Capítulo 1

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"Considerai os lírios, como eles crescem; não trabalham, nem fiam; e digo-vos que nem ainda Salomão, em toda a sua glória, se vestiu como um deles.
E, se Deus assim veste a erva que hoje está no campo e amanhã é lançada no forno, quanto mais a vós, homens de pouca fé?"  (Lucas 12:27-28)

 E, se Deus assim veste a erva que hoje está no campo e amanhã é lançada no forno, quanto mais a vós, homens de pouca fé?"  (Lucas 12:27-28)

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A pequena flor rosa voava livre conforme o vento a guiava. Para cima, para baixo, para todos os lados ela rodopiava. Flutuando muito acima do mar, vinda sabe Deus de onde, ela tinha pontas arredondadas e um aspecto gentil. Quieta, pousou devagar atrás de uma moça sentada no topo do penhasco, de frente para o mar. Assentou-se atrás dela, agarrando-se em seu vestido azul, de forma que não pôde ser vista. A flor parecia ter chegado de uma longa viagem e ali encontrara, finalmente, um local seguro para pousar.

A moça ergueu o rosto, deixando-se sentir o calor do sol. Os cabelos castanhos foram agitados por uma leve brisa que vinha direto do mar. Dali de cima, do penhasco, dava para ver uma imensidão de água salgada, azul, que encostava no azul do céu lá longe. Ela estava sentada sobre a grama alta, que lhe cobria até perto da cintura, e respirava com prazer o cheiro do sal, da grama e do que o vento trazia de algum lugar da ilha.

A Ilha de Malta era pouco ensolarada naquela época do ano. Já era quase chegado o fim do ano de 1914 e ali, naquele lugar, as coisas pareciam mais simples. O ponto de fuga favorito dela era aquele penhasco: ali não havia nada além da grama alta e do silêncio... silêncio... cortado apenas pelo barulho baixo das folhas que roçavam umas nas outras, além das ondas se quebrando lá embaixo na praia.

Silêncio e paz eram raros naqueles dias... a Grande Guerra trouxera alarde para toda a Europa. Em 28 de julho, alguns meses antes, a Alemanha havia invadido a Sérvia, dando início ao que entraria para a história com o nome de Primeira Guerra Mundial. Tudo que se ouvia falar era sobre tristeza e caos, mas não ali.

— Pai, acho que vou voltar — ela fechou os olhos.

Ela havia chegado ali, na ilha, um ano antes. Em 1913, o pai dela havia recebido uma diretiva de Deus. Deveriam deixar a Inglaterra, onde moravam, e se mudar para a Ilha de Malta. Ali, a esposa dele reabriu a floricultura que tinha na Inglaterra, a English Rose. O pai, contudo, se ateve ao sacerdócio — como era antes.

Ela era Anastasia Livingstone, com vinte e um anos naquele dia. Trabalhava na floricultura da família, eis que havia terminado a escola na Inglaterra, alguns anos antes. Ela usava um vestido azul claro e rodado, da cor do céu, com mangas que iam até um pouco além dos cotovelos e com comprimento um pouco acima do tornozelo. Os sapatinhos brancos, da cor das nuvens, fizeram base para que ela se levantasse.

— Sabe, Pai, quase esqueço: continua um pouco esquisito — ela falou enquanto dava as costas para o mar e ia na direção da bicicleta branca que deixara jogada um pouco mais atrás. — Linda não está muito melhor.

Ela se referia a Linda, sua irmã mais nova. Não, não havia nada errado com ela... mas era uma adolescente. Aos catorze anos, achava que sabia mais do que todos. Dispendia pouquíssima atenção à escola e estava sempre em silêncio ou envolvida em suas próprias leituras ou desenhos. Na verdade, só falava com seus amigos — que a família sequer conhecia.

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