a Ricardo que lhe disse apenas que ficava contente que as coisas tivessem corrido bem. Ela não sabia se ele deixara de insistir no “tal assunto” porque lhe pedira várias vezes ou porque simplesmente chegara à conclusão de que aquilo não tinha qualquer sentido. Fosse qual fosse o motivo, a rapariga dizia a si mesma que esse era o melhor caminho. Esquecer a proposta ou sequer a ideia de transformar o seu relacionamento em algo que podia magoar a ambos.

As férias da Páscoa finalmente tinham chegado e a tão esperada viagem realizou-se logo no dia que dava início às férias. A viagem começara ao início da tarde depois da hora do almoço. Todos se encontraram no porto onde a embarcação já os esperava. O trajecto não era muito longo e por isso, chegariam ao anoitecer à hora do jantar.

- Estão entusiasmados. – Comentou Jéssica ao ver o seu namorado olhar para o horizonte.

- É um lugar especial para nós. – Dizia Tiago sem tirar os olhos da paisagem.

- Todos gostam de lá ir. Porém, como sabem, nós temos os nossos motivos especiais. – Disse Filipe, deitado numa espreguiçadeira.

- Se até tu estás aqui a apreciar o momento tão sossegado e sem estar em outro zona do barco a engatar é porque deve ser mesmo especial. – Disse Dalila, fazendo o rapaz levantar-se.

- Ora não seja por isso. Estás com saudades minhas, Lila?

- Não. – Respondeu a rapariga a rir-se.

Ricardo estava sentado com as pernas e grande parte do corpo fora do barco.

- E há quem goste de apreciar a brisa marítima perigosamente. – Falou Dalila que se sentia inquieta com a descontração do feiticeiro num sítio tão perigoso.

- Cair na água não é um problema para o Ricardo. – Comentou Tiago.

- Acredito que não. – Disse Dalila. - Se fosse outra pessoa qualquer os profs já teriam dito algo mas olha que nos viram aqui, incluindo o teu maninho e nem um pio.

Ao avistarem a ilha o silêncio apoderou-se dos jovens. Os feiticeiros e até mesmo para Dalila devido ao Rosário, experienciaram uma sensação estranha.

- O que é? – Perguntou Tiago quebrando o silêncio.

- Nunca tinha sentido nada assim. – Comentou Filipe.

- Não é a primeira vez que pressinto algo assim e no entanto, não faço a mínima ideia do que se trata. – Comentou Ricardo, recordando aquela mesma sensação na última vez que estivera com a Dalila na praia.

- Do que estão a falar? – Perguntou Jéssica.

- Algo estranho, como se fosse um pressentimento. Não é um mau pressentimento, é apenas estranho. – Disse Dalila pensativa.

- Também és capaz de sentir? – Perguntou Jéssica surpresa.

- É… - Olhou para os irmãos discretamente. – É um dos feitiços que me puseram para me ajudar a orientar, às vezes dá-me para estas coisas de pressentimentos. Tipo se quiser evitar feiticeiros, percebes?

- Hum, hum. Tiaguinho depois tens que mostrar esse feitiço. Senti-me à parte agora.

Ele sorriu-lhe.

- Depois explico-te melhor, ok? Se não é um mau pressentimento, talvez não nos devêssemos preocupar.

- Talvez… - Murmurou Ricardo.

Quando o barco atracou, todos se deslumbraram com a residência que se camuflava naquela praia extensa de areia fina e branca. Na residência, a senhora da recepção juntamente com algumas empregadas deu as boas vindas aos alunos, indicando-lhes os respectivos quartos.

- É bom ver-vos, Filipe, Tiago e tu, Ricardo… - A recepcionista baixou o tom da voz. - Deixaste-as com saudades. Há dias perguntaram-me por ti.

- Lamento não poder voltar mais vezes aqui. Irei vê-las assim que puder. Vou acomodar-me e peço-lhe mais uma vez, descrição, por favor. – Disse Ricardo com um sorriso calmo.

- Claro, será tudo perfeito como em todos os anos.

- A propósito, a senhora sabe se aconteceu alguma coisa estranha nos últimos tempos nesta ilha?

- Uma flutuação de energia fora de época mas por vezes, acontece.

- Estou a ver… obrigado.

A caminho dos quartos, Dalila e Jéssica curiosas perguntaram se a senhora da recepção assim como as respectivas empregadas eram pessoas normais e vulgares ou feiticeiras. Depressa explicaram que para a maioria dos habitantes, nomeadamente, donos de estabelecimentos eram feiticeiros que geriam a zona com cuidado impedindo assim, os humanos de explorarem ou estragarem algo que era para eles um território sagrado.

- Se é sagrado porque não fazem este lugar invisível para outras pessoas? Para vocês não devia ser um problema. – Comentou Dalila.

- Nós representamos o equilíbrio do planeta. Não podemos afastar aqueles por quem zelamos e este lugar também necessita da sua presença. – Explicou Ricardo parando diante da porta de um quarto. – Agora vão para os vossos…

O feiticeiro apoiou-se na porta, fechando os olhos e puxando o ar como se este tivesse a ser-lhe roubado.

- O que tens? – Perguntou Dalila preocupada e nesse momento, viu Filipe e Tiago caírem no chão.

- Meu Deus, o que se passa? Tiago! Filipe! – Chamava Jéssica.

- A nossa energia está a ser drenada… - Murmurou o feiticeiro, sentindo um cansaço insuportável cair sobre si.  

- Drenada? É isto que vocês entendem como paraíso que vos suga a energia até vos fazer cair para o lado?! – Perguntou Dalila preocupada, tentando ajudar Ricardo a manter-se de pé.

- Não costuma ser assim… - Murmurou, abrindo a porta, usando algumas palavras. – Não costuma tirar-nos sem trocar ao mesmo tempo connosco…passa-se alguma coisa…não os podem ver aí caídos no corredor…

- Ok, senta-te pra aí. – Voltou-se para a sua amiga. - Jéssica, temos que tentar pô-los dentro do quarto. Não vamos poder arranjar uma boa explicação para eles terem desmaiado.

- Ok, eu ajudo-te.

Com algum esforço, conseguiram levar os rapazes para o interior do quarto e depois levar as malas para o quarto ao lado, onde os dois iriam ficar. Porém, naquele momento, achavam melhor ter os três na mesma divisão visto que dois dormiam profundamente e Ricardo parecia lutar por manter-se acordado. Contudo, sentada na beira da cama, Dalila percebia que se tratava de um esforço inútil pois estava cada vez mais com um ar cansado.

- Os teus irmãos já estão deitados e já deixámos as coisas deles no quarto e qualquer coisa, inventamos uma desculpa. Podes dormir também se isso te ajudar a ficares melhor.

- Se adormecer, vou acabar por recuperar mas… tu…aliás, vocês as duas…podem ficar desprotegidas. A minha energia está muito em baixo…

- Ouve, há mais feiticeiras aqui e não vamos a lado nenhum por isso, não vai acontecer nada. Dorme que bem precisas. – Disse, colocando a mão no rosto do rapaz. – Ricardo, estás a ficar pálido. Dorme, não te preocupes. Não vai acontecer nada. Vamos ficar as duas aqui.

O rapaz começou a fechar os olhos.

- Não te afastes deste lugar… - Murmurou antes de deixar-se levar pelo sono.

- Também adormeceu?

- Sim, Jéssica. Ouve, vou descer e pedir alguma coisa para comermos. Invento uma desculpa qualquer.

- Não te preocupes. Não saio da beira deles.

- Eu sei que não. – Disse Dalila, sorrindo-lhe. – Não me demoro.

Os seus colegas não ficaram muito satisfeitos por saberem que os Gomes não iriam descer essa noite do quarto, preferindo ficar no quarto a jogar cartas. Contudo, a dona da residência interrompeu a conversa, sugerindo-lhes alguns bares que estariam abertos naquela noite, criando assim a distracção perfeita e depois murmurando a Dalila que lhes levaria a comida ao quarto e que não se preocupassem com nada.

Terminada a refeição, Dalila e Jéssica conversaram parte da noite, mas com a madrugada no seu auge, as duas lentamente iam sendo levadas pelo cansaço. Os feiticeiros permaneciam adormecidos com uma aparência bem calma e serena e ruído algum servia sequer para lhes provocar alguma movimentação. Dormiam sossegados e sem quaisquer sinais que demonstrassem que iriam acordar.

Sentada no chão perto da cama, ao lado de onde Ricardo dormia, Dalila deixava-se levar pelo sono quando ao tombar ligeiramente para o lado deu uma cabeçada na mesinha de cabeceira o que a acordou e fez Jéssica rir-se um pouco. Quando lhe ia fazer algum comentário sobre a sua triste figura, voltou a ter aquele pressentimento estranho.

Contudo, desta vez, como se realmente fosse alguma coisa que não estivesse longe.

- O que foi, Dalila? Ficaste calada, de repente.

- Eu… eu venho já. – Foi a resposta de Dalila, levantando-se.

- Onde vais? É tarde.

- Não demoro. Eles nem vão se aperceber que saí. – Disse, levantando-se e saindo do quarto sem mais objecções de Jéssica que rapidamente se deixou vencer pelo cansaço.

Apesar de ter encontrado algumas das empregadas nos corredores, conseguiu disfarçar com algumas desculpas até finalmente sair da residência. No exterior, tocou no rosário, pedindo-lhe que a guiasse até à origem daquele estranho pressentimento.

“Se fosse perigoso, não estaria a guiar-me”, pensou para si mesma, sentindo o rosário mexer com a sua intuição que a levava para o interior da floresta que estava rodeada de alguns avisos que diziam para não entrar pois era um local perigoso. “Vou pensar que todos aqueles desenhinhos nas placas representavam o único perigo que pode haver, ou seja, perder-me, mas tu rosário lindo não vais deixar que isso aconteça, não é? Espero bem que não. Talvez a resposta para o que aconteceu com eles, esteja na origem deste pressentimento estranho que apesar de não parecer mau…é melhor confirmar”.

A floresta tornava-se cada vez mais densa. O caminho complicava-se com as ramagens, pedras e um solo cada vez mais irregular. Já não sabia há quanto tempo estava a caminhar. Porém, algo continuava a chamá-la. Incitando-a a tomar uma direcção que nem sempre era a mais fácil.

“Água? Estou a ouvir água. Será uma cascata?”, perguntou, afastando mais algumas ramagens e deslizando um pouco um dos seus pés, “Uma gruta?”

Com cuidado, entrou e para sua surpresa reparou que o interior daquele lugar era iluminado pela própria rocha que constituía aquela gruta. Como se a própria pedra brilhasse, num tom algo fluorescente. Em tons de cores azulados e esverdeados.

A rapariga guiava-se pelo som da água que estava cada vez mais próximo e ao virar numa esquina, viu a cascata. Nela havia algo que a fez parar para tentar entender o que estava a ver. No meio da queda de água, rodeada de ramagens e lianas estava uma rapariga de longos cabelos castanhos-claros e cacheados. Presa com um dos braços erguidos, parecia adormecida. A água caía-lhe em cima e apesar do aspecto da rapariga que talvez tivesse uns quinze anos, Dalila não sabia ao certo se ela estaria ali há muito tempo. Se possivelmente fosse uma feiticeira, a sua aparência não seria afectada pelo tempo de exposição à água ou mesmo pelas ramagens que a seguravam, envolvendo o seu corpo.

- E se não for uma feiticeira? – Perguntou-se, aproximando-se um pouco.

Quando colocou um dos pés na água da cascata, viu as ramagens movimentarem-se e isso fê-la recuar e tudo voltou a estar silencioso novamente.

“Está a proteger aquela pessoa que ali está? Mas o que é isto afinal?”

A manhã não tardou e Jéssica que adormecera ao lado da cama onde estava Tiago, apercebeu-se de algum ruído. Abriu os olhos, pensando que era Dalila e viu Ricardo sentado na outra cama, passando a mão no cabelo com um ar ainda sonolento.

- Estás melhor? – Perguntou Jéssica.

- Sim. - Murmurou o rapaz, olhando em volta. – Onde está a Dalila?

- Ah pois… - Começou a dizer, pensando na melhor forma de dizer a verdade. - Ela saiu a meio da madrugada e até agora nem sinal.

- O quê?! – Perguntou, levantando-se em seguida. – Ainda diz ela que não me preocupe! Claro que não! Ela nem contribui em nada para isso!

- Isto é um lugar sagrado, não é? Não deveriam acontecer coisas más. – Tentou tranquiliza-lo.

- Preciso de saber onde se meteu. Os meus irmãos devem acordar antes que volte e caso isso aconteça, diz-lhes que não demoro e que comam qualquer coisa.

- E tu não vais comer nada?

- Não sem antes saber onde aquela irresponsável se enfiou. - Disse, saindo do quarto.

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