Rainha do céu noturno
Já fazia alguns minutos que Iani estava parada em frente as grandes portas do salão. Do outro lado, as vozes chegavam até seus ouvidos causando um aperto no peito. Depois que Mary terminou de colocar o diadema sobre sua cabeça a peça pareceu pesar uma tonelada conforme ela caminhou sozinha pelos corredores até ali.
"Eu gostaria muito...mas não é permitido que criados sejam acompanhantes, mas estarei lá te esperando!"
Foi o que Mary disse depois que Iani pediu para que fossem juntas. Ansiosa, ela esperou por Aaron, mas depois que a garotinha foi atrás dele e voltou com a notícia de que o alfa estava rodeado de pessoas que não paravam de lhe fazer perguntas Iani respirou fundo, alisou uma última vez a longa saia do vestido e saiu em direção aos corredores seguindo as instruções da sua nova amiga. Agora ela estava ali, em um grande impasse. Os dois lobos que faziam a guarda tentavam não espiar a jovem que olhava para as portas, curiosos e fascinados com aquela beleza incomum.
—Você consegue...
Iani sussurrou cerrando os punhos. Não podia pensar em problemas, na raiva que aquele povo sentia por ela, em Clycia, ou em qualquer outra coisa, precisava estar calma, a mente tranquila e vazia, caso contrário, tinha certeza que acabaria desmaiando ali mesmo.
—Você consegue.
Depois de respirar fundo por três vezes Iani arrumou a postura, retirou uma mecha do cabelo de trás da orelha e olhou firme para os guardas que estavam ao seu lado.
—Por favor, abram as portas.
Sentindo uma aura esmagadora os dois ficaram, por um breve instante, sem reação.
—Sim senhora!
Do outro lado, no meio da massa de corpos vestidos em roupas coloridas e extravagantes, Aaron se livrava do último súdito que veio falar com ele. Sua taça estava vazia mas a cabeça cheia. Aquela altura ele só queria terminar o quanto antes o baile e voltar para casa.
—Vejo que gostou do vinho! — Dave apareceu sorridente, os bordados dourados brilhando em sua roupa azul marinho conforme andava pelo salão — Que tal mais um pouco? Ai aproveitamos e chamamos outras pessoas para conversar.
—Não venha encher minha paciência.
Seu anfitrião continuou rindo.
—Esse é o lado ruim de ser líder, problemas e mais problemas que sempre temos que resolver, mas pense no lado positivo...
—E existe um?
—E depois eu é que sou o engraçado aqui — Dave se aproximou levando a taça de vinho até a boca — Não pedimos pelas responsabilidades, mas a temos, então vamos aproveitar o hoje e ser apenas súditos comemorando uma festa!
No fundo Aaron gostaria de estar tão despreocupado quando Dave, de certa forma invejava sua capacidade de viver o agora sem se preocupar tanto com o futuro.
—Aliás, onde está a Iani? — os olhos verdes procuraram pelo salão — Pensei que as mulheres humanas demoravam para ficar prontas, mas não imaginei que fosse tanto...
Foi então que Aaron se deu conta que havia esquecido de voltar para o quarto, e graças a sua expressão, Dave conseguiu ler pelas entrelinhas.
—Não me diga que você...
—Não me olhe assim, desde que coloquei os pés aqui alguém aparece para conversar comigo.
—Pelos céus! Isso não é desculpa.
—Eu sei.
—Bom, eu vou busca-la então.
Dave sentiu algo segurar seu ombro o impedindo.
—Eu farei isso, mas obrigado mesmo assim.
Aaron deu o primeiro passo para sair quando um amontoado de tecido vermelho apareceu na sua frente.
—Aaron, podemos conversar? Gostaria de me desculpar por mais cedo...
Clycia apareceu com um vestido bufante em tons vermelhos cheio de bordados com flores douradas. Era uma veste de encher os olhos, algo digno das princesas dos contos de fadas, porém, Aaron estava tão concentrado em sua tarefa que mal notou quem estava na sua frente.
—Outra hora.
—Vai ser rápido, eu prometo!
—Deixe nosso convidado passar irmã, não vê que ele está com pressa?
—Eu também estou! Desde o ocorrido eu não consigo ficar em paz comigo mesma...eu...
—Não é a mim que você deve desculpas Clycia, agora se me da licença...
Uma ruga se formou entre as sobrancelhas da loba, a ideia de se desculpar com a humana era no mínimo, desagradável. Mas ela fez o melhor para disfarçar.
—Tem razão... e onde está a Iani?
—Logo você deve se esbarrar com ela por ai irmãzinha — Dave tomou a frente — Não se preocupe, oportunidades não vão faltar.
Clycia forçou um sorriso, um na qual não enganava a Dave.
—Tem razão — ela desviou os olhos para os convidados — Deve ser muito difícil ser a única humana no meio de tantos lobos, não é querendo me gabar mas, a pobrezinha acaba ficando apagada em meio a tanto luxo...
Aaron sentiu algo se inflamar em seu peito mas reprimiu o sentimento antes que ele crescesse. Já Dave, não.
—O que quer dizer com isso?
—Como o quê? Iani até que é bonitinha mas convenhamos que não tem o charme das outras mulheres do nosso mundo, falta...encanto.
—Sua visão deve andar meio ruim ultimamente irmã, ou é algum tipo de inveja? Se bem que isso explicaria seu comportamento nesses dias.
—Inveja?! Até parece! Agora não sei o porque de você estar tão incomodado com isso, até parece que ela significa alguma coisa para você Dave!
—Só não quero ouvir minha própria irmã fazendo pouco caso dos meus convidados!
Clycia estreitou os olhos encarando o irmão.
—Tem certeza que é só isso?
—É claro.
—Então porque está tão irritado com uma coisa tão pequena?
—Já chega vocês dois!
Aaron tomou a voz, já estava cansado daquela conversa, sem contar que começava a se sentir incrivelmente incomodado.
—Se quiserem continuar com esse assunto banal, que seja longe de mim, tenho coisas mais importantes para fazer.
—Mas Aaron...
Sem dar tempo para Clycia ou Dave falar mais alguma coisa o líder de olhos dourados se afastou, porém, antes que conseguisse dar mais um passo vários murmúrios começaram a se erguer na multidão.
—O que está acontecendo ali?
—Eu não sei.
Dave parou ao lado de Aaron e Clycia ao lado do irmão, os três olhavam curiosos para a massa de corpos que começavam a se abrir na direção deles, segundos depois, eles entenderam o motivo de tanto alvoroço.
Pela multidão, uma mulher caminhava com passos firmes trazendo uma noite estrelada consigo, na cabeça, o diadema de prata destacava os fios escuros do longo cabelo que caia pelas costas como cascatas.
—Iani?
—Não pode ser...
Todos estavam surpresos, ninguém conseguia desviar os olhos, era algo belo, exótico e de uma estranha familiaridade, quase como se aquela mulher trouxesse de volta nostalgia e lembranças a muito perdidas.
Se as outras mulheres ali se vestiram como princesas nobres e ricas, Iani havia se trajada como uma rainha. A rainha do céu noturno.
Parado como uma estátua Aaron apenas esperou, observando Iani se aproximar como um sonho, cheio de mistérios e segredos, segredos na qual ele tinha cada vez mais vontade de descobrir, um por um, no silêncio que só a noite trazia.