Despedimo-nos de Caio e entramos no casarão. A luz da sala, como Cissa costumava fazer quando eu chegava tarde da noite, estava acesa e conduzi Gabriela em direção à escada. Ela observava tudo com atenção, notando o piso de madeira de lei, os móveis modernos que se misturavam com algumas das antiguidades da família. Aquela era apenas a sala de estar, ainda tinha a sala de televisão, sala de jantar, biblioteca, cozinha e a pequena sala de jogos que eu pediria para que Cissa lhe apresentasse no dia seguinte.

— O corredor que leva para o lado direito, fica o meu quarto. Para o lado esquerdo, ficam os quartos de hóspedes. Venha comigo.

Andamos lado a lado e parei em frente ao maior quarto de hóspedes da casa. Abri a porta e deixei que ela passasse primeiro, em seguida, entrei.

— Como está muito tarde, resolvi não incomodar Cissa para que arrumasse o quarto para você, mas não se preocupe. A roupa de cama foi trocada ainda essa semana e no closet tem toalhas limpas, mais travesseiros, se precisar, e edredons. Vou checar se está tudo em ordem no banheiro.

— Está bem.

Caminhei até o banheiro e encontrei dentro das gavetas sabonete, shampoo, condicionador, escova e pasta de dentes fechados e até mesmo sais de banhos para a banheira, caso ela fosse utilizar. Com tudo em ordem, voltei e a peguei observando o quarto. Não era do mesmo tamanho que o meu, mas era bem espaçoso, tinha uma área de estar com um sofá e duas poltronas, uma mesa de madeira com duas cadeiras próxima à sacada, além da área de dormir.

— Está tudo certo no banheiro, tem uma escova de dentes nova em cima da bancada da pia. Estarei em meu quarto, se precisar de qualquer coisa, não hesite em me chamar.

— Certo. — Ela murmurou e eu assenti, indo em direção a porta aberta do quarto. Antes que eu saísse, no entanto, a ouvi me chamar. — Hum... Senhor Baldez, espere um segundo, por favor. — Virei-me para ela e a encontrei no mesmo lugar, com as mãos enfiadas no bolso da calça jeans que, mesmo sem querer, observei que moldava as suas pernas. — Obrigada por me acolher na sua casa. Sei que não tinha obrigação alguma e, mesmo assim, está fazendo isso por mim. É muita gentileza da sua parte.

— Não precisa agradecer.

— Também gostaria de pedir desculpas. — Ela se adiantou antes que eu pudesse sair do quarto. — Foi errado da minha parte insinuar que o senhor poderia ser um homem ruim. Eu estava muito nervosa com tudo o que aconteceu e fui pega de surpresa... Sinto muito.

— Acho que, na verdade, foi prudente da sua parte questionar a minha índole, Gabriela. Você não me conhece, não tinha motivo algum para confiar em mim. Eu que não deveria ter levado para o lado pessoal. Se acomode e tente descansar, amanhã de tarde eu a levarei ao hospital.

— Obrigada.

A encarei uma última vez, fitando bem aqueles olhos diferentes e marcantes, antes de sair do quarto e fechar a porta.

*

Gabriela

Não consegui dormir.

Fiquei rolando de um lado para o outro naquela cama enorme e desconhecida, sentindo o cheiro fresco do sabonete em minha pele e do amaciante na roupa de cama, enquanto observava a brisa que entrava pelas janelas balançar a cortina. Em minha cabeça, um milhão de pensamentos corriam de um lado para o outro, enquanto via as últimas semanas da minha vida passarem na frente dos meus olhos.

Sempre amei a fazenda. Uma das primeiras lembranças que tinha da minha infância, era de mim e minha mãe no lombo de Lua, sua égua favorita, percorrendo a fazenda com o sol se pondo. Eu amava aqueles momentos ao lado dela, ouvindo sua voz melodiosa, sentindo o cheio de terra, observando o farfalhar das árvores. Depois da sua morte, a fazenda perdeu um pouco o seu brilho, principalmente pelo fato de meu pai ter me proibido de andar a cavalo. Fui sendo cada vez mais afastada do convívio com os animais, restringida por onde poderia andar em minhas próprias terras, até meu pai tomar a fatídica decisão de que eu me mudaria para São Paulo com Dora, minha babá.

À Sua Espera - DEGUSTAÇÃOWhere stories live. Discover now