Após ser surpreendida por sua presença agradável, fui levada por Camila até uma saída lateral, e a música parecia cada vez mais distante quando nos deparamos com o céu estrelado, e algumas poucas nuvens sobre nós duas.
O silêncio da rua vazia me trouxe certa tranquilidade, e nos sentamos lado a lado sobre a guia da calçada, sem dizer nada. Sob a luz da lua, o vestido vermelho que cobria seu corpo se destacava ainda mais, conforme um leve delineado contornava seus olhos, sempre totalmente focados em mim.
- Não sei se eu deveria aceitar uma bebida de uma quase desconhecida. - Falei baixo, encarando o copo em minhas mãos.
Camila sorriu, e se virou para mim ajeitando os longos cabelos de maneira adorável.
- Prometo não envenenar você. - Ela brincou, e eu ri, levando o copo aos lábios e sentindo um alívio imediato causado pelo frescor da água.
A aquela altura, eu já não me importava, de qualquer maneira.
- Quem era ela?
- Minha ex-namorada. - Respondi, com desânimo. - Terminamos recentemente.
- Vieram juntas? - Neguei imediatamente.
- Definitivamente não. Eu vim com a Dinah, minha melhor amiga, mas no momento ela está ocupada com a língua na boca de algum cara por aí. - Camila riu baixo. - E você, veio sozinha?
- É, eu só precisava pensar em algo que não fosse o trabalho.
- Com o que você trabalha? - Não resisti em matar minha curiosidade.
- Com o que acha que eu trabalho?
Levei uma das mãos ao queixo, pensativa sobre o que dizer em seguida. Tudo o que eu sabia era que ela se mudava com frequência, e provavelmente tinha horários minimamente flexíveis, por tê-la encontrado no parque durante a tarde.
- Algo relacionado a turismo? Jornalismo? - Camila negou. - Comércio exterior, talvez?
- Você é boa nisso. - Ela exclamou, e eu sorri, orgulhosa por ter acertado.
O silêncio caiu sobre nós duas novamente, e eu encarava o colar em minhas mãos, sem saber bem o que dizer, balançando o pingente de um lado ao outro, tentando não pensar nas palavras vazias de Lucy. Eu poderia não admitir, mas sentia falta dela, mesmo sabendo que não deveria.
- Esse colar é realmente importante para você, não é? - Camila apoiou a cabeça sobre um de meus ombros para vê-lo mais de perto.
- É complicado, na verdade. Ele é a única pista que tenho de uma noite da qual me esqueci totalmente. Pensei que poderia ter sido um presente de Lucy ou algo assim, mas claramente eu estava errada.
- Realmente não se lembra de nada sobre essa noite? - Eu não poderia culpá-la por perguntar, era mesmo difícil de acreditar.
- Praticamente. Eu me lembro de ir até o bar, beber um pouco, e então acordar em casa no dia seguinte. É um pouco angustiante, na verdade.
- Tenho certeza de que se lembrará logo. - Ao final daquela frase, ela retirou o objeto das minhas mãos cuidadosamente, e voltou a colocá-lo ao redor do meu pescoço, fazendo-me arrepiar com seus toques. - E ele fica muito bonito em você.
- Eu sou mesmo um desastre. - Pensei alto.
- Por que diz isso?
- Porque estou arruinando minhas chances com uma mulher maravilhosa, falando com ela sobre a minha ex.
Ao ouvir aquilo, Camila riu e apoiou uma das mãos sobre a minha coxa, acariciando minha pele na região descoberta pelo vestido, conforme nossos olhares se encontraram.
- Eu não teria tanta certeza.
- O que quer dizer com isso?
- Que deveria mostrar a essa Lucy o que ela perdeu.
Naquele instante, senti meu celular vibrar sem parar, e inúmeras mensagens de Dinah surgiram na tela, perguntando onde eu estava, e dizendo que eu nunca acreditaria em quem ela havia visto, naquela mesma festa. Aquele aviso havia chegado tarde até demais, mas eu apreciava suas boas intenções.
- Preciso ir, minha amiga está me procurando. - Lamentei.
- Diga a ela que você já vai.
Antes que eu pudesse questioná-la, Camila aproximou-se de mim e juntou nossos lábios em um beijo suave, conforme minhas mãos deslizavam por sua cintura e a envolviam devagar. Foi um gesto breve e surpreendente o bastante para me tirar o fôlego, e um sorriso bobo tomou meus lábios quando nos afastamos.
- Obrigada pela companhia, Elle. Você salvou minha noite.
E tão rápido quanto havia surgido, ela desapareceu através da porta pela qual havíamos saído, deixando-me para trás totalmente extasiada, e sem saber como reagir.
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Dinah e eu estávamos lado a lado no banco de trás de um táxi, a caminho do nosso apartamento, e meus pensamentos eram preenchidos pelas lembranças de uma noite totalmente imprevisível.
Uma noite que eu pensei estar arruinada no momento em que vi minha ex-namorada, mas eu não poderia estar mais enganada.
- Você demorou. - Ela reclamou.
- Você não é a única que pode aproveitar sua noite. - Rebati, com um sorriso discreto no canto dos lábios.
- Eu honestamente espero que não esteja se referindo a Lucy. Ainda não acredito que aquela vagabunda veio ao mesmo lugar que nós!
- Nem me fale. Essa é uma parte da noite que eu prefiro esquecer, e fingir que nunca aconteceu.
Minha amiga suspirou aliviada, e voltou a encarar os prédios através da janela do carro, até se dar conta de um detalhe.
- Espere, se não foi ela, então você de fato estava com outra pessoa! - Esbocei um sorriso tímido, e assenti devagar. - Pode começar a contar tudo!
- Não há muito para ser contado. Eu conheci essa mulher, Camila, em um dia no parque, e hoje nos encontramos novamente. Ela é simplesmente encantadora, eu acho que nunca vou parar de sonhar com aquele beijo.
- Uau! Isso não me soa apenas como uma ficada qualquer... quando vão se ver de novo? - Abaixei o olhar sem dizer nada. Aquela era uma boa pergunta. - Michelle, você não a chamou para sair? Ao menos pegou o contato dela, certo?
- Talvez eu fizesse isso, se você não nos interrompesse com milhares de mensagens.
- Não pode me culpar por isso, eu estou enjoada, quero ir para casa. - Dinah resmungou, conforme jogava o corpo sobre o meu, apoiando a cabeça no meu colo.
- Eu sempre digo a você para não beber demais. Precisa conhecer seus limites. - Falei, conforme acariciava seus cabelos devagar.
- Oh não, eu quase não bebi. Acontece que muitos dos caras por aqui não conhecem uma brilhante invenção chamada pasta de dente.
- Ew, que nojo, Dinah! - A empurrei para longe, e a loira começou a rir sem parar.
- Vem cá, Elle! Não quer um abraço? Estou com saudade!
- Fique longe de mim! - Exclamei, conforme ela tentava me envolver em seus braços, e eu a empurrava para longe, sem conter minhas próprias risadas.
Não havia como negar, era maravilhoso tê-la ao meu lado.
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- "Naquela noite, Olive retornou a seu castelo como se caminhasse sobre as nuvens, extasiada com as sensações que o belo príncipe a havia causado com um único beijo. O futuro era incerto, mas seu desejo era um só: poder, um dia, encontrá-lo novamente."
- Genial! Brilhante! Espetacular! - Olivia aplaudia sem parar, como se não estivéssemos no meio de uma cafeteria lotada.
- Fico feliz que tenha gostado. Creio que possamos seguir esse mesmo caminho nos próximos capítulos. - Sorri, orgulhosa do trabalho que havia feito.
- De onde é que você tira tantas boas ideias?
- Eu... tenho minhas fontes de inspiração. - Cocei a cabeça. - Tudo certo com o primeiro capítulo então?
- Há apenas uma coisa que eu não entendo. Qual a necessidade da presença do príncipe Lucas no enredo? Ele é um grande babaca egocêntrico, só a fez sofrer, e brincou com os sentimentos dela. Olive não precisa dele, ela tem Simon.
Respirei fundo antes de responder, escolhendo minhas palavras cuidadosamente.
- Olive é uma mulher forte e decidida, que busca sua alma gêmea, e mesmo se tratando de uma ficção, o amor nunca vem tão facilmente. Talvez ela, um dia, tenha pensado que Lucas fosse a pessoa certa. Que se casariam, formariam uma família, e reinariam juntos pelo resto de suas vidas.
- Ele só fazia mal a ela. - Concordei com a cabeça.
A princesa havia demorado até demais para chegar a aquela conclusão.
- E por isso eles não estão mais juntos. Mas ainda assim, ele fez parte da história dela, e de certa forma, contribuiu para que ela se tornasse quem é, quando seu caminho cruzou o de Simon.
Olivia assentiu, com um sorriso gentil no rosto. Dizer aquelas palavras em voz alta me ajudou a compreender o quanto eram verdadeiras, e perceber que, de uma vez por todas, já era hora de seguir em frente.
Eu só esperava que meu final fosse tão feliz quanto o que eu estava planejando para a princesa Olive.
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Meu destino seguinte foi o parque mais próximo, com meus poucos pertences em mãos, e uma falsa convicção de que a inspiração era tudo o que eu buscava ali. A brisa do outono, o perfume das flores, e até mesmo a melodia que um músico tocava ao fundo eram apenas alguns dos fatores que contribuíam para que a lembrança de Camila permanecesse vívida em minha mente.
Avistei a mesma árvore que me havia chamado a atenção anteriormente, e deitada sobre a grama, lá estava ela. Os cabelos castanhos misturavam-se às folhas amareladas, e ela hora ou outra mantinha os olhos fechados, quando não estava observando o céu em silêncio.
O sorriso que se desenhou em meus lábios foi apenas consequência de uma cena tão fascinante.
Camila parecia imersa em seu próprio mundo, ao ponto de não notar minha presença até que eu decidisse me juntar a ela, e me deitar ao seu lado na grama. A morena sorriu ao me ver, e imediatamente retirou seus fones de ouvido.
- Atrapalho? - Questionei, vendo-a negar imediatamente.
- De forma alguma, eu na verdade estava torcendo para que você viesse.
Ouvi-la falar daquela maneira fez meu sorriso aumentar ainda mais.
- Esse é um lugar que me traz muitas inspirações.
- Para a sua escrita? - Assenti. - E quando terei a oportunidade de ler algo seu?
- Talvez você já tenha lido, e nem saiba. - Camila franziu o cenho, e eu caí na gargalhada. - Eu trabalho como ghost writer, há muitas obras minhas por aí, ainda que não levem o meu nome.
- Isso é incrível! Você é quase uma agente secreta literária. - Sua definição me fez rir ainda mais.
- Eu nunca havia pensado dessa forma, mas realmente amo o que faço.
- Não gostaria que as pessoas soubessem que estão lendo uma obra sua?
- Na verdade, não. O anonimato me traz a segurança e liberdade para criar, ainda que sempre respeitando os limites estabelecidos por meus clientes. - Camila concordou com a cabeça, mostrando que compreendia.
Só então me permiti observar a imensidão azul que ela tanto parecia admirar. O céu estava quase totalmente limpo, enfeitado por algumas finas nuvens que tornavam o cenário ainda mais encantador.
- É lindo, não? - Sua voz voltou a atrair minha atenção. - Seattle é mesmo maravilhosa.
- Ah sim, sem dúvidas. Há muitas coisas maravilhosas por aqui. - Ao final daquela frase, minha atenção deixou a paisagem, para se focar exclusivamente nela.
Acariciei seus cabelos com uma das mãos, e Camila negou com a cabeça, quase como se não acreditasse no que ouvia.
- Por acaso está flertando comigo, Michelle? Porque, sabe, não quero confundir as coisas. - A morena sorriu de maneira maldosa, e eu sabia que aquela não era uma pergunta sincera.
Ela sabia tão bem quanto eu o que acontecia ali, e isso estava claro. Mesmo assim, decidi entrar em seu jogo, e diminuí drasticamente a distância entre nós duas, apreciando o perfume de rosas que exalava de sua pele.
- Oh não, não se preocupe... eu definitivamente estou flertando com você. - Minha resposta saiu em um tom mais baixo, e me apoiei sobre um dos cotovelos, com meu corpo inclinado sobre o dela. - A verdade, é que eu não consigo parar de pensar no seu beijo.
- E por que é que você ainda está falando?
Foi aquela a frase que me fez encerrar a distância entre nós duas pela segunda vez. Camila segurava o tecido da minha blusa e me puxava para si, conforme eu apreciava a maciez de seus lábios e sua língua, desejando poder sentir aquilo para sempre.
Sua presença era leve e agradável, ao mesmo tempo em que me tirava o fôlego. Beijá-la era como estar no paraíso, ainda que por alguns breves segundos, até que trocássemos olhares, e ela voltasse a avançar sobre meus lábios.
Aquilo durou até que eu me desequilibrasse e caísse sobre ela na grama, arrancando risadas de nós duas.
- Me desculpe, eu acho que estraguei totalmente o momento. - Falei, entre risos.
- Eu não diria isso, você pode cair em cima de mim sempre que desejar. - Camila rebateu, para a minha surpresa.
Tentei voltar a me deitar ao lado dela, mas fui impedida por seu toque firme em minha cintura, então ali permaneci. Entre beijos e diálogos breves, mal vimos o tempo passar. Em um certo momento, a morena me ofereceu um de seus fones de ouvido, e me juntei a ela para apreciar a melodia e a paisagem que nos cercava.
Apenas quando começou a escurecer eu me dei conta de que ainda existia um mundo externo a nós duas, e eu não poderia ignorá-lo para sempre. Camila se levantou dali a muito contragosto, e me ajudou a fazer o mesmo antes de selar os lábios nos meus pela última vez.
- Quero vê-la novamente. - Falei, sem pensar. - Sem precisar contar com a sorte, dessa vez.
Dinah ficaria orgulhosa.
A morena pareceu hesitar, mas anotou meu número, e nos despedimos com a promessa de que ela entraria em contato assim que possível.
Eu não queria fazê-la sentir pressionada, mas nunca havia sido boa em disfarçar meus sentimentos, especialmente quando eles vinham com tamanha intensidade como os que ela me causava.
O céu já era azul escuro quando adentrei o apartamento, ainda sentindo-me extasiada com as lembranças de toda uma tarde passada na melhor das companhias. Dinah havia me avisado que precisaria trabalhar até tarde, então eu teria o local todo para mim por algum tempo.
Ao menos era o que eu pensava.
No instante em que a porta foi trancada, uma figura conhecida até demais se aproximou, e me empurrou contra a parede mais próxima. De olhos arregalados, fui incapaz de mover um músculo conforme Lucy Vives acariciava meu rosto com a ponta dos dedos.
- Como foi que entrou aqui? - Minha voz falhou.
- Ainda tenho a chave. - A mulher sorriu, e girou o objeto metálico entre os dedos.
Aquilo só poderia ser um pesadelo.
💎
O que estão achando? É pedir demais uma boiolagem dessas na minha vida?
Sobre essa visita indesejada, eu não vou nem falar nada...
Até logo, bbs! 💕