— Oi, filho! — Solange abriu a porta da casa que parecia gigante. Morava em um residencial perto dali. — Oi, Sophia! — Franziu a testa sem entender o que os dois faziam juntos ali. — Você não devia estar descansando?
— Devia. — Sorriu sem graça. — Mas a minha vida virou de ponta cabeça.
— Meu pai está ai? — Perguntou depois que a mãe lhes deu passagem. Caminhavam pra sala, juntos. Solange ainda muito confusa em relação a eles. — Preciso conversar com ele.
— Está no escritório, mas eu acho que também preciso de uma explicação, será que um dos dois pode falar pra mim? — Solange pediu e Micael encarou Sophia. — Gente, falem de uma vez, estou ficando nervosa.
— Sophia vai contar pra você o que aconteceu, e eu vou lá conversar com meu pai, tudo bem? — Voltou o olhar pra mãe. — E torcer pra essa conversa ser razoável. — Ele se afastou de Sophia, deu um beijo na mãe e ia caminhando pra dentro, até se dar conta de que não fazia ideia de onde era o escritório. — Mãe?
— Sobe a escada, vira à direita e diante do corredor, escolha a terceira porta à esquerda. — Explicou e ele assentiu, subindo as escadas e já se perdendo completamente na imensidão daquela casa. Pra que os dois precisavam disso tudo se eram apenas eles, era o que passava em sua mente o tempo todo.
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— Solange... — Sophia tentava escolher bem as palavras, mas era dificil. — O que aconteceu foi...
— Vocês dois com esse suspense estão me deixando muito preocupada. Diz de uma vez, só diz. — Pediu alto e com um suspiro, Sophia se aproximou com o bebê e mostrou a ela.
— Esse é o Levi. — Apresentou a mulher que olhou bem para o bebê e ficou em choque, pelo menos até sorrir, quando se deu conta de que era avó. — Ele é...
— Filho do Micael! — Completou toda boba. — Eu sou vovó! — Estendeu os braços pra pegar o neto. — Oi, Levi! — Brincou com o netinho. — Como você é lindo, meu amor. — Se sentou no sofá e fez carinho no bebê. — Senta, Sophia. — A loira sentou ao seu lado. — Desde quando vocês sabem disso?
— Eu sei desde quando o Levi nasceu, é inegavel. Micael descobriu hoje. — Contou mais triste. — Hoje foi um longo dia e agora eu estou aqui, sem teto, sem uma fralda pra colocar no meu filho, não sei bem o que fazer.
— Augusto não reagiu muito bem?
— Ele fingiu que nem viu semelhança e me convenceu a fingir que não havia. — Contou com pesar. — Eu fiz coisa errada demais com o Micael, Solange. — Estava a ponto de chorar. — Eu não sei como ele ainda olha pra mim.
— Todo mundo comete erros. — Tentou defender. — Ele com certeza cometeu os dele também.
— Não tem comparação. — Olhou pro pequeno bebê. — Não sei nem o que dizer a ele quando ficarmos sozinhos. Ele devia me odiar, eu deixei o Guto registrar o Levi.
— Isso aí foi um grande erro mesmo. — A loira se levantou. — Mas tudo se resolve, digo, eu também estava com raiva de você, mas vi o bebê e a raiva passou. Aposto que a dele vai passar também.
— Descobrimos que foi o Augusto que armou pro Micael ser preso. — Contou e viu Solange ficar de pé num pulo, assustando o bebê que tinha no colo. — Calma!
— Isso é algo muito sério pra se dizer! Augusto é meu afilhado! — Estava ainda mais nervosa, devolveu o neto a mãe. — De onde surgiu essa fofoca?!
— Senta aqui que eu te conto tudo o que aconteceu. — Deu batidinhas no sofá e Solange respirou fundo antes de se sentar. — Mas você vai precisar manter a calma.
— Fala de uma vez que eu aguento. — E então Sophia começou a contar o que sabia e Solange ouviu em silêncio, perplexa a cada palavra.
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Micael bateu na porta do escritório do pai, pelo menos na que achou que era, aquela já era a quarta porta que batia. Comemorou quando ouviu um "entra" baixinho.
A imagem do pai com seu óculos de leitura e a cara enfiada no computador lhe apareceu. Luiz sempre teve um pouco de dificuldade com aquilo.
O velho homem ergueu a cabeça e a imagem do filho lhe surpreendeu. Tirou o óculos e se recostou na cadeira, pensando no que é que ele poderia ter ido fazer ali.
— Você não é bem vindo aqui. — Quebrou o silêncio atingindo Micael em cheio. — Não sei porque Solange insiste num caso perdido como você.
— Boa noite, pai. — Ignorou o que lhe foi dito, sabia que antes que ele lhe ajudasse, ia ser duro. — Está tudo bem?
— Estava. — Disse no mesmo tom agressivo de antes. — Veio me pedir o quê? Dinheiro? Cansou da vida medíocre que estava levando?
— Será que podemos conversar sem que você me humilhe o tempo inteiro? — Pediu e viu o pai negar com a cabeça. — Eu preciso de ajuda.
— Claro que precisa, ajuda de um psiquiatra. Alguém que faz o que você fez não é normal. — Micael abaixou os ombros e caminhou pra dentro. — É sério, você veio até aqui me pedir o quê? Não sei como tem coragem.
— O senhor não me deixa falar, fica me acusando o tempo inteiro, parece que sente prazer nisso! — Se irritou e Luiz ficou de pé.
— Olha como você fala moleque! — Apontou bravo.
— Pai, o Levi nasceu. — Resolveu falar ao invés de ficar batendo boca com o pai. — Por isso que eu preciso de ajuda.
— Eu sei que nasceu, Cláudio me ligou pra avisar. — Se sentou novamente. — O que o filho do Augusto tem a ver com você?
— Não é filho do Augusto, é meu filho. — Luiz arregalou os olhos e só faltou mudar de cor. — Meu filho com a Sophia.
— Você transou com a esposa do seu melhor amigo? — Disse baixo. — É sério, você não cansa de decepcionar? Como é que está o Augusto com tudo isso? Coitado!
— Pai, o Augusto não é o seu filho. — Disse com paciência. — Eu sou! Será que uma vez pode me ouvir e prestar atenção no que eu tenho pra dizer.
— Não seja insolente, eu sempre te ouvi e te dei o que você quis! — Bateu as mãos na mesa. — Você se afastou de mim e da sua mãe antes mesmo de estragar toda a sua vida!
— Tá legal, eu sei o que eu fiz, mas eu tinha o direito de estar com raiva, vocês sumiram no mundo, venderam nossa casa e eu fiquei sozinho com dezessete anos.
— Você não foi com a gente porque não quis. Ficou aqui por causa da sua namorada, não vem com historinha no meu ouvido.
— Foi o Augusto que armou pra mim. — Contou, já estava cansado das discussões. — O estupro nunca aconteceu.
— Você só pode estar de brincadeira. Ele nunca faria isso. — Defendeu mais uma vez. — O cara é seu amigo desde sempre, vocês dividiam berço enquanto nós quatro estávamos juntos, não é justo você surtar e falar bosta.
— Eu sei disso, talvez por isso que eu demorei tanto a descobrir a verdade. — Parecia triste. — Caroline, a mulher que me acusou, foi lá no apartamento do Arthur e me contou toda a verdade.
— Essa mulher te acusa, faz com que seja preso e então aparece anos depois acusando seu amigo e você acredita?
— É difícil acreditar que ele seja assim, mas é verdade. — Puxou a cadeira e se sentou diante do pai. — Ela contou toda a história, nos mínimos detalhes, tudo se encaixou.
— A troco de quê? Essa mulher pode ser presa por isso.
— A Raquel é amiga dela. — Deu de ombros. — Sabe a Raquel? A mulher que você não fez nem questão de conhecer na festa da Andressa. Tudo uma grande coincidência.
— E cadê essa mulher? Eu quero falar com ela. — Micael percebeu que já tinha conseguido no mínimo o benefício da dúvida.
— Eu vou ligar, mas não sei se ainda estão aqui no Rio. Elas estão morando em Santa Catarina. — Desbloqueou o celular e botou pra discar o número de Raquel.
— Se tiverem lá, eu pago a passagem, mas eu as quero aqui. — Micael rolou os olhos e ligou pra ex-namorada. Que confirmou que só iriam embora no dia seguinte e que podiam passar lá sim.
— Enquanto elas não chegam, não quer ir lá embaixo conhecer seu neto? — O sorriso de Luiz se abriu ao pensar que realmente tinha um neto, mas ele não demorou a disfarçar.
— Você trouxe a Sophia e o Levi pra cá? Ela separou do Augusto?!
— Eu não ia permitir que ela ficasse debaixo do mesmo teto que aquele psicopata. — Voltou a ter raiva. — E foi o que eu vim pedir a você, que deixe a Sophia ficar aqui com Levi.
— Passou pela sua cabeça que eu ia desamparar o meu neto? — Micael deu risada. — Ele não tem culpa do pai que tem.
— O senhor vai morder a língua quando ouvir as duas contando essa história. — Se levantaram e caminharam até a sala. Micael atrás de Luiz, com as mãos nos bolso e uma certa expressão de satisfação.
— Conseguiram se entender? — Solange perguntou ao marido. — Não ouvi gritos, imagino que sim.
— Eu quero ver o meu netinho. — Chegou perto de Sophia, que tinha o bebê adormecido nos braços. — Tudo bem, Sophia?
— Bem mais ou menos. — Forçou um sorriso que foi retribuído por Luiz. — Quer segurar? — O ex-sogro se sentou e Sophia lhe deu o bebezinho.
Em seguida Sophia ficou de pé e Solange sentou ao lado do marido, ambos babando o pequeno Levi. A loira foi pra perto de Micael e ele passou o braço pelos ombros dela.
— Parece até que tudo vai ficar bem. — Sophia sussurrou a Micael.
— E vai, tudo vai ficar bem.