Capítulo 8 - Planos e Refúgio

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8. Planos e Refúgio

- Está tão escuro e frio aqui... Você pode me ajudar? Eu estou com medo... Por favor...  Tire-me daqui. Por favor...

Suor gelado molhava o pijama de Bruno quando ele acordou; vasculhou todo o quarto com seus olhos rápidos em busca da dona da voz que ouviu, mas, como ficou claro, apenas ele estava ali. Aquela voz estava tão carregada de tristeza que, mesmo sendo um sonho, sentia-se na necessidade de fazer alguma coisa, queria poder ajudá-la. Mas, infelizmente, não possuía controle sobre os sonhos para fazer alguma coisa.

Desceu as escadas depois de escovar os dentes, seu abdômen parecia reclamar menos do que na noite anterior, porém ainda se sentia mais fraco do que antes do acidente, precisando utilizar toda energia que possuía para ir do seu quarto até a cozinha. Só depois que se sentou à mesa é que notou os olhares que recebia dos pais.

- Filho... – Começou seu pai, sua voz em um tom perigosamente tranquilo. Como se para fazer uma pausa dramática, sorveu um longo gole da grande xícara de café que tinha às mãos. – Nós precisamos conversar.

Sua mãe acenou com a cabeça, enquanto começava a preparar seu café da manhã, servindo-o um copo de suco de laranja enquanto passava geleia em uma fatia de pão. Tomou um pequeno gole do suco enquanto aguardava que seus pais começassem o sermão, ou o que quer que eles tivessem em mente.  Seu pai continuou:

- Nós queremos que você saiba que estaremos aqui por você, assim como estivemos antes. – Continuou Leandro Laux - Sabe, desde que você era mais novo, desconfiávamos que você fosse diferente dos outros garotos, e estávamos tranquilos com isso. Em nenhum momento pensamos que você pudesse temer nossa reação. Nós não somos esse tipo de pais. Você é nosso filho e, independente de quem você goste, vai continuar sendo amado e cuidado.

- É por isso que vamos ter que estabelecer algumas regras mais claras a partir da sua, bem... revelação. – Comentou sua mãe – Pra começar, precisamos conhecer mais do seu namorado, por isso quero que você o convide para um jantar amanhã à noite.

Não podia acreditar no que ouvia. Saber que seus pais não o achavam uma abominação, um erro, ou algo grotesco, fez com que todo o medo que carregava em seu peito – e que fora parcialmente dissolvido por sua mãe na noite anterior – escorresse para fora em forma de lágrimas. Chorava com um sorriso no rosto, enquanto saltava de sua cadeira para abraçar os pais.

Vivera durante tanto tempo longe do amor, isolado no medo e na insegurança, que ver a reação dos seus pais à sua “saída do armário” era o melhor presente que poderia receber. E não era como se eles quisessem manter distância da sua vida amorosa, pelo contrário, eles queriam conhecer mais do seu namorado... Talvez, dessa maneira ele pudesse conhecer mais do lobisomem mal-humorado por quem se apaixonara. Esperava que aquele jantar fosse divertido e leve, e não terminasse em nenhuma tragédia, esperava também que Gustavo soubesse ser educado e polido. Seus pais precisavam gostar do seu namorado, fosse ele fictício ou não. Aquele jantar com toda certeza seria divertido...

O quarto do hotel onde Stella morava parecia mais bagunçado do que da última vez que Bruno esteve ali, a cama totalmente desarrumada e roupas brotando do armário – ou espalhadas pelo chão e pelos móveis. A mistura dos cheiros de chá e incenso infestavam o local, sendo agradável e enjoativa ao mesmo tempo. Desconfiava que, se o faro das feiticeiras fosse tão poderoso como o dos lobisomens, elas começariam a maneirar nos incensos.

- Tudo o que aquela velha me disse foi o nome da caçadora – esbravejou a loira, já completamente nua, enquanto bebericava o chá preto. – Eu gastei três dias da minha vida indo atrás dela para descobrir o nome daquela vaca.

- Vivian Delano... – Murmurou Gustavo, forçando sua memória em busca de alguma lembrança, alguma menção ao sobrenome dela, mas tudo que encontrou foi o vazio frustrante. Nunca tinha ouvido esse nome antes. – Talvez, agora que temos o nome, você consiga fazer um feitiço e a rastrear.

- Você está achando que isso aqui é o que? Disque-feitiços? Pensa que faço feitiços para as pessoas igual a Úrsula da Pequena Sereia? Estou exausta! Se não fosse pela ajuda de uma fada com seu bendito portal, ainda estaria na estrada enquanto você ficava por aí beijando garotos.

A onda de fúria e vergonha atingiram o corpo do lobo com voracidade, os dois sentimentos com a mesma intensidade. Sabia que seus olhos estavam escurecendo ainda mais, negros como uma noite sem estrelas, brilhando apenas com a fúria assassina que possuía. Teve que respirar fundo algumas vezes até conseguir controlar a transformação que ameaçava surgir.

- Minha vida pessoal diz respeito apenas a mim – Vociferou entredentes, ainda se esforçando para relaxar.

- Ora, pare de drama, não é como se eu fosse te julgar ou coisa do tipo. Ainda continuamos sendo uma família, uma família muito estranha, mas ainda assim, estou aqui por você. – Tagarelou a feiticeira, ainda com a postura relaxada e tranquila de antes, apesar do sorriso malicioso que tinha nos lábios. – E aí, como foi?

- Como você soube?

- Minha intuição. Além da sua aura estar totalmente carregada de desejo sexual e romance...

- Como soube que era um garoto? – interrompeu o lobisomem.

- Não deixe a lenda urbana de que loiras são burras te enganar. Eu teria que ser cega e completamente retardada para não saber que você gosta de rapazes. Por que você acha que fico tão confortável ao ficar nua perto de você? Não é porque somos família.

- Eu... Eu...

- Ah, pare com isso, ninguém gosta de drama ou de desculpinhas. É como você é. Fim. Agora, por favor, podemos ir para a parte interessante onde você me conta todos os detalhes sórdidos?

E foi o que ele fez. Talvez porque ainda estava surpreso pela revelação da feiticeira, ou pela maneira como ela escolheu suas palavras. Tudo que sabia é que estava desesperado para poder desabafar com alguém, contar sobre aquele sentimento que, mesmo contra sua vontade, crescia dentro dele. Queria saber a opinião dela, queria os conselhos dela. Nunca fora minimamente bom quando o assunto era amor, todas as vezes em que se envolvera com alguém fora para aliviar os desejos – e necessidades – sexuais que possuía. E tudo acabava ali. Mas Stella sabia como envolver alguém, como se relacionar. Sua lista de namorados e amantes era extensa e ela com toda certeza saberia dizer como ele deveria agir.

- Sabe, eu sempre achei o Bruno bonitinho, vocês formam um casal bonito. – Comentou a feiticeira enquanto se servia de outra xícara de chá, seus olhos brilhando com ternura.

- Mas não somos um casal, ele só fez isso para que eu não fosse preso. – Lamentou o licantrope, a tristeza que sentia marcando cada palavra. - Ele já deixou claro que, para ajudar os outros, é capaz de tudo. Ele chegou a levar um tiro para nos salvar da Víbora ruiva!

- Que seja! Isso não significa que você não possa se aproveitar da situação e tentar conquistá-lo.

- Eu nem sei se isso é possível...

- Não sei se chegaram a te explicar, mas uma ereção normalmente indica desejo e, pelo que me contou, você conseguiu sentir que o garoto estava animado. Isso quer dizer que existe uma chance, mesmo que mínima.

- De qualquer forma...

- Ah, cale sua boca e me ouça. Se você acha que vale à pena, vai ter que lutar para conseguir. Tudo na vida vem através do esforço e sacrifício, o amor não é diferente. Se não quiser conquistar o garoto, continue fingindo que é namorado dele apenas por uns dois meses e depois você pode fingir que isso nunca aconteceu. Mas, se quiser ter alguma coisa com ele, e finalmente deixar de ser um lobisomem mal humorado e encalhado, vai ter que me obedecer.

E, pela segunda vez naquela manhã, obedeceu a feiticeira sem protestar.

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