Pamela (ou a busca por aquilo que é incrível)

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Pamela se encontrou consigo mesma no dia 27 de abril de 2017, era uma tarde de terça feira e nada parecia diferente naquele dia para todas as pessoas. Quando somos crianças muitas vezes quando estamos indo para o nosso parque favorito e olhamos para as pessoas no caminho pensando: "Essas pessoas estão aí levando a vida delas como se nada de mais estivesse acontecendo e eu estou aqui tendo o melhor dia possível". Essa era a sensação que Pamela teve ao sair do torneio mundial da FLL , um torneio de robótica com crianças que envolvia o desenvolvimento de um complexo robô, a pesquisa de uma solução para um tema da atualidade (naquele ano o tema era empreendedorismo) e a demonstração de fortes valores humanos; neste contexto Pamela fazia parte da equipe Born to be Wild uma equipe com crianças de 12 a 16 anos, era o último ano dela como membro da equipe e tudo que ela mais queria na vida era ser campeã mundial da FLL, o que tivesse que custar. Sua função na equipe era talvez a mais difícil: ela era responsável por programar o robô deles que deveria executar com precisão 9 missões em uma mesa de 2 m x 2 m. Quando o desafio daquele ano foi lançado ela deixou de ir a aulas, faltou em seus compromissos familiares, tudo para aprender as técnicas mais poderosas e complexas possíveis de programação e resolver o desafio de maneira perfeccionista e elaborada. Á primeira vista o desafio parecia bastante direto: resolva as 9 missões e seja campeão, todavia não era tão simples assim, a ordem das missões, a maneira que elas eram feitas influenciavam na pontuação e era quase que fisicamente impossível realizar a pontuação matematicamente máxima. O trabalho em equipe era um fator essencial no trabalho e Pamela definitivamente não levava jeito para isso; ela programava sozinha, estudava sozinha e pouco se importava em ajudar a desenvolver o projeto de pesquisa ou participar das dinâmicas para melhorias de valores da competição chamados de Core Values. Para o professor Paulo, Pamela era uma aluna complexa de se lidar, ela não ouvia seus constantes pedidos para que ela levasse mais a sério todo o processo de desenvolvimento da equipe, por várias vezes ele pensou em punir ela afastando-a um pouco da equipe para que ela começasse a ter uma visão um pouco mais global de seu projeto; o professor não gostava que a equipe focasse muito nos resultados e tentassem aproveitar o máximo que aquela experiência poderia trazer a eles, o único motivo que o impedia de ser mais duro com sua aluna era o grupo de investidores da escola. Um grupo de empresas da região que financiavam o colégio e consequentemente a equipe, nunca haviam se importado muito com os resultados da equipe, sequer sabiam direito do que se tratava, porém no ano de 2015 a equipe conquistou o título nacional do torneio e várias emissores entrevistaram os alunos do colégio. Com a ambição de ter novamente os holofotes da mídia sobre seu investimento, o grupo de empresas passou a tomar as rédeas de várias decisões da equipe, inclusive sobre a entrada e saída de membros e a ideia de colocar Pamela "na geladeira" era inadmissível por eles que sabiam o quão tecnicamente formidável era aquela garota. Assim, um pouco desanimado o professor seguia com seu trabalho tentando fazer todos os alunos seguirem os valores, sem muito sucesso em Pamela; até que um dia ele viu uma cena inusitada que mudaria sua carreira como professor. No seu dia a dia convencional, Paulo era professor de matemática e sua melhor aluna era sem dúvida Pamela que resolvia todas as provas em tempo recorde, até que um dia ela não o fez, pelo contrário, foi a penúltima a entregar a prova, levando mais tempo apenas que um aluno bolsista, o Pedro. Este aluno dependia das provas para continuar cursando aquele ótimo colégio, sua casa não tinha luz elétrica então ele não estudava a noite, sua mãe era viciada em crack e sua tia, com quem ele morava, não o motivava com o constante pensamento: "Nascemos pobre e nada vai mudar isso"; suas notas só pioravam e se ele fosse mal novamente na sua prova de matemática ele com certeza perderia a sua bolsa de estudos. Pedro vinha de um contexto completamente diferente de todos que estavam lá e havia sido um grande desafio ajudar ele desde o começo, com o tempo os alunos, professores e funcionários desistiram de interagir com ele. Quando o professor percebeu a demora passou a prestar atenção na aula: ela quase não olhava para a própria prova, só olhava para a prova de Pedro e de tempos em tempos dava um chute na cadeira dele quase imperceptível para quem estava por perto, mas claramente perceptível para o aluno. Ao final da prova ela entregou e logo em seguido Pedro fez o mesmo. Foi a pior nota que Paulo já havia visto a Pamela tirar: cinco, exatamente a média de sua escola, dada uma semana o professor lhe entregou a prova já esperando um daqueles surtos que todo melhor aluno precisa ter ao se deparar com sua primeira nota "ruim", todavia ao contrário do esperado, Pamela viu apenas de relance sua nota e correu para ver o resultado do seu (provavelmente novo, já que Paulo nunca tinha visto ela antes com Pedro) amigo que finalmente havia tirado uma nota suficiente para mantê-lo com a bolsa. Pamela havia demonstrado um lado de sua personalidade que seu professor já tinha desistido de explorar, algo nele dizia que grandes coisas estavam por vir, prova de matemática não era um troféu reluzente de "melhor programação" ou "melhor desempenho do robô", mas poderia ser um começo.

Pequenas Histórias sobre Core ValuesWhere stories live. Discover now