Demorei mais tempo para tentar entender o porquê de isso me irritar tanto, do que para compreender como esse tapa na cara havia me influenciado a agir como um babaca com ela na sala. Precisei falar em voz alta que ela era apenas uma menina porque, talvez assim, eu voltasse a entender que era isso que ela realmente era. Eu não tinha motivo algum para ficar irritado com o fato de um funcionário meu, que não deveria ter mais do que vinte e dois anos, estar olhando para ela como se ela fosse alguém que ele pudesse levar para sair, pelo amor de Deus!

Só de pensar nisso, já sentia a frustração me consumir e tirei Capitão da sua baia com um pouco mais de pressa. Era final de tarde, já havia cumprido com todas as minhas funções e liberado os meus funcionários, por isso, decidi que cavalgar com Capitão era a escolha perfeita para me desfazer de toda a tensão do dia. Ou era isso, ou algumas doses de uísque e não estava afim de extrapolar o meu limite. Já havia bebido com Caio mais cedo, não queria beber novamente.

Capitão parecia compreender o meu humor apenas com o olhar. Assim que o montei, ele começou a cavalgar forte e fomos em direção ao norte da fazenda, a parte mais afastada e aberta, onde poderíamos descontar tudo o que quiséssemos. Ele, a sua energia e eu, a minha irritação. O vento batia forte no meu rosto e o barulho dos cascos de Capitão contra a grama era como música para os meus ouvidos. Logo me senti desligar de qualquer pensamento ruim e só me restou algumas imagens na mente. A que ficou por mais tempo, foi Gabriela.

Primeiro me lembrei de seus olhos tão únicos e diferentes ao mesmo tempo. As írises castanha e azul se completavam e faziam um trabalho incrível em seu rosto delicado. Como se isso não fosse o bastante, a danada ainda tinha um corpo que, pela primeira vez, me deixei lembrar com detalhes. Não havia me permitido a olhar mais do que o necessário até o dia de hoje. Primeiro, quando ela veio correndo para me ver com Trovão e, segundo, quando a olhei de cima a baixo antes de falar que a via como uma menina.

Realmente, perto da minha idade, ela era apenas uma menina, mas seria hipócrita se dissesse que seu corpo era de uma adolescente, pois não era. Gabriela era linda, tinha os seios médios, que preenchiam bem a blusa, as pernas levemente torneadas, os quadris estreitos com uma bunda arrebitada. Eu ficava dividido entre me sentir mal por ter reparado nisso tudo e em fingir que eu não tinha notado nada. Como estava sozinho, no meio de cavalgada intensa com Capitão, resolvi me dar alguns minutinhos com aquela imagem na cabeça, antes de me obrigar a deletá-la da minha memória definitivamente.

Gabriela ficaria em minha casa por tempo indeterminado, era meu dever fazer com que ela se sentisse bem e confortável e não reparar em sua beleza ou em qualquer parte do seu corpo. Era errado, de inúmeras maneiras.

Só voltei com Capitão quando o céu estava totalmente escuro e nós dois estávamos esgotados. O deixei em sua baia e chequei se tinha água e ração suficiente, antes de entrar no casarão e ir direto para o meu quarto. Não encontrei com ninguém pelo caminho e só voltei a descer quando já estava no horário do jantar. Parte de mim tinha certeza de que Gabriela não jantaria comigo, mas foi com surpresa que a encontrei ajudando Cissa a colocar a mesa. Ela estava de costas para mim, rindo de algo que Cissa havia dito e quando se virou, estacou no lugar com um garfo e uma faca na mão. Por um momento, não consegui deixar de olhar de para ela, até a voz de Cissa me fazer sair do transe:

— Achei que ia ter que ir lá em cima arrastar você pra comer.

Gabriela se virou e colocou os talheres ao lado do meu prato, antes de se sentar em seu lugar.

— Sabe que não durmo antes de comer a sua comida, Cissa — falei, me sentando. — Cadê o seu prato? Não vai jantar com a gente?

Às vezes Cissa jantava conosco, outras, ela preferia se reunir na casa de Rosana e jantar com ela. Balançando a cabeça, ela sorriu.

À Sua Espera - DEGUSTAÇÃOWhere stories live. Discover now