Inanição

8 1 2
                                    

O sono já acabou, faz tempo, muito tempo, mas eu continuo deitado, preguiçoso nas idéias, na rotina, na falta de algo a mais, na vida.
Poderia ler um pouco penso eu, mas pensar em ler já me cansa, e ler o quê, algo para abstração, algo para teorização, algo para pensar sobre tudo e achar mais problemas ou algo para esquecer de tudo e finjir que os problemas não estão aqui?
Poderia escutar um pouco de música penso eu, mas só de pensar em escutar já me cansa, e escutar o quê, algo para me flagelar, algo para me extasiar, algo para lembrar de tudo que já sofri ou algo para pensar nas coisas boas que se tornarão sofrimento um dia?
Poderia levantar e finjir que estou bem, tomar um café preto, forte, ir no banheiro fazer a higienização matinal, olhar essas olheiras cada vez mais fundas e reclamar em frente ao espelho, mas só de pensar cansa.
Poderia só ficar deitado também, é domingo, o sol lá fora chamando para vida, mas não eu, dia de ver os amigos, que não tenho, de encontrar meu amor, que já me deixou, dia que todos amam, eu sofro com dor.
Poderia gritar, alto, o mais alto possível, clamar por ajuda, surtar, me debater na cama até me machucar, sangrar, gargalhar como um louco histérico sem parar, mas ninguém ouviria, ninguém saberia, eu só me cansaria um pouco mais.
Poderia pegar o celular quem sabe e finjir como tantos outros fazem, focar no irreal, em risos sem risadas, beijos sem toques, conversas falsas e uma miríade de tantas outras solúveis comunicações, mas só de imaginar, me ânsia.
E acabo por me espreguiçar, tocar de leve no colchão e sentir o aperto da minha mão sobre ele, puxar o travesseiro para mais perto do rosto para esconder a chuva que derramo, e derramo, e derramo, e no final é mais um domingo feliz.

Dicotomia RomânticaNơi câu chuyện tồn tại. Hãy khám phá bây giờ