Soneto 005

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Amor é um fogo que arde sem se ver,
é ferida que dói, e não se sente;
é um contentamento descontente,
é dor que desatina sem doer.

É um não querer mais que bem querer;
é um andar solitário entre a gente;
é nunca contentar se de contente;
é um cuidar que ganha em se perder.

É querer estar preso por vontade;
é servir a quem vence, o vencedor;
é ter com quem nos mata, lealdade.

Mas como causar pode seu favor
nos corações humanos amizade,
se tão contrário a si é o mesmo Amor?

ANÁLISE

Neste poema, o autor desenvolve por meio de paradoxos, uma dissertação que defende a tese de que o Amor é contraditório no sentido de criar emoções diametralmente opostas. Trata-se de um belo exemplo de universalidade, pois não se narra um fato individual. Fala-se, em 3ª pessoa, do Amor ideal, platônico.

Os primeiros versos cuidam da anáfora “É” com destaque para o 9º, síntese de todos os anteriores: “É querer estar preso por vontade”. O verso confirma a ideia grega de que amar tira o sujeito de seu ponto racional, adoece-o.

A interrogação que encerra o texto confirma a perplexidade que o amor causa nos homens: como ele, se é tão contrário a si, em vez de criar ódio cria amizade (amor)? Como ele é capaz de ir contra sua natureza contraditória e unir a humanidade inteira? O eu está perplexo não só do poder amplo do amor, mas de sua capacidade de ser contraditório dentro da própria contradição – para ele, o Amor é, então, imprevisível e inefável.

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