— Vocês ao menos já se beijaram? — O olhar de Jade era curioso enquanto caminhávamos para o refeitório. O assunto sobre Theo ainda me cercava como se fosse um imã, quando não era ele que aparecia como fantasma, era alguém que comentava sobre ele.
— Sim, mas não foi um beijo de língua. — Falei meio pensativa.
— Não? — Jade arregalou os olhos.
Eu suspirei alto.
— Foi o primeiro beijo dela. — Lucca respondeu por mim.
Fofoqueiro!
Jade ainda parecia pasma com o que Lucca acabara de dizer.
— Isso é sério? — Ela parou e me olhou ainda incrédula.
— É difícil de acreditar que ela nunca tinha beijado por anos. — Lucca se pronunciou mais uma vez.
— Mas por que? — Franzi a testa — É uma regra agora?
— Porque você é bonita — Lucca passou o braço envolta dos meus ombros, o que fez amassar meus cachos.
— E? — Devolvi.
— E você nunca se interessou por alguém a ponto de beija-lá? — Jade perguntou.
— Já me interessei por alguém a ponto de querer beija-lo, mas as coisas não rolaram.
— Tudo no seu tempo — Meu amigo deu tapinha nas minhas costas.
— Então tá, voltando ao assunto. Como foi que vocês se beijaram? Foi um encontro? — Ela parecia tropeçar nas palavras.
— Foi de repente, estávamos aqui na escola perto das arquibancadas, ele disse que queria conversar comigo e então ele me beijou. Eu não soube como reagir, só que Flora apareceu e meio que interrompeu tudo. — Nos aproximamos das comidas pra colocar em nossas bandejas.
O refeitório estava barulhento, alguns alunos gritavam, outros gargalhavam alto demais, os mais novos derrubavam comida, outros começavam a discutir.
— Não imaginei que estivesse assim, até porque não se deram bem desde que você quase o partiu no meio com a bicicleta. — Jade colocava suco e algumas frutas na sua bandeja.
— Foi o que eu pensei também, mas ele de algum modo conseguiu meu número e pediu desculpas pela grosseria, então nos aproximamos.
— Agora ela vive suspirando como uma donzela apaixonada à espera de seu príncipe encantado reagir e descer do cavalo branco. — Lucca falou piscando os olhos várias vezes e suspirando.
— Idiota. — Eu revirei os olhos.
— É perceptível. — Jade deu um meio sorriso.
Jade era uma amiga legal, fascinava todo mundo com seus grandes olhos castanhos claros e seu jeito descolado, sempre participativa de festas e pegava quase todo mundo. Era aquele tipo de pessoa da galera, topava quase tudo e adorava aproveitar a vida como bem entendesse.
Certamente só pessoas ricas e com pais paparicando podem fazer o que bem entendem.
Depois, carregamos as nossas bandejas até uma mesa vazia e ficamos por lá. Eu coloquei apenas batatas fritas que tinha disponível e suco de caju. Nós três havíamos começado a andar juntos nos últimos tempos — não grudados o tempo todo — e nos acostumamos assim.
— Vocês ainda estão treinando futebol? — Lucca perguntou.
— Na verdade, estamos jogando queimado — Respondi.
— Até que é legal, eu sempre posso descontar a raiva em alguma mocreia daqui — Jade sorriu.
— O ruim é levar uma bolada na cara — Gargalhei ao mesmo tempo que recordava da bolada que Jade levou.
— Eu fiquei tão vermelha que parecia que minha cabeça ia explodir, quase chorei — A de olhos claros sorriu.
Minha atenção foi tirada da conversa quando o meu celular vibrou no cós da minha saia. Eu quase saltei da cadeira de susto. Peguei o celular nas minhas mãos ainda abaixo da mesa e vi pela barra de notificações uma mensagem de Theo.
Theo
Devia sorrir mais vezes.
Franzi a testa, meu olhar varreu quase todo o refeitório e meu coração palpitou quando meus olhos bateram em uma mesa mais a frente da nossa. Theo estava lá, com os seus olhos esverdeados grudados em mim, a sua boca se esticou em um discreto e malicioso sorriso e em seguida, passou a língua por ela. Podia sentir minhas bochechas esquentarem e meu olhar logo se desviou para a tela do celular, disfarçando a vergonha de estar o criando fantasias.
Maldito. O que ele quer com isso?
Anelise
Tá me vigiando?
Theo
Quase. Só não pude deixar de notar a sua risada.
Hum, por que isso soou atraente?
Anelise
Te responderia igual a Flora: Não o culpo, sou irresistível.
— Anny? — A voz grossa soou abafada e longe agora.
— Anelise! — Jade quase gritou ao pé do meu ouvido, isso me fez saltar de susto.
— Garota? — Jade franziu a testa.
— Garota? — Lucca fingiu estar indignado pela minha falta de atenção na conversa.
— Desculpa, me distrai. Do que falavam? — Balancei a perna freneticamente e inutilmente evitava olhares para mesa de Theo, que estava ainda acompanhado da loira que lhe cercava como um urubu na carniça.
— Que você e a Lavínia estão demonstrando muita rivalidade, que daqui a pouco todo mundo vai tonar e...
Meu celular vibrou mais uma vez e automaticamente dei uma olhada na mensagem.
Theo
Mt convincente.
Eu coloquei meus olhos sobre ele novamente, que fez o mesmo. Ao lado dele, Lavínia falava alguma coisa para o grupo na mesa — ela chamava toda a atenção— e todos riam do que ela contava, menos Theo, que parecia concentrado no lado da nossa mesa, ele varreu seu olhar por Jade e Lucca, mas logo se voltou para mim. Mantinha sempre aquela uma postura duvidosa, nunca adivinhava qual seria o eu próximo passo, o que ele queria, o que ele pensava. E a sua postura só me instigava mais.
Por que ele simplesmente não atravessa esse refeitório me puxa pelo braço, me leva pra algum lugar reservado e me beija até eu perder o fôlego?
Mas para meu desânimo, o moreno deu retorno de atenção para seu grupo e consequentemente, para Lavínia. Ele passou os braços por seus ombros e sorriu, exibindo seus dentes brancos e alinhados. A loira ao seu lado estava mais maquiada do que o normal, o que destacou seus olhos azuis.
Talvez Flora estava certa, eu deveria incomodá-lo, provocá-lo.
— Olha só para ela, continua com essa cara de mosca morta — Lucca estalou os dedos próximo aos meus olhos e eu pisquei.
— Claro, ela e você-sabe-quem estavam quase se comendo com os olhos — Jade olhou para mesa onde Theo estava.
Um pouco melhor que isso.
Enterrei o celular discretamente no cós da saia.
— Não.. — Lucca deu uma pausa dramática — Na nossa presença? Com tanto descaramento? — Ele colocou a mão no peito.
Eu fiz uma expressão de tédio para ele e suspirei.
— Como estão as coisas por aí? — Minha mãe perguntou enquanto me encarava do outro lado da tela.
Ela estava com uma aparência abatida, havia algumas orelheiras abaixo de seus olhos, sua boca um pouco ressecada e parecia estar em uma luta contra o sono. Seus cabelos estavam amarrados em um coque e ela estava mais bronzeada. Ela havia me falado que procurava por um emprego, o sol deve ter a castigado muito.
— Bem e por aí? — Me encostei na cadeira do meu quarto.
— Bem, tua avó melhorou mais da febre, ainda tá gripada, mas bem melhor. — Ela me lançou um sorriso reconfortante.
— Posso ver ela? Ou ela ainda tá dormindo?
— Tá dormindo. Esses remédios dão muito sono. — Ela bocejou.
— A senhora parece muito abatida, tenta descansar um pouco.
— Já descansei, tô ótima.
— Mãe, é sério. Da pra ver que a senhora não dorme direito faz um bom tempo. E eu sei que a senhora tá procurando por um emprego de novo, mas noites mal dormidas prejudicam muito a saúde. — Meu tom era sério, segurei o celular com mais força.
— Anelise, fica tranquila. É só por uns dias. — A câmera oscilava um pouco por conta da qualidade do celular — Tu tá indo bem na escola? Como estão as notas?
— Estão ótimas, depois mando as fotos das notas de algumas avaliações e trabalhos.
— Tá se envolvendo com algum menino?
Eu fiz careta.
— Não. Ainda não.
— Não vou te proibir de nada, contanto que isso não atrapalhe seus estudos e que te trate bem.