12 - Acidente controlado

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Memórias de 2009, 14 anos.

 

— Atenção! Eu quero todo mundo prestando atenção!

Rafa subiu na cadeira assim que o professor deu as costas da sala. Toda a sala presta atenção para o "grande" comunicado dela.

— Hoje às três vai rolar festa na casa de Enzo. Quero todo mundo lá! Só não esqueçam da bebida!

Ela desceu da cadeira enquanto os comentários na sala aumentavam e o barulho chegava a ficar insuportável. Lancei o olhar mais assassino que eu tinha pra Enzo, ele sem graça desviou o olhar. Então eu puxei ele pra fora da sala e entramos na sala do lado que já estava vazia.

Quando dona Luísa, irmã de Vó Ana faleceu, ela e Tia Verônica precisaram viajar às pressas para Juazeiro para o enterro. Enzo não gostava muito dela, por isso elas nem se manifestaram em forçar ele a ir. Queriam que ele ficasse na minha casa, igual todas as vezes que elas precisavam ir sem ele, mas ele bateu o pé dizendo que já era grande e responsável o suficiente. Então, ele teria a oportunidade de se virar e ficar sozinho pela primeira vez.

Tia Verônica confiava em Enzo de olhos fechados, até o momento ele não havia dado nenhum grande trabalho para ela, pelo contrário. Ele era comportado e estudioso, tudo que uma mãe solo precisava para não ultrapassar a cota de estresse.

Então eu - no mínimo - estava irritada com ele e tinha todo o motivo do mundo para isso. Não era esse o combinado, tia Verônica jamais permitiria algo assim.

— Você vai dar uma festa e sua família está de luto — encurralei ele, para que ele nem pensasse na possibilidade de fugir do assunto.

— O que foi? Oportunidades assim não caem do céu.

— Você é a última pessoa que eu imaginaria tendo essa conversa. — passei a mão no cabelo. — O que deu em você? Ficar com essa gente tá mudando sua cabeça é?

— Margot, não exagera. — pegou no meu ombro tentando suavizar as coisas. — É só uma festinha pra a gente se divertir...

— Exagerar é uma ova! — tirei o braço dele de mim com raiva. — Pensa Enzo, isso tem tudo pra dar merda!

Rafa e Vanessa se aproximaram sorrateiramente e ficaram do lado da porta ouvindo nossa discussão.

— Vanessa, se você tem o mínimo de consciência...

— Eu?

— Por favor, a família de Enzo tá de luto, quando eles descobrirem...

— Não vão descobrir. Você não vai contar. E mesmo que descubram... Não pode ser tão ruim assim. Um agito nessa segunda chata não vai matar ninguém. Amanhã é feriado bebê!

Vanessa sorriu empolgada, revirei os olhos. Eu não acredito que vou me sujar por besteira deles.

— Margot nasceu velha, é o que eu digo pra vocês sempre — disse Enzo.

— Eu lavo as minhas mãos pra vocês.

— Ninguém com menos de 40 anos fala isso.

— Eu não sei nem o que isso significa — Rafa estava genuinamente confusa — É algo ruim?

— Quer dizer que eu tô fora. Se der merda, a culpa é de vocês. Além do que, nascer velha é diferente de ter empatia com gente que perdeu um ente querido.

Minha saída assim seria triunfal se Enzo não me puxasse pelo braço. Revirei os olhos me achando uma idiota completa. É claro que ele quer que eu vá.

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