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Passava das 20h. A padaria ficava a uma quadra de distância. Só me dei conta que havia esquecido a máscara de proteção quando já estava atravessando a rua. Se eu voltasse para pegá-la, não daria tempo de comprar pão. Se eu fosse sem ela, poderia pegar coronga. Merda. Era o ônibus ou a goiaba.

Voltei correndo para pegar o elevador. Ao vê-lo chegar no térreo e a porta abrir, surge em minha frente uma figura atraente de jeans, sem camisa — com uma cara nada boa. Fiquei apreensiva por um instante. Era seguro entrar?

O fato do elevador ser consideravelmente apertado não me ajudava em nada. Tudo bem que esse condomínio é de pobre, mas não precisava ser tão sufocante. Apesar de ficar de costas para evitá-lo, os espelhos me encurralaram — em nenhum momento seu olhar desviou do meu. Tive vontade de perguntar o que diabos ele estava fazendo, mas eu temia que a resposta fizesse eu vacilar.

A tensão que pairou no ar aumentava gradualmente. Só respirei aliviada quando chegamos ao nosso andar. Fingi demência, seguindo em direção ao meu apartamento. Antes que eu alcançasse a fechadura, ele me puxou pelo braço. Olhando no fundo dos meus olhos, perguntou com a voz firme.

— Qual é o seu problema?

— Como?

— Não se faz de doida. Tu entendeu. Bora, responde.

— Então você tava me seguindo pra me azucrinar?

— Caralho Ana, PARA de fugir. Por que porra você saiu, assim, do nada?!

— Eu falei, não sou tão fácil. Desculpa se te frustrei, mas eu não sou do tipo de mulher que você traz pra casa todo dia. Ainda bem que eu parei antes de fazer algo do qual pudesse me arrepender. — Ele me fitou com atenção, sondando todas as minhas palavras. — Mas pode ficar tranquilo. Garanto que isso não vai se repetir.

— Então você viu que não ia resistir e fugiu de mim? Puta que pariu, hein.

— Eu não fugi de ninguém, tava indo comprar alguma coisa pra comer. Para de se achar e sai da minha frente! — Cruzei os braços. — Você nem é tão bom assim.

A indignação em seu rosto sumiu tão rápido quanto surgiu, dando lugar a um sorriso de escárnio. Com a postura felina e um brilho intrigante no olhar, ele se aproximou lentamente perguntando.

— Não sou? — A cada passo que Ricardo dava, eu recuava. — Me diz o que eu fiz de errado e eu prometo consertar. Agora mesmo.

Minhas costas encontraram uma parede. Encurralada. Outra vez.

— Foi isso? — Mordiscou meu pescoço, arrepiando minha pele. — Talvez isso? — Agarrou-me feroz, deslizando as mãos pelas minhas costas até parar na bunda, onde agarrou com força. — Ou isso? — Conduziu o beijo, enquanto uma de suas mãos puxava meu cabelo, a outra invadiu o short.

Dessa vez seu toque não era suave como antes. Era frenético. Excitada, gemi baixinho em seu ouvido.

Ao abrir os olhos, percebi que havia uma câmera de segurança ao nosso lado. Eu não ia nem continuar com isso, quanto mais dar show para os porteiros tarados.

Empurrei-o para longe e bati a porta, entrando em meu apartamento o mais rápido possível. Se eu continuasse ali, não quero nem imaginar o que poderia ter acontecido. Meu ponto fraco é sexo. E eu não quero ficar vulnerável. Não agora que estou carente, pelo menos. Ele pode até ser gente boa, mas sei muito bem o tipo de cara que é.

Quando cheguei à padaria, ela tinha acabado de ser fechada. Tive que me contentar com o que havia em casa. Só mais cinco minutos e eu jantaria. Chucky filho da puta!

***

Mesmo depois de lanchar os biscoitos com iogurte e queijo, eu ainda continuava com fome. Fiquei imaginando a probabilidade de misturar isso com feijão fervido dar errado. Um soro e remédios são do preço da feira que vou fazer amanhã. Delivery também seria, mas da última vez que pedi comida tive dor de barriga. Aí o gasto seria dobrado. Mas se a galera do Sul junta todas as sobras da geladeira numa única panela e come, por que comigo daria errado ?

Por sorte o celular apitou, retirando-me do transe e da possibilidade de adquirir uma infecção intestinal. Era Gabriela, me enviou um meme no direct. Essa era minha deixa para ligar e pedir ajuda.

Ligação on

Diz, nega. — Pude ouvir um liquidificador ligado. Ela é a tia dos sucos verdes.

Eu quase dei pro vizinho.

— Deveria estar surpresa?

— Vai se ferrar! Você sabe que eu não sou assim.

Você evitar sexo é como um peixe evitar água. Não sei nem como rejeitou Lucas por tanto tempo. Diz logo o que aconteceu, Ana.

— Então... Ele é gostoso e sabe mexer com o psicológico de qualquer uma. Mas pega tanto troço diferente todo dia, que eu tô com medo de ter pegado uma bicheira na aninha.

— Safada! Mas tipo, como assim pegar DST? Tu não acabou de dizer que não deu?

— Tive contato, mas corri antes do ato.

— Por quê?!

— Eu já falei, ele traz uma menina diferente toda noite. Eu não quero ser a hospedagem de quarentena dele.

— Mas você quer ele?

— Pelo amor, eu nem conheço ele direito, Gabriela!

— E daí?

— Você sabe, eu não beijo ninguém que eu não conheça e confie. Quanto mais fazer outras coisas! Eu já falei que não sou do tipo que vai direto pro final. Não gosto de ser usada.

E se você parar de bancar a santa e usar ele também?

Respirei fundo. A ideia já havia passado pela minha cabeça, mas eu não queria admitir nem aceitar.

— Teu problema é esse, Ana. Cê fica romantizando todo mundo que se relaciona contigo. Quando tu se apaixonava por um cara diferente a cada dia da semana e só amava até sexta não tinha medo nem ansiedade.

— Mas naquela época era diferente. Eu nunca pegava quem eu queria. Apesar de ficar louca por alguns, nenhum tava ao meu alcance. Era tudo platônico da minha parte. Agora ele tá ao meu alcance e eu não tô apaixonada. Isso me assusta!

— Então você tá admitindo que quer pegar ele e é recíproco?

— Não foi bem isso que eu quis dizer...

— E daí se for? Talvez seja uma coisa boa.

— Nunca veio um peixe desses na minha rede por vontade própria, eu sempre tive que correr atrás do pior que tinha. Aí agora do nada me vem um assim, de bandeja, querendo se enroscar nela? Eu não sou burra mas sou emocionada, Gabi. Isso vai dar merda.

Amor em QuarentenaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora