Capítulo 1

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Estava difícil me manter em foco na leitura desta vez. Meu nervosismo parecia me consumir aos poucos. Aquela sensação estranha na boca do estômago e a ansiedade que pulsava no ritmo do meu batimento cardíaco estavam me enlouquecendo. Até meu gato estava mais concentrado no meu livro do que eu.
Fechei as páginas e encarei a capa preta daquela edição especial. Eu não sabia mais o que estava acontecendo naquela história desde que começara a ler. Deixei-me cair de costas sobre o colchão fofo e meu gato me olhou com a sua peculiar carinha peluda de tédio sem sair do seu lugar.
"O Noah já deve estar por perto." Pensei enquanto encarava o relógio. 08:30am.
Há dois anos atrás eu estava me despedindo dele e agora estou prestes a recebê-lo em minha casa. Apesar desse tempo distante, nada mudou entre nós. Ele me ligava quase todos os dias e passávamos horas conversando sobre as novidades. Na verdade era muito raro termos alguma novidade mas sempre conversávamos muito sobre assuntos aleatórias. Era como se nunca tivéssemos saído do ensino médio apesar desses dois anos sem ver um ao outro pessoalmente. Me surpreendi pensando se ele estava muito diferente de antes.
Fui arrancada dos meus devaneios pelo som da campainha. Saí do meu quarto e desci as escadas até a sala de estar olhando se tudo estava mesmo nos conformes. Dei uma última olhada na minha aparência através da parede espelhada que havia na sala. Meu cabelo longo estava um pouco desalinhado mas ainda assim bonito. A campainha tocou outra vez e eu corri até a porta antes de ceder a vontade de trocar de roupa. Eu estava bonita, mas não tenho certeza se uma calça de moletom e uma camiseta masculina era uma boa escolha para receber alguém que eu não via há dois anos.
Respirei fundo e girei a massaneta. Dei de cara com algumas malas escuras antes de erguer o olhar. Ele havia mudado muito de fato. Já não era mais aquele garoto franzino que sentava ao meu lado no colégio. Ele agora era um homem alto, de ombros largos com um corpo proporcionalmente forte. Era o mesmo das fotos mas pessoalmente me surpreendeu. Ele abriu um sorriso caloroso e eu pude notar que apesar das mudanças ele continuava o mesmo. O olhar era o mesmo e meu nervosismo se desfez em mil pedaços... Era ele.
Abracei aquela parede de músculos na minha frente e quase me emocionei. Estive esperando por aquele abraço por tanto tempo e acho que ele também porque até me ergueu do chão.
_ Eu não acredito que não te visitei antes. _ Falou com uma voz grave que me consolou por telefone durante esses últimos dois anos.
_ Entra logo. Vou te ajudar com as malas.
_ Apressadinha como sempre. _ sorriu enquanto eu arrastava duas malas sem quase poder com elas.
_ Vamos logo. Eu vou levar você até o quarto, fica lá em cima.
_ Você acha que eu sou o quê? Não vai nem me oferecer um copo de água antes? _ Não consegui conter o riso diante daquele comentário.
_ E você engrassadinho como sempre. Não mudou nada.

...

Subimos as escadas um pouco nostálgicos. Apresentei o andar superior que era composto por dois quartos grandes com banheiro e closet. O dele estava vazio, mas logo logo estaria decorado conforme seu gosto. Deixamos as malas dentro do quarto e saímos. Desci com ele até a sala novamente e apresentei o espaço. A sala de estar era espaçosa com uma mesa de jantar tradicional. Logo após a cozinha moderna chamava a atenção. Era de fato uma casa bem decorada e aconchegante, toda trabalhada em tons de cinza e preto com exceção dos banheiros cujas as paredes cobertas por asulejos brancos traziam um ar de limpeza.
_ Tem um banheiro logo ali também. Esse é para as pessoas no geral. _ Apontei para um pequeno cômodo ao lado da sala de estar.
_ E aquele cômodo? _ Perguntou apontando para a porta em frente ao banheiro.
_ Ali é um quartinho para guardar a "bagunça". Eu decidi montar um escritório. Tem mais ou menos as dimensões do banheiro. Não é tão grande quanto os quartos. Tem muito livros lá e você pode ir lá sempre que quiser._ Expliquei. _ Venha. Vamos comer alguma coisa.
Coloquei algumas coisas sobre a mesa. Ainda era cedo para o almoço então pensei que seria melhor comer algo leve. Eu ainda não havia tomado café da manhã e acho que ele também não porque ele estava faminto. Enquanto ele montava o próprio sanduíche eu me perguntei se ele achava que eu havia mudado muito nesses últimos anos da mesma forma como eu achei que ele havia mudado.
_ Como foi a viagem?
_ Foi bem tranquila. Eu dormi durante todo o percurso... Eu senti sua falta. _ Revelou me pegando de surpresa.
_ Eu senti sua falta também... Dois anos. Isso é muito tempo. Principalmente para nós que nos víamos todos os dias no colégio e até durante as férias dávamos um jeito de nos encontrar.
_ É sim. Você se lembra daquela viagem escolar que fizemos com a nossa turma do último ano? Nunca ou esquecer que você vomitou na sala dos cadáveres. _ Ele riu e eu também.
_ Claro que sim. Biologia nunca foi o meu ponto forte, mas pelo menos eu te livrei daquela aula.
_ É verdade. Aquele professor conseguia fazer até uma aula interessante ser chata.
_ Você tem mantido contado com alguém daquela época?
_ Para falar a verdade não. Só com o jonh e a Anne, mas raramente conversamos. Eu estive muito ocupado desde que terminamos o colegial e sei que você também. _ Confirmei com um aceno de cabeça. _ Mas você está ótima. Essa casa é incrível e você trabalha como jornalista em um dos jornais mais conhecidos dessa cidade. Parabéns.
_ É verdade. Foi um longo caminho até chegar aqui. Mas afinal... Você foi transferido ou se demitiu? Eu não entendi muito bem na última ligação.
_ Eu fui transferido para cá. Mas eu pedi por isso. Já estava na hora de sair da casa dos meus pais, você sabe. Achei que mudar de cidade seria uma ótima forma de começar. _ Explicou bebendo um pouco de suco._ Caroline... Quero dizer que precisamos acertar todas as despesas que terei por aqui. E se for muito incômodo para você morarmos juntos é só falar. Eu irei embora assim que puder.
_ Noah... Para. Você sabe que nunca será um incômodo para mim, muito pelo contrário. Sinta como se a casa fosse sua também. Quanto as despesas não se preocupe com elas até este mês acabar. Agora termine logo de comer e suba. Eu vou pegar o cobertor que eu separei para você.
_ A propósito, essa casa é a sua cara._ disse antes que eu me levantasse.
_ É claro. Eu que escolhi a decoração._ Ri e caminhei em direção aos quartos.

...

Enquanto eu pegava alguns lençóis fiquei pensando sobre esse Reencontro. Nossa amizade não havia mudado em nada e eu estava feliz com isso. Meu gato ainda estava na minha cama, mas agora ele dormia encolhido como uma grande bola de pelos. Ouvi os passos do Noah na escada se aproximando e saí do meu quarto.
_ Aqui é o meu quarto. Se precisar de algo durante a noite pode me perguntar. Não tem problema. Você pode ficar com esses lençóis. Vem. _ Chamei entrando no quarto dele. _ Fique a vontade para fazer o que quiser com o quarto. Ele é todo seu agora. Precisa de ajuda para desfazer as malas?
_ Não, obrigada. Pode fazer o que você precisa fazer hoje. Não se preocupe comigo. E obrigada. _ Falou e me deu um beijo na testa como costumava fazer antigamente.
_ Está bem.
_ Eu já arrumei a bagunça do café da manhã._ Deu um sorriso travesso.
_ Obrigada. Fique a vontade. Mais tarde eu vou pedir o nosso almoço, mas pode mexer e usar o que quiser. _ Falei indo para o meu quarto.
Aquele era o meu dia de folga e nos meus dias de folga eu sempre dormia o dia inteiro. Ainda era cedo então me deitei na minha cama ao lado do meu gato e programei um despertador para o meio dia. Eu não pretendia dormir porque o Noah poderia precisar de mim, mas no final das contas o peso do sono foi maior do que eu e adormeci profundamente.

Just Friends... Or Not. Where stories live. Discover now