A Série Espelho dos Olhos - L...

By NicolasCatalano

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E, se por causa de uma revelação, sua vida mudasse? E, se por causa de ser quem você é, as pessoas te julgass... More

Sinopse - Espelho dos Olhos
Prólogo
Capítulo 1 - (Parte I - O Desdenho: As Íris)
Capítulo 2
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6

Capítulo 3

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By NicolasCatalano

Tia Joly esbanja tanta simpatia que contagia todos à sua volta. É corpulenta, com as bochechas rosadas que, em minha opinião, se pare- cem com dois corações. Usa um forte batom cor-de-rosa em seus lábios e, como de costume, está sempre sorrindo com seus porcos. Além de porcos, Joly coleciona bonecas. Qualquer tipo de boneca. Desde as esbeltas e arrumadas até as pequeninas miniaturas graciosas com aromas de flores cítricas.

Mas é claro. O equilíbrio entre o bem e o mal é necessário em todas as partes. Já quando o assunto se trata de meu tio, é outra história. Rother é um rechonchudo com uma cara enorme e implicante. Possui uma inteligência fora do comum, que denomina sua Classe de Talento, porém, é uma grande lástima que sua habilidade às vezes falha em achar que sou uma aberração forçada. Sua arrogância é asquerosa.

O caminho não é nada longo, muito pelo contrário: é curto. Apenas ando olhando para o céu, contando mentalmente os preciosos segundos antes de ficar cara a cara com a "fera". Entre passos lentos e fantasmagóricos, chego finalmente ao nosso destino, o qual me lembra uma grandiosa casa de "brinquedos vivos"; telhados vermelhos piramidais, lampiões cor-de-rosa (com beija-flores dentro) pendurados nas partes mais alheias da casa, portas e janelas triangulares amareladas. Em um piscar de olhos, vejo Joly iluminada, usando seu avental com desenhos de baralho em frente à porta, que se parece com uma minipirâmide. Empolgada, ela se levanta rápido de sua cadeira cor de carmim, começando a acenar desesperadamente com um enorme sorriso no rosto.

– Oh! – exclama ela, quase dando um pulo de tanta alegria. – Vinzel e Evangellyne, vocês vieram! – grita, ansiosa de felicidade, vindo ao nosso encontro.

Eu aceno. Meu pai também, que ainda coloca as mãos em meus ombros.

Mas Joly não dá trégua. Seu sorriso quase estoura seu próprio maxilar. Além de tudo, ela nunca teve noção de sua própria força ao me cumprimentar. Como sempre, vem abraçar-me com força, apertando-me com robustez, como se eu fosse uma de suas preciosas bonecas de pelúcia. A única coisa a se fazer é disfarçar o certo sufoco, pois quase acabo vomitando todas as maçãs verdes que havia ingerido.

– Minha nossa! Minha nossa! Como você está, pequena Evangellyne? – pergunta ela, apertando minhas bochechas e remexendo-me repetitivamente.

Vinzel ri e tapeia levemente minhas costas.

– Ela não é mais uma pequena garotinha, Joly. Evangellyne já completou 17 anos. É uma verdadeira moça! Não é, filha?

Joly fica brava. Nega movendo suas mãos.

– Oras! Não ouse contestar-me, Vinzel Allins! Não adianta: ela será sempre minha eterna pequena garotinha dos olhos esverdeados mais formosos de Stravânsia, sempre. Vamos, entrem, entrem.

Terras. Hortas gigantescas e mais terras. Andamos até o celeiro, que parece ser feito de Lego colorido. Estar aqui de imediato me remete à infância. O que me faz pensar em meu meio-primo chamado Zachary Allins, cuja sorte foi dominada assim que a vida resolveu presenteá-lo com íris vermelhas iguais a rubis. Pois é. Isso deveria resultar em motivos bons para ser feliz neste país. Sua renda familiar sempre fora altíssima, mas... nem tudo é como ansiamos. Sofrer de distúrbios mentais, de longe, não foi uma escolha. Desde seu nascimento, o triste garoto de íris avermelhadas tem demonstrado de ciências não diagnosticáveis. E por ser portador de uma doença misteriosa, Zachary jamais conseguiria dominar sua Classe de Talento Arcana. Além de tudo, sua percepção vinculada à aparência sempre foi desastrosa. Suas vestes de marinheiro sofisticadas estão continuamente amassadas, e seus cabelos castanhos lisos são desalinhados iguais a uma orquestra desafinada. Pois bem, já faz um tempo que não o visito.

Logo ao entrar na elegante casa, que tem flores vermelhas e murchas dentro de jarros quadrados por todos os cantos, percebo que o número de retratos do meu primo aumentou de uma forma absurda nas paredes amareladas dos corredores, perto da escada. Joly sempre tivera esse estranho costume de expor as fotos de Zachary de forma obsessiva, de várias maneiras. Além da mania de decorar tudo de maneira infantil.

Alguém desce as escadas.

– O relógio miúdo da meia-noite tem me dito coisas horríveis – diz meu primo, de repente, vestindo um pijama azul-marinho, sem ninguém mesmo esperar, segurando fortemente o corrimão. – Eu apenas espero ficar bem.

Tento sorrir, cumprimentando-o, e, de cara, percebo que seu estado piorou. Sua aparência é a mais horrenda de todas as vezes que eu já o vi. Além de conter marcas de cortes por todo o corpo, parecendo que ele tentou furar-se ou suicidar-se. Joly, que estava sorridente, demonstra certa tristeza ao se aproximar dele e tenta lembrá-lo de quem sou eu.

– Querubim Zachary – diz ela, passando as mãos em seus ombros –, lembra-se de Evangellyne?

O garoto vira seu rosto de olhar vazio e cansado.

– Apenas sei que espelhos possuem reflexos – responde ele com demência, em direção à sala. – E que dias são apenas escolhas.

O ar muda de sentido. Vinzel olha aflito para Joly, e eu apenas encaro o chão. Realmente. Confesso que é triste saber que meu primo nem sequer melhorou um pouco.

– Estamos tentando diminuir a dosagem dos remédios de Zachary – sussurra Joly. – Vamos, querido, siga com Dondon, ela lhe dará um banho – diz ela, referindo-se a uma de suas criadas zero-classe de pele rosada, que é responsável pelo tratamento de meu primo.

Enquanto ele sobe as escadas com Dondon, que sempre usa um cabelo avermelhado e uma leve fita de seda azul em seu coque, Joly dá passos desesperados, avisando-nos que preparou um bolo com essência de ores e suco de cenoura.

– Carvália! – grita ela, contente, a um de seus empregados. – Sirva o bolo na mesa? Minha pequena Evangellyne e Vinzel estão aqui! Vamos!

– Não se incomode conosco, Joly – murmura meu pai. – Viemos apenas visitá-la. Tranquilize-se.

Ela enche as bochechas de ar.

– Carvália, vá logo. – Joly mostra a língua para Vinzel. – Mas que feio. Vinzel continua com a mesma "frescura" de sempre, não é, Evangellyne?!

Eu apenas solto um suspiro de agradecimento.

– Além do mais, Evangellyne, minha pequenina, você precisa comer. Está crescendo e logo se tornará uma admirável moça. Imagine só, todos vão querer esses olhos verdes! – Ela bate nas minhas costas. – Mas não vamos falar muito disso... Vocês sabem, sou chorona...

O prazer é imenso em saber que minha tia se preocupa comigo e com meu pai. Sempre tem-se esforçado para nos agradar ao máximo. Além de sempre me ajudar com roupas, materiais escolares e outros supérfluos pelos quais não podemos pagar. Pena que isso seja o oposto com meu tio Rother. Perto dos sofás gigantescos, na sala branca de vidro, meu pai o observa de maneira tensa. Enquanto sua coluna enverga, ele apenas continua sentado no estofado, mastigando ferozmente como se o mundo fosse acabar em salgadinhos de queijo.

Meu pai dá um passo lento.

– Rother... – cumprimenta ele, sem demonstrar muita vontade. – Há quanto tempo não nos vemos, não é? – Entretanto, Rother não se vira, apenas continua a mastigar os salgadinhos, devorando-os. – Como... como tem passado? – insiste novamente meu pai, mas nada parece adiantar.

Não há como não notar, contudo, a maneira como Rother está sentado; assemelha-se a um bagre entalado. Ele respira com preguiça, apertando com suas grandes mãos um controle transparente de botões escuros, fazendo, as- sim, várias cenas moverem-se na tela; o que é estranho, pois em meu vilarejo ninguém possui essa tal tela tecnológica vinda diretamente da Ilha Central, onde se localiza a Escola Talental. É praticamente lei: somente os que pertencem à Elite conseguem comprar uma dessas ou alguma gerigonça do tipo.

– Apenas espero que tenha tido o mínimo de senso e não tenha trazido a garota dos olhos fingidos com você, Vinzel – retorque ele, sem nem mesmo se virar. – Sinto cheiro de falsidade no ar.

A primeira ofensa, e essa foi sem me ver.

– Rother Allins! – explode tia Joly de supetão, dando-lhe uma bronca e batendo em sua cabeça com uma de suas revistas de fofocas. Ela está andando de um lado ao outro, ajudando Carvália. – Pare já com isso! Não fale assim de Evangellyne!

Marcas de suor e gordura no sofá. Ele finalmente se vira em minha direção, demonstrando suas íris avermelhadas e exibindo uma cara de peixe sonso requentado.

– Somente não gosto de pessoas que gostam de parecer um erro e, ainda por cima, falsas, que não aceitam ser o que realmente são.

Algo denso paira no ar. Eu não consigo entender. Antigamente, ele só me chamava de falsa. O "gostar de parecer um erro" nunca existiu em seu vocabulário de "ofensas a Evangellyne". Sempre fui forte em ignorá-lo, mas o que ele disse com certeza ultrapassa qualquer limite! Desde quando tenho algum tipo de erro em meu gene? Não fico quieta, pelo contrário, eu protesto!

– Parecer gostar de errar? – grito, ouvindo minha voz ecoar na sala branca. – Você está louco? Por quais motivos eu teria prazer em errar?

Ele não responde. Apenas me olha com desprezo, e isso só acaba quando um dos porcos olhudos de Joly, o que tem um grande "J" em seu couro rosado, surge de algum lugar e sai correndo na sala, disparando um grunhindo.

– Jijico! – berra minha tia, desesperada, colocando as mãos na cabeça, desacreditada. – Não corra pela sala, pequeno suíno! Carvália acabou de encerá-la! Ai, ai, ai! Mas oras, olhe só o que você causa, Rother! Até o porco está surtando nesta casa!

Se minha cabeça já estava doendo antes, agora ela está explodindo. A garota mal-educada Glorificadora na igreja, o Mestre Glorificador Clérigo e o meu "prazer em parecer um erro", segundo meu tio Rother, resultam em um dia que está sendo péssimo. Só queria entender o porquê dos porquês. Por que minha vida sempre foi e é uma completa bagunça.

Entrementes, como sempre, Joly toma posição e discute com Rother. Faz caras e bocas ao bater seus pés no chão enquanto discute, igual a uma dançarina com disritmia. Apenas olho de leve para Vinzel, pois sempre que eles discutem vamos para a grandiosa sala de estar perfumada, sem nem mesmo sermos, antes, convidados a entrar nela.

Vinzel se apoia em uma das cadeiras sofisticadas em frente à mesa retangular de vidro, com um rosto confuso.

– Aguente mais um pouco, Evangellyne. Eu prometo, filha, logo iremos embora... – diz ele, com ar de chateação. – Joly tem um grande afeto por você.

Antes de eu balançar a cabeça concordando, Joly entra repentina- mente na sala de estar segurando Jijico de uma forma "mãe animal". O porco olhudo é enorme e usa um gigantesco laço vermelho, lembrando meramente um embrulho de presente afetuoso.

– Perdoem-me, perdoem-me – pede ela ainda com Jijico no colo, que solta um grunhido pela cozinha. – Rother é um homem muito difícil. Por Remi! Eu já não sei mais o que fazer! – Ela dá um soco na mesa e joga Jijico no chão.

– Fique tranquila, Joly – diz Vinzel, demonstrando um leve sorriso forçado. – Nós estamos acostumados.

Ela dá três pulos, que não compreendo.

– Hoje está mais estressado que o normal – explica, erguendo os braços várias vezes. – Acreditam? Alguns equipamentos que Rother vendeu à Escola Talental voltaram com tremendos defeitos! Isso o deixou furiosíssimo! – Joly coloca as mãos na cintura. E eu finalmente consigo me lembrar de que os "três pulos" são parte de algum ritual que ela faz antes de comer. – Mas eu disse! Quem o mandou escolher essa subdivisão? Eu disse a ele! Eu disse!

Meu tio é um Arcano Criador. Sua Classe de Talento se denomina "Arcano", e sua propensão é ligada ao "Criador", resultado da subdivisão de cada pessoa que nasce com uma Classe e olhos específicos, devendo, assim, graduar-se em alguma subdivisão na Escola Talental, além de adquirir o "honroso" certificado. Dessa maneira, Rother trabalha com fabricação e venda de equipamentos para a Ilha Central, especificamente, para Scherzer.

Uma pessoa que possui uma Classe de Talento como a dele é altamente inteligente, tendo o cérebro e a magia como principais armas. Mas, por ser Criador, suas engenhosas habilidades permitem desenvolver gloriosos equipamentos, fragrâncias exóticas, novos sabores de alimentos e até poções mortíferas. Porém, meu tio não se formou para o ramo de ataque, que é uma das subdivisões dos Arcanos, os "Arquimagos", nem para ser dos "Animálios", que cuidam de animais, já que sempre soubera do que mais gostava desde pequeno: criar.

– Sentem-se, queridos – diz Joly, incentivando-nos em direção à mesa de vidro. – Venha, Evangellyne. Sente-se perto de mim!

Carvália, a criada morena de vestes mostarda, começa rapidamente a servir um sofisticado bolo feito de ores. Baseando-se nisso, Joly diz que, na Escola Talental, as comidas com ores são típicas, e que sempre devemos agradecer por Remi ter feito tal beldade.

Entretanto, apenas degusto o bolo em silêncio e tento demonstrar minha "leve" felicidade à minha tia, que nos observa com seus grandes olhos pretos, seus lábios carnudos com batom cor-de-rosa e suas unhas pintadas de magenta. Enquanto mastigo, ela comenta com meu pai sobre algumas discussões que Rother tem com seus funcionários, os zero-classes. Conta que eles brigam por aumentos salariais e que se sentem injustiçados, já que nenhum zero-classe poderá possuir um Certificado Comunal Humano. Mas isso é mais que comum de acontecer. Os que não possuem habilidades especiais não ganham muito. Na verdade, não ganham praticamente nada. As profissões deles são desvalorizadas, eles estão focados, somente, em limpeza e outros serviços braçais. Apenas sei disso porque Vinzel trabalha em uma fazenda, com colheitas e serviços pesados; é lenhador, ao passo que um Arcano Animálio, que cuida de animais, é o dono. O salário dos funcionários sempre fora baixo. 

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