Coração Valente

By __TheEvilQueen

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Os pés sangravam conforme ela corria desesperada por galhos, folhas e pedras. O ar estava quente e cheio de f... More

Apêndice
Prólogo: O fim e o começo.
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By __TheEvilQueen

Katarina

O cheiro de carne queimada irritou seu nariz. Katarina olhou para os resquícios de pele derretida, os ossos tinham sido reduzidos a pó e a armadura jazia caída como um molde sem corpo. Seus braços ainda estavam parados em frente ao rosto, uma tentativa fútil de se defender do golpe que acabaria com a sua vida.

Arfando, em choque, mexeu os braços trazendo-os para si e esse mero movimento arrancou um suspiro assustado da multidão. Katarina arregalou os olhos, acuada como uma criatura selvagem prestes a ser morta.

Colocou-se de pé lentamente. Seus olhos castanhos se ergueram, o mundo estava em silêncio. As pessoas em um raio de cinco metros dela estavam caídas no chão, atordoadas, algumas inconscientes, haviam partes queimadas e muitas pareciam cegas. A maioria dos guardas próximos estavam caídos e isso incluía a general. O restante da multidão não se mexeu, eles a encaravam incrédulos, sem dizer uma palavra, com medo demais de serem atingidos caso fizessem movimentos bruscos.

O sangue de Katarina fervia nas veias e apesar do medo constante ela sentiu que conseguia respirar melhor pela primeira vez nos seis meses que se passaram desde sua chegada em Florenscia. Era como uma pressão que comprimia os pulmões, aquela dor de cabeça latente, tivesse de certa forma se dissipado.

Voltou sua atenção para as mãos que formigavam e viu eletricidade pura fluindo pelas veias da pele branca, como se fosse seu próprio sangue, iluminando com um tom azulado o antebraço, as mãos e ziguezagueando pelos dedos até as pontas onde raios de energia escapavam, tilintando contra sua pele.

A dobradora sentiu a respiração parar, olhos arregalados fixos nos raios que lhe escapavam pelas mãos. Ela só queria que aquilo sumisse, que tudo parasse. Tentou desesperadamente esfregar uma mão na outra, lavar a magia ou que fosse aquilo, como se pudesse arrancar os raios com um toque. Ao invés disso raios foram disparados em direções aleatórias e pessoas foram atingidas.

Gritos de desespero explodiram e o mundo pareceu parar.

Lágrimas escorreram pelos olhos e em questões de segundos ela pôde ouvir uma voz masculina forte e estranhamente familiar emanando:

− Peguem-na!

Passos pesados de centenas de soldados começaram a descer o morro em sua direção e Katarina viu o momento exato em que o príncipe soltou as amarras da besta amarela.

Ela girou nos calcanhares e disparou rua abaixo se esgueirando pelos becos e vielas, o mais rápido que suas pernas sedentárias podiam. Katarina arfou enquanto as lágrimas e a saliva escorriam pelo corpo e ela lutava contra as pernas bambas e à vontade incontrolável de desabar sob os próprios pés.

O barulho dos gritos da população e dos militares era a única coisa passível de se ouvir. Katarina desceu por uma rua, atravessando uma pequena ponte que cruzava o córrego onde barcos lotavam com comerciantes. A sapatilha de pano velha se desgastou com a corrida, enroscando-se em um dos pedregulhos da estrada, ela tropeçou e caiu no chão.

A sapatilha se perdeu e Katarina rolou o resto da descida da ponte, batendo a cabeça, os joelhos e os antebraços. A dobradora mal teve tempo de sentir o ardor dos ferimentos antes que um zumbido se aproximasse rapidamente e a ponta de uma flecha acertasse sua bochecha de raspão arrancando um filete de sangue antes de se fincar no chão a sua frente.

Cambaleando se ergueu e continuou a correr, mesmo que um tanto manca. Sabia que a matariam se continuasse em um terreno tão aberto e fez um desvio rápido por uma passagem entre duas construções estreitas, rezou para que o pequeno espaço atrasasse a passagem dos militares e das flechas.

Esgueirou-se arrastando pelas paredes, saiu por um vão dos fundos, pulou um córrego e seguiu desesperadas entre as vielas mais estreitas fugindo para qualquer lugar que não fosse ali. Ela caminhava cada vez mais fundo para as partes mais simples e degradadas de Florenscia.

Parte do sangue escorria quente pelo seu rosto, grudando parte dos cabelos na testa, Katarina precisou parar por um segundo para limpar o sangue e liberar a visão. Sentia os machucados latejando no corpo mas não se permitia sentir dor. As mãos ainda cintilavam com correntes elétricas e pequena pausa a fez perceber que sua estratégia havia funcionado, ao menos os gritos dos militares haviam ficado mais distantes.

Se permitiu recuperar o fôlego por um minuto, uma besta negra irrompeu pela viela por onde havia passado. Era gigante, pelo menos dois metros de altura, pelo menos quatro de largura. Katarina o observou sob a máscara que usava para o baile, a pelagem alaranjada, os olhos verdes como esmeraldas brilhantes, a atmosfera assassina. A criatura rosnou mostrando os dentes, farejando o cheiro dela.

Não se permitiu pensar e disparou pelas ruas, se juntando-se a sombras dos prédios, tentando derrubar o que houvesse no seu caminho para bloquear o caminho da fera. Aquela sensação voltava de sufocamento voltava a encher seu coração enquanto engolia o desespero e se afogava nele.

Sabia que não teria chance, que o animal seria rápido demais.

Desviou, o melhor que pode alcançando as laterais e as regiões mais esparsas. Irrompeu no quintal de uma casa, onde um gramado bem cortado a separava da floresta iminente. Correu, com os pés esfolados e estava na metade quando ouviu o rugido da fera, sentiu-a acelerar, os passos aumentando.

Tentou correr com mais força, notou sons ocos guturais vindo diretamente da terra. Cada passo seu deixava uma rachadura no chão. A terra se abria lentamente.

Katarina conseguia sentir a respiração ofegante do seu perseguidor. Perto demais.

Tentou acelerar mas as pernas estavam cedendo com a fadiga e então seu corpo foi rapidamente puxado com um tranco e ela caiu no chão. O tigre imenso havia conseguido arrancar parte do seu vestido, expondo suas pernas com arranhões. Katarina se virou para ele sentada no chão, tentou se arrastar no chão com as mãos. O corpo todo tremia.

Katarina soube que morreria ali.

A fera se aproximou, não precisava ser rápida, a sua presa já estava a sua mercê. Katarina sentiu a máscara frouxa no rosto e quanto a fera se colocou sobre ela, cobrindo-a totalmente o corpo e forçando-a a se deitar, a máscara escorregou para longe e a dobradora fechou os olhos rezando.

Quanto tempo levaria para morrer? Certamente seria rápido. Katarina agradeceu mentalmente por isso.

Um.

Dois.

Três.

Quatro.

Cinco.

Seis.

Sete.

Abriu um pouco os olhos, apenas o suficiente para entender porque demorava tanto. Ela só queria paz e seu corpo estava derretendo de terror, mas ao invés do céu ou campos floridos do além-mundo encontrou olhos esmeralda a encarando.

Katarina conseguia sentir o hálito quente e úmido contra o seu rosto. Mas a fera não a havia dilacerado. O tigre a encarava, com seus olhos verdes brilhantes. Ela o encarou de volta, o coração batendo tão forte que ela tinha certeza que a fera podia ouvir também.

Então ela percebeu algo, o olho da fera que de alguma forma não parecia mais tão irracional. Seu coração falhou uma batida e ela sentiu vontade de tocá-lo. Não o fez por medo. Ao invés disso se arrastou lentamente para sair debaixo da besta.

O tigre não fez menção de impedi-la. Katarina se arrastou até conseguir se sentar, encarando a fera, tentando controlar a respiração, com medo que se fizesse algum movimento brusco ou se mexesse demais poderia traçar o seu destino bem ali.

Homens surgiram correndo pelos fundos das casas. Os militares com suas armaduras pesadas de ferro haviam finalmente alcançado, eles dispararam os centenas de homens pelo gramado, mas não conseguiram avançar mais do que alguns metros. As rachaduras haviam se juntado formando fendas profundas na terra, impedindo-os de avançarem mais.

Ela os observou sacarem as armas, prepararem os arcos e lanças. A fera a encarou mais uma vez e naquela breve troca de olhares viu sentimento e algo mais. Katarina podia jurar que a fera assentiu com a cabeça, como se estivesse se despedindo, teve a impressão de ver lágrimas em seus olhos, mas antes que pudesse ter certeza a besta se virou.

Contornou o caminho e correu pelo gramado saltando pela fenda em direção aos soldados derrubando e desarmando vários deles com o peso do corpo.

Katarina se levantou sobre os pés mancos e correu desaparecendo entre as árvores da floresta.

O mundo havia se transformado em uma confusão de folhas e galhos enquanto a dobradora corria sem rumo pela floresta. Sua cabeça estava uma confusão, o corpo todo doía mas ela continuava. Sabia que eles viriam cedo ou tarde e precisava da maior distância possível. Às vezes a dor fazia parecer que corria por horas, outras vezes sua mente escutava barulhos e ela sabia que não se passavam de alguns minutos. Não tinha certeza de quanto tempo estava ali.

Flashs se misturavam em sua mente. Estava de dia e outras vezes de noite. Podia jurar que sentia cheiro de fumaça. As imagens se misturavam, ela estava correndo, mas as árvores pareciam ligeiramente menores. Lembrava de estar usando um vestido diferente. Lembrava de gritos de socorro, lembrava de flashs do sangue escorrendo em mármore branco.

Lembrava dos olhos verdes e apenas deles.

Katarina sentiu que havia liberado sua magia ou que quer que fosse, e agora ela escorria por ela, impossível de ser retida. Sua mente estava uma bagunça incapaz de conter sua força, se antes a magia estava sufocando-a agora era arrastada por ela em uma avalanche.

O desespero preenchia seu coração, seus pés atravessavam caminhos entre realidade e ilusão, e quando olhava para si mesma, para seu corpo tudo o que via era uma mistura. Água, terra, fogo, gelo, eletricidade, ar. Ela queria que tudo aquilo sumisse. Era uma maldição.

Desconcertada e insana continuou a correr pela floresta, sem rumo, com o coração palpitando na garganta até que tropeçou em algo e o mundo ficou escuro.

⚔♥⚔

Por um tempo Katarina esteve em paz. Ela sentia o corpo flutuando na imensidão escura do cansaço. Sentia os membros afundando na escuridão como se estivessem atados a pedras, sentia o calor aconchegante do silêncio abraçando.

Um crepitar de fogueira.

Os olhos se abriram, ainda embaçados. Então se fecharam, de volta ao nada. Mais uma vez, eles tentaram de novo. Piscando, dessa vez. Pode ver o contorno de uma chama, a copa de uma árvore, ainda distante.

E antes que se acostumassem completamente a luminosidade e escutou um farfalhar de folhos próximo.

−Não achei que fosse acordar nunca. Vamos, está me atrasando.

E por mais desconexo que seus pensamentos estivessem, reconheceria aquela voz em qualquer lugar.

***Recadinho da autora***

Ho- Ho-Ho feliz natal pra vocês! Cheguei com capítulo novo! Fim de mês e estamos aqui cumprindo a meta pela segunda vez (crys in orgulho language). Talvez vocês não tenham sido bons meninos, mas tem presente de natal mesmo assim.

Sei que vocês estão acostumadas com meus capítulos calhamaços de zilhões de páginas mas esse foi bem pequeno comparado ao padrão. Não tenho muito o que dizer sobre, realmente era o que estava programado.

A vida é sim, feita de capítulos mais longos e mais curtos.

Aliás se você chegou até aqui leu mais 100 páginas A4 de CV. Isso é coisa pra caramba! Obrigada por acompanharem tudo até aqui e por me seguirem nas redes sociais @mahescreve e @__mahrodrigues (meu insta de autora e pessoal no insta). Seu apoio com estrelas e comentários me ajudam demais. É meu combustível pra escrita. 

Aliás só pra constar, vocês sabem como funciona certo? Quanto mais comentários e interações melhor. É combustível, funciona assim mesmo. Eu até trabalho mais rápido. 

Só para constar creio que agora chegamos no meio da história, ou o começo do meio, por assim dizer. Preparados? 

Agora me digam, o que vocês acharam? Quais são as expectativas e teorias loucas?

Música da semana: Queen of disaster - Só porque eu acho que tá muito a vibe da Kat nesse capítulo em específico.

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Beijos Malignos,

__TheEvilQueen

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