CAPÍTULO 04

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AMARE BETTENCOURT

Olho seriamente para aquele homem, que até então havia me ajudado com as caixas, mas estava sendo um ogro com a criança, implantando uma espécie de inimizade na cabeça dele que não acho certo.

- É o meu irmão, eu falo do jeito que eu quiser. - Rebateu, com um olhar frio.

- Não é assim que funciona. Se você tem seus problemas, não passe isso para seu irmão. Ele não precisa ser amargo com as pessoas como você. - Ele sorriu, sem humor, colocando o menino no chão.

- Kael, vai para casa. Eu te encontro no caminho. - Falou, e o menininho assentiu, acenando para mim e correndo atrás de outros coleguinhas.

Aquele homem me olhou de cima abaixo, se aproximando de mim, o que me assustou, recuando dois passos por puro reflexo, até sentir minhas costas baterem contra a parede e ele apoiar a mão na mesma, me deixando encurralado.

- Me diz uma coisa... que voz você tem para falar sobre um assunto que afeta a mim e ao meu povo? - Questionou, me fazendo suspirar.

- Nenhum, eu sei. E não estou tomando a frente de nada. É o meu dever como professor mostrar a igualdade entre as pessoas, sejam brancas ou negras, somos a mesma espécie. Há pessoas ruins de todas as cores. É errado fazer uma criança crescer com o pensamento de ódio ao olhar para o próximo. Você melhor do que ninguém deveria entender isso. - Me assusto quando ele agarra meu braço, me puxando com força e fazendo meu corpo bater contra o dele.

- Ah, é? Quer dizer que somos iguais? Em que mundo de fantasia você nasceu, pirralho?! Certamente em berço de ouro, tendo tudo nas mãos, e sendo aceito em qualquer entrevista de emprego que você vá. Se tiver um negro ao seu lado, humph, é vaga garantida! - Ditou, me fazendo suspirar.

- O que você prefere? Que eu desfira ódio contra você? Eu sei que nasci com privilégios, mas só por isso eu não preciso me tornar um babaca presunçoso. Gosto de ajudar as pessoas, e vê-las por igual. Sua cor não interfere em nada no que você é. O que interfere é seu caráter. Sei que é um assunto delicado e que não posso tratar com propriedade, mas faz parte da matriz curricular da minha disciplina. Igualdade. Só isso. - Falo, o vendo suspirar, me soltando bruscamente.

- Vaza daqui, pirralho! - Ordenou, irritado.

- Desculpa... - Balbucio, abaixando o olhar e saindo dali, não sabendo mais se seria uma boa ideia continuar as aulas. Eu sei que minha disciplina tratava de assuntos delicados, mas era a minha disciplina. O que eu poderia fazer?!

. . . .

- Amare! Você só pode ter enlouquecido! - Paula exclamou, batendo em meu ombro. Já estávamos em casa e Paula veio me ajudar a fazer alguns recortes de desenhos para as crianças. Então estávamos sentados em minha cama, rodeados de papel e cartolina.

- Por quê? - Questiono, confuso.

- Como "por quê"?! Nunca ouviu falar do dono do morro?! - Exclamou, e eu apenas dou de ombros.

- Já ouvi falar, mas não o conheço. - Falo, indiferente.

- Ah, não se preocupe, eu te digo quem é... O CARA QUE VOCÊ PEDIU AJUDA, SEU MALUCO! - Paula gritou, me assustando.

- Bem, sinal de que ele é gentil. Ou melhor, era. Porque depois se mostrou um idiota. - Resmungo, chateado. - Mas não guardo rancor. Ele teve suas razões e eu entendo. - Falo, ao pensar melhor na conversa que tive com ele.

- Mas que é gostoso, isso é... - Paula murmurou, o que me fez olhá-la. Ela sorria maliciosa para mim, o que me deixou confuso.

- Por que está me olhando como se eu tivesse feito alguma coisa errada? - Questiono e ela bufa, se jogando em minha cama e abraçando o Sr. Panda, meu urso que tem quase minha altura e dorme comigo todas as noites. Ele é muito fofo e felpudo. E sim, eu o tenho desde os meus 5 anos.

- Porque eu fiquei pensando... você é gay, mas nunca ficou com nenhum menino. Como sabe que é gay? - Questionou, confusa. Dou de ombros, sorrindo.

- Da mesma forma que você sabe que é hetero. E que eu saiba, você também nunca ficou com ninguém. - Rebato, vendo ela suspirar.

- E quem iria me querer? Cheia de espinha na cara, os óculos maior que minha testa e aparelho nos dentes. Eu sou o demônio em forma de pessoa. - Resmungou, o que me fez olhá-la.

- Beleza é só um ponto de vista. - Comento, e ela se levanta, ficando sentada na minha frente.

- Certo, olha para mim! Seja sincero e me diz o que eu tenho de atraente! - Pediu e eu suspirei, sorrindo.

- Você é uma das melhores alunas da universidade. Estuda diariamente e é muito esforçada para alcançar seus objetivos, além de que será uma das melhores engenheiras de robótica do mundo, porque você é muito inteligente, e não é à-toa que terminou o ensino médio com 15 anos, por já saber todos os conteúdos de letra. Você é uma mulher incrível e será uma profissional mais incrível ainda. - Falo, calmamente. - Quer mais? Posso passar a noite falando. - ela sorriu, pulando em meus braços e rindo, nos derrubando na cama.

- Se você fosse Hetero eu ia ouvir isso como um pedido de casamento. - Brincou, o que me fez gargalhar.

- Ainda bem que eu não sou. - Rebato, rindo. A olho, agora ficando mais sério. - Você vai encontrar alguém que perceba todos os seus pontos atraentes, Paulinha. Nós dois vamos. - Falo, vendo ela sorri, assentindo. E então olhou para o Sr. Panda.

- Enquanto isso o Sr. Panda nos faz companhia. - Brincou, o que me fez ri, concordando. Abraçamos o Sr. Panda, deitados na cama e ligando a televisão para maratonarmos uma série.

A Paula eu conheço desde que me entendo por gente, e sempre fortalecemos nossa amizade. Estávamos sempre juntos, no bullying e nas alegrias. É, a escola não foi fácil, mas se tornou suportável ao estarmos juntos.

Ela já é tão grudada comigo que tem até a cópia da chave da minha casa, e eu da dela. Se ela não dorme aqui, sou eu que durmo na casa dela. E assim seguimos a vida.

Como irmãos.

TENTACION - O dono do Morro (ROMANCE GAY) Onde as histórias ganham vida. Descobre agora