Castigo era lavar a louça por um mês.
Cozinhar por uma semana.
Lavar e passar as roupas por duas semanas.
Mas agora:
Esvaziar o tanque de fezes de um dos estábulos dos pegasus e, de acordo com Tântalo, o deixá-lo brilhando?
Isso era tortura infantil.
Não queria nem saber o que teria que fazer se Percy não tivesse se posto entre nós antes de eu o atingir com um raio entre seus olhos.
— Hydra. – quase vomitava pela décima vez quando escutei uma voz baixa
Olhei para os lados, ameaçando pegar minha espada, deslizando a luva para fora dos meus dedos.
— Hydra.
Analisei cada canto do estábulo, a limpeza já quase completa mas um pequeno pedaço ainda sujo do lugar o fazia parecer imundo com seu cheiro. Meus olhos ardiam com o odor tenebroso.
Ei! Não ria!
— Hillary, pelo amor de Poseidon, atrás de você! – mãos agarraram meus ombros, me virando sem muito esforço
Teria usado mais força no gancho de direita que deferi no rosto do indivíduo se soubesse que era Percy.
— Cabeça de Peixe idiota! – exclamei o observando pôr uma das mãos sobre o hematoma, meio sem acreditar que tinha batido nele
— Por que toda vez que você tem a chance de me dar um soco você faz? – levei minha mão ao lugar, só verificando o roxo que ficaria de lembrança por um tempo
— O que você tá fazendo aqui? Nem eu queria estar aqui com esse cheiro terrível quase me fazendo vomitar. – questionei, tentando ignorar o odiando espaço que faltava para que terminasse
— Precisava falar com você a sós. – ele olhou para os lados como se estivesse sendo perseguido, o que era provável já que Tântalo era ligeiramente psicopata
— “ A sós ”? Sobre o quê?
Suas bochechas ficaram vermelhas, como se tivesse comido um pedaço de pimenta sem mastigar direito.
— Não a sós, mas... Sem ninguém por perto... Não sem ninguém! Mas...
— Desembucha, Peixinho Dourado. – disse antes que começasse a ficar nervosa por causa dele, sem nem saber o motivo
— É... Lembra que eu te contei um pouco sobre o sonho de hoje? – assenti. — Temos tempo pra eu dizer o resto?
༄
Ele era péssimo em contar as coisas.
Da primeira vez tudo ficou meio confuso, ele parecia ainda estar assimilando o acontecido e não soube explicar direito.
Agora?
Queria mata-lo por demorar tanto para explicar que precisávamos ajudar Grover o mais rápido possível porque o tal casamento entre o sátiro e o ciclope estava “ marcado ” para menos de um mês.
Ele havia sido atraído para ilha do Polifemo por conta do Velocino de Ouro no lugar, que exalava uma força da natureza grande demais. A força que era necessária para curar Thalia, reforçar as barreiras do Acampamento.
— Annabeth teve uma idéia.
— É claro que foi Annie, não me lembro da última vez que você pensou em algo que não fosse “ glub, glub ”. – ele revirou os olhos com minha piada, reprimindo um sorriso
— Vamos falar com Tântalo essa noite, pedir por uma missão... – explicou
Soltei uma risada sarcástica, negando com a cabeça antes de ficar séria novamente.
— Depois de eu ter desrespeitado ele e termos atraído monstros para a corrida? Acho que não. – revirei os olhos com a idéia boba
— ... No jantar, na frente de todos para que ele seja pressionado a aceitar. – ele terminou
Pensei por um instante, a idéia não parecendo tão ruim com a estratégia deles.
— Eu faço de tudo para sair desse lugar. – aceitei a proposta
— Tinha a impressão de que ia dizer isso.
༒
Já era noite, o chalé de Apollo liderava uma cantoria desnecessária, provavelmente tentando animar todos depois do incidente causado pelos pássaros. O que não funcionou.
Não havia tido tempo para conversar com ninguém além de Percy e notei quando Mark me olhou durante uma das músicas tradicionais, me lançando um sorriso.
Acho que acolhedor?
Provavelmente pela fato de meu castigo ter sido dito na frente de todos, o que tinha me feito ser zombada por algum tempo antes que rosnasse para os idiotas.
Dionísio havia acabado com sua bateria social já que na terceira música desapareceu entre os campistas.
Estava quase agradecida pela cantoria ter acabado quando notei que Tântalo pretendia ir embora também, o que não poderia acontecer hoje, especialmente hoje.
— Bom... Isso foi ótimo! – sua expressão falsa transpareceu
— Senhor... – Jackson se levantou de sua cadeira
— Olhem só se não é o lavador de louças querendo falar? – o home disse maliciosamente, algumas risadas vindas da mesa de Ares acompanhando a dele.
Me ergui do meu assento em seguida, Annabeth logo depois de mim.
— Temos uma idéia para salvar o acampamento. – Percy despejou de uma vez
Tudo se silenciou, a noite ficando mais densa de um segundo para o outro.
Todos, que antes falavam, agora estavam quietos observando o garoto com olhos arregalados.
— Ah é? E como isso? – ele disse duvidando num tom sarcástico
Jackson explicou seu sonho todo, sem que ninguém tentasse interromper nem por um momento, nem um sopro de vento surgindo.
— Sabemos onde o Velocino de Ouro está, podemos ir buscá-lo e salvar Thalia. – finalizei, a expressão de Tântalo nitidamente descontente com a notícia
— O Mar de Monstros é? Ele é imenso, vocês sequer sabem onde esse Velocino está...
— Trinta, 31,75,12. – Percy disse baixo antes de repetir em bom som. — Essas são as coordenadas de navegação, Senhor.
Ele estava sendo inteligente?
Parece que não era só água que tinha em sua cabeça oca.
— Precisamos de uma missão,... Senhor. – reprimi um apelido nada carinhoso
— Esperem só um minuto. – Tântalo disse, mas os campistas iniciaram um coro
— Precisamos de uma missão! Precisamos de uma missão!
Vi raiva tomando o ser do homem antes que ele explodisse gritando para que parassem.
— Está bem! Vocês querem uma missão? Ótimo! Vocês atribuir uma missão ao campeão mais valente de todo acampamento!
Ah, não...
— Clarisse La Rue irá liberar a missão em busca do Velocino de Ouro com outras duas pessoas a sua escolha! – ele apontou para a garota
A mesa de Ares explodiu em uma confusão alegre e todos gritavam o nome da garota.
— Eu aceito a missão dada a mim, Senhor! – ela estufou o peito com coragem
— Era só o que me faltava, ela nem sequer teve o sonho! – exclamei
— Grover é o meu amigo! – Percy disse ao meu lado
— Sentem-se! Vocês tiveram a chance de vocês no último verão! – Talisa Copper rosnou, fazendo Jackson se sentar rapidamente, o que me fez ferver de raiva
— Fica calada, Nariz Sangrento, ou quer lembrar do porquê desse apelido? – disse entre os dentes
— Hydra! – uma mão tentou me puxar
— Você é quem teve sorte do seu pai se intrometer, Estressadinha. – a garota retrucou, o mesmo olhar de seu pai
Espumava de raiva enquanto a encarava com a irritação no limite, meus punhos se cerrando.
Estressadinha? Quem ela pensava que era? Era diferente quando Percy dizia, nunca havia notado o quão raivosa ficaria se alguém, quero dizer, outra pessoa me chamasse assim.
— Não preciso do meu pai para ganhar de você, Nariz Sangrento. Aposto que é de família essa coisa de gostar de perder pra mim...
— Hydra! – me mantive firme em pé mesmo sentindo algo me puxando para baixo, ignorando
— Além disso... me chame mais uma vez assim e pode ter certeza de que não vai ser só o nariz que vai ficar sangrento.
— Hillary.
Me sentei.
Fechei a cara calada, ainda bufando enquanto cruzava as pernas ao lado de Percy,, ninguém se atrevendo a falar algo sobre eu estar na mesa errada, provavelmente pela confusão com Talisa ou mesmo pelo holofote estar sobre Clarisse.
— Quantos outros estábulos você precisa pra saber que ele odeia a gente, Hillary?
Meu corpo ainda reagia se acostumando a situação quando fui tirada da discussão, prestes a se tornar uma briga, de forma abrupta.
Por isso, quando o loiro tocou meu antebraço, numa tentativa de me tranquilizar, meu sistema imunológico o detectou como uma ameaça automaticamente, um choque irradiando sem que o controlasse.
Estava presa aos pensamentos sobre a discussão e somente voltei a me dar conta do meu ao redor quando escutei o pequeno suspiro dado por Percy ao levar um pequeno choque, sua mão se afastando como reação.
— Percy.
Pisquei, o observando tentar minimizar a dor balançando o braço, um leve terror nos olhos enquanto notava o que havia acontecido, vergonha me cobrindo, culpa sendo seguida.
— Me desculpa, foi sem querer...
Segurei os dedos, o trazendo para perto, analisando a queimadura que poderia ficar marcada no lugar.
— Me desculpa mesmo, não queria te machucar...
Só então notei que ainda segurava sua mão, não tão delicada quando esperava, a largando imediatamente.
— Ei, foi só um choquezinho, eu tô bem, Estressadinha.
Ele deu um meio sorriso, fazendo com que erguesse meu olhar, me deparando com sua expressão boba no rosto
— Além disso, você já fez coisas piores comigo. – ele deu uma risada
Uma conversa ecoava no lugar mas de repente não queria mais saber de confraternizar escutando os filhos de Ares se gabando sem que pudesse socar Talisa.
— Eu vou pro meu chalé. – disse, aproveitando que a confusão era completamente generalizada para fugir dali. — Boa noite. – me despedi, sabendo que ele me seguiria se achasse que algo estava errado
Caminhei até o pinheiro de Thalia, não por me sentir conversando com minha irmã, mas conseguia enxergar a constelação de Hillarys e Hydra de lá, trocando algumas palavras com a minha mãe antes de levantar e ir embora antes que alguém me visse.
Fiz o caminho até minha cabine, a número um, a maior, a primeira, a “ mais importante ”, a “ melhor ”.
Esses adjetivos não pareciam servir de nada a não ser que fosse para colocar a culpa em alguém, o mais forte, o líder.
Estava começando a ficar cheia dessas coisas que Zeus vivia dizendo sobre respeito ter de ser o primeiro a ser conquistado.
Numa alcatéia, o líder é descartado quando perde uma luta.
Sua história é ignorada e seu bando o deixa para trás a comando do novo líder.
Não preciso ser respeitada.
Preciso de poder para que não exista nenhuma dúvida sobre meu o respeito.
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— Hydra!
Me mexi na cama, relutando para não acordar ao escutar um voz familiar, provavelmente de um dos vários sonhos com ela.
— Hydra!
Rosnei involuntariamente, me agarrando ao cobertor enquanto respirava profundamente.
— Por Poseidon... Zeus vai me matar, mas foi mal! – uma batida violenta na minha porta fez com que me desse conta de que não estava sonhando
Teria demorado mais alguns minutos para me orientar e talvez levantar para verificar o som perturbador, mas, antes que fizesse, a grande porta se abriu, com dificuldade já que era de fato pesada.
— Hillary, – Percy abriu um sorriso me olhando na cama, minha visão girando enquanto o via entrando nada cautelosamente com algo em mãos. — eu acho que Hermes acabou de me dar suprimentos para irmos numa missão!
Ele tinha invadido o meu chalé para isso?
Não só o meu chalé, mas a cabine de Zeus, o deus que mais odiava ele em todo Olimpo?
Tinha que ser importante.
— O que quem fez hah? – me levantei, meu pijama completamente amassado, meu cabelo pro alto, meu andar torto e minha cara provavelmente com a marca do atrito do travesseiro
— Hermes! Nos deu suprimentos para missão de irmos salvar Grover! – ele exclamou
As paredes da cabine tremeram quando arriscou dar um passo mais próximo da porta, a imagem de Zeus tendo seus olhos cintilando por um segundo.
— Perseu Jackson, – agora era eu quem dava um passo para frente, respirando fundo. – é sério que você invadiu meu quarto para dizer isso que você podia ter claramente dito amanhã quando eu acordasse? – enxerguei quando o rosto do garoto se iluminou levemente com uma luz levemente azul, o reflexo de seus olhos indicando que vinha... dos meus olhos?
— Eh...
Ele engoliu a seco.
— Boa noite, Estressadinha. – bufava de raiva quando ele largou uma das tais mochilas de suprimentos ao lado da minha cama, antes de sair, dando um quase inotável beijo na minha bochecha
A porta da cabine se fechou e o lugar todo ameaçou cair aos pedaços.
— Cale sua boca seu velho!
Gritei, o estrondo cessando no mesmo instante.
Estava vermelha.
Em frente ao meu pai.
Ia matar Perseu.