Capítulo 1: Tudo sempre pode piorar

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Emilly

Quando se para por um minuto e olha minuciosamente a vida uma pergunta paira no ar, será que em apenas um dia tudo pode dá errado? A partir dessa pergunta vão surgindo outras e mais outras, quando você percebi já está sendo sufocado por indagações.

Será que sua vida pode virar de cabeça para baixo em apenas vinte e quatro horas?

Será que tudo sempre pode piorar?

Será que a vida nesse planeta é apenas uma prova para nos testar para vivermos algo melhor?

E foi com essas indagações que o meu dia começou. Não, não foi bem assim, estaria mentindo se dissesse. Bom, meu dia começou como sempre começam os outros até então, com os gritos da minha mãe em meus ouvidos — sim, ela sempre grita comigo e sim, isso é um episódio bem comum.

Naquele momento pensei que não passasse de um sonho, um pesadelo bem ruim e frequente.  Comecei a me indagar se até nos sonhos não teria um pouco de descanso. Mas quando percebi que cada vez mais os gritos ficavam mais altos e quando me dei conta que estava com os olhos abertos, pude realmente chegar a triste e dolorosa conclusão que aquilo era bem real, mais real do que queria que fosse.

— Acorda, Emily, seu pai vai vim aqui hoje e preciso da casa arrumada. — ela simplesmente chega perto do meu ouvido e grita.

Obrigada mãe, meus tímpanos agradecem.

Reviro os olhos.

Precisava urgentemente começar a trancar a porta, já estava cansada daquela mesma cena monótona e repetitiva. Por alguma razão do destino que não saberei explicar, minha mãe só podia acreditar que era sua empregada. Tudo bem que não tinha e não iria fazer nada no final de semana, porém, isso não implica que eu seja uma pessoa atoa, só não tenho uma vida social ativa. A simplicidade me atraia e além disso gosto de improvisar.

Meus pais já estavam separados havia cinco anos, todo final de semana ele vinha nos visitar e fazíamos alguma coisa juntos. Apesar do término não ter sido um dos melhores eles mantinham uma boa convivência. Meu pai nunca iria deixar que nada atrapalhasse a família, para ele nós vínhamos em primeiro lugar na sua vida e durante esses cinco anos ele tem agido dessa forma.

Apesar de tudo dona Charlotte, vulgo minha mãe, ainda tinha esperança deles voltarem, como se isso fosse possível, eram cinco anos e não cinco dias.

— Anda, Emilly, não me escutou? — grita mais uma vez — Levanta, agora!

Pai, é pedi demais que minha mãe tenha uma gripe e perca a voz?

Não, acho que não é pedir demais.

Balanço a cabeça concordando com a minha conclusão. Ela me olha como se eu fosse um extraterrestre, é talvez alguns de nós sejamos.

Só porque estava com os olhos abertos não significa que estava totalmente acordada, ainda estava ''morrendo de sono'', tinha ido dormir às quatro da manhã. Sabia que uma sessão de filmes até tarde daria nisso, Sam me paga. Não sei porque ainda dou ouvidos ao meu irmão, claro que ele poderia dormir até mais tarde, o que estava pensando?

Charlotte vai até a janela e afasta a cortina deixando a claridade penetrar no quarto, atingindo em cheio meus olhos, fazendo com que por um impulso os feche com força em uma tentativa de os proteger.

Depois de alguns segundos torno a abrí-los lentamente até eles se acostumarem totalmente com a claridade. Jogo a coberta para o outro lado da cama, para tentar levantar, só tentar mesmo. Meu raciocínio estava muito lento, misericórdia! Tudo por causa de alguns filmes e um pouco de pipoca, juro que não vou fazer isso novamente.

Mentira, claro que vou quebrar essa promessa como sempre faço.

Pulo da cama devido ao susto que acabo de tomar, ela grita novamente comigo e me olha com a mesma cara, talvez daria tudo só pra saber o que estava pensando. Sorrio pra ela, um sorriso cheio de sacarmos.

— Para de ser sonsa, Emilly, levanta logo.

É, talvez só um pouquinho estava fazendo manha, enrolando só um pouquinho.

— Pare de ser um fardo, não me olhe assim, você faz de tudo para me atingir e me deixar estressada. Se soubesse que você seria assim não teria engravidado. — ela cospe as palavras na minha cara, claro que a mesma não perderia a oportunidade de falar que não passava de apenas uma consequência, um descuido da natureza.

— Não pedi para nascer. — grito.

Claro que ia responder na mesma altura, o que ela estava pensando? Não tinha pedido pra nascer nessa família e o fato dela ser minha mãe também não me agradava.

Pronto, agora eram duas pessoas zangadas tendo uma ''conversa'' nada amigável.

Começo a chorar, não era um choro de dor ou algo do tipo, era um choro de frustração, um choro repleto de sentimentos e palavras que não poderiam ser liberadas. Ela ainda era a minha mãe, eu querendo ou não e lhe devia  respeito.

— Mas nasceu e estragou toda minha vida, o homem que eu amo me largou por sua causa. — sai do quarto pisando firme, com certeza podia jurar que podia ver umas fumaças saindo de sua cabeça, como acontece nos filmes.

Pronto, a seção de massacre a Emilly o quanto quiser e depois vai embora acabou.

Sinceramente, não sei porque ela não gosta de mim, porque me trata dessa forma, nunca fiz nada. Tudo bem que o meu comportamento não é um dos melhores, mas isso não justifica como ela me trata.

— Não fica assim, Emi, ela provavelmente acordou de mal humor. — novamente tomo um susto com alguém entrando no quarto, por um momento acho que era ela, mas era apenas meu irmão.

Será que esse povo não sabe bater?

Sam, meu irmão, me abraça, um abraço bem forte. Claro que ele ia arrumar uma desculpa para o fato dela me maltratar, sempre tem uma justificativa seja ela cabível ou não.

Sam faz sinal pedindo espaço na cama, me arredo e ele deita do meu lado e me abraça mais forte. Ele pensa que dessa forma vai conseguir suprir um pouco a falta de carinho que não recebo da minha mãe.

Coloco minha cabeça em seu peito e escuto cada batida do seu coração, enquanto ele passa as mãos no meu cabelo fazendo um cafuné. Ele sempre está presente nos piores momentos da minha vida e está sempre tentando amenizá-lo.

— Ela não tinha o direito de descontar sua frustração em mim. — limpo os últimos resquícios de lágrimas do meu rosto, não vale a pena chorar por quem não é digno.

— Queria ficar mais um pouco, mas preciso sair.

— Tudo bem, vai lá. — ele me abraça mais uma vez.

— Me prometa que vai ficar bem.

— Prometo que vou tentar. — satisfeito com a minha resposta, ele sorrir e fecha a porta. — Amo quando você se preocupa comigo. — grito e consigo escutar sua risada.

Finalmente tomo coragem e saio da cama, preciso enfrentar o mundo, por mais que ficar naquela cama me atraísse muito, não podia permanecer ali. Tomo um longo banho, deixando que aquela água quente tocasse a minha pele fazendo com que me relaxasse completamente. O banho sempre tem esse poder sobre mim, é magnífico e mágico.

Desligo o chuveiro com uma certa relutância, enrolo na toalha, coloca uma roupa e estou pronta pra começar o dia.

Paro por alguns segundos em frente a porta do quarto e me indago se realmente sair é uma boa ideia, apesar de achar que não, saio.

Vamos enfrentar o mundo.

Reaprendendo a viverWhere stories live. Discover now