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O ar que batia em nosso rosto era gelado. Jughead gostava disso.

04:00 da manhã, Jughead e eu estávamos sentados esperando para ver o nascer do sol, como passamos a fazer quase todo dia.
Ele em sua cadeira de rodas e Brownie em seu colo.

Brownie andava estranho ultimamente. Triste. Não tinha mais a mesma animação de sempre. Estava quase sempre choramingando e não queria mais desgrudar de Jughead.
Algo nisso me preocupava muito.

Jughead tinha cada vez mais dificuldade para respirar e fazer qualquer outra coisa que não fosse dormir. A cada dia que ele abria os olhos eu agradecia mais.
Poupavamos palavras. Ele se cansava fácil, e demorava para recuperar o fôlego quando o perdia. Eu tinha medo.

Ele me olhou triste.

— Você... Pode me ajudar? — Perguntou — Eu preciso ver meu pai... — Algo em seu olhar me doía — Antes que...

— Ei! — Exclamei, antes que ele terminasse a frase. — Já falamos sobre isso! — Peguei sua mão — E é claro que eu vou até lá com você.

Jughead sorriu sem mostrar os dentes.

[...]

Quando o nascer do sol passou, voltamos para o carro, e fomos até um cemitério do outro lado de Riverdale, onde estava o pai de Jughead.
Eu o ajudei a desembarcar. Brownie ficou no carro.
Andamos entre os túmulos.
Tantas pessoas. Tantas histórias.
Eu sabia o que ele pensava. Eu também pensava. Em breve ele seria um deles, em breve ele partiria de mim. A tristeza me consumia.

— Ali — Ele apontou para um túmulo acinzentado a nossa esquerda. Estava quase completamente coberto por papéis, envelopes, cartas, é sério, tinham muitas delas. Algumas despedaçadas, velhas, molhadas, vítimas das chuvas... Enfim eu entendi. As cartas que Jughead escrevia eram para seu pai. Haviam diferentes datas em cada uma delas. Algumas de anos atrás, mas todas tinham a mesma coisa escrita na frente: Para FP Jones.

Posicionei a cadeira de rodas de frente para a lápide, e sai de perto. Ele precisava ficar um pouco sozinho.

De longe, eu o ouvia. Não entendia o que ele dizia. Mas eu ouvia sua voz. Era trêmula e falhava as vezes. Era algo muito difícil para ele, eu sentia. Meu coração se partia. Era uma despedida.
Jughead já passou por tanto... Não é o suficiente? Ele não merecia nada do estava acontecendo.
Meus olhos se encheram de lágrimas, tive que fazer um grande esforço para não começar a chorar.
Tudo em mim doía e gritava por ajuda, por raiva, por justiça, por tristeza... Eu não sei.

Depois de algum tempo eu voltei para junto dele. Estava com as mãos trêmulas no rosto. Haviam lágrimas em seus olhos. Ele os fechava com força.
Não consegui falar nada, apenas observei, depois o abracei e fiz carinho no seu cabelo.

— Ele gostava de ser lembrado — Jughead disse. — Ele gostava quando lembravam dele, de qualquer forma, em qualquer assunto, ele se sentia especial. — Respirou fundo, e me olhou — Eu faço questão de lembrar dele todo dia. Escrevia cartas, mas agora eu só... Lembro.

— Tenho certeza que ele gosta de ser uma lembrança sua. — Falei, meio sem jeito. Eu não sabia o que dizer.

— Eu quero ver ele lá... — Começou — sabe, lá onde as pessoas vão quando... — Ele não completou. Eu sabia o que queria dizeres — Mas e se ele não estiver lá? Eu não vou ver mais ele, e nem nada relacionado a ele. E se eu esquecer? E se eu não ver você de lá? — Lágrimas desciam pelo seu rosto. — Sinto muito por ter que te deixar...

Minha garganta doía, assim como meu corpo inteiro. Havia um certo desespero em seus olhos.
Ele se preparava para ir, eu me preparava para deixá-lo ir. É claro que era impossível.

O amor me encontrou, depois de tanto tempo, incontáveis dias pretos e brancos, dias normais, tristes. O amor me encontrou agora, não faz muito tempo, e tornou minha vida um sonho que eu não sabia que tinha, mas queria de todo o coração.
O amor me encontrou agora, por que precisava ir?
O amor me encontrou e me fez viver.
Depois de sua partida, virará tudo incerteza: Minha vida, o mundo, eu...
Como imaginar uma partida? Como me preparar para algo que eu não conseguia nem sequer imaginar?

Não sabia o que dizer. Também não queria que ele me deixasse, porque parte de mim iria junto. E no fundo ele sempre soube disso, sempre quis me proteger de algo que precisava acontecer.

Eu chorei também. Sentei no seu colo e apoiei minha cabeça em seu ombro.

Comecei a pensar em milhares de motivos pelos quais eu sentiria sua falta.
Número um: seu cheiro.

Ele passou seus braços carinhosamente ao redor de mim.

— Promete que vai seguir em frente — Segurou meu rosto, com dificuldade, e me encarou — Parece algo idiota, eu sei, mas preciso que faça isso por mim.

— Jughead... Eu...

— Você foi capaz de me amar como ninguém foi. Eu sou tão grato a isso... — Mais uma lágrima... — Eu preciso que saiba que eu amo você infinitamente. "Alguns infinitos são maiores que outros", você me ensinou isso, e pode ter certeza que o meu amor ficará aqui, mesmo depois que eu partir, ele continuará pairando por aí, atrás de você... porque você fez de nós um infinito incrível, e mesmo quando ele se tornar uma lembrança, nunca deixará de ser infinito. Eu amo você infinitamente, e é por isso que preciso que continue... Por você, por mim, por nós.

Ele sabia como seria difícil. Ele sabia sim. Sabia tanto quanto eu. Sabia que quando a morte o arrancasse de mim, nada mais faria sentido. Ele sabia porque ele sempre sabia.

Levar a lembrança de quem ele foi era o que restava, era o que eu podia fazer por ele.

— Eu prometo, Jughead, eu prometo...

❥ Living for you ⭞ᴮᵘᵍʰᵉᵃᵈWhere stories live. Discover now