30- O fim do mundo

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Logo a rotina virou algo fácil. Distanciamento se tornou fundamental e eu assisti à minha vida se desenrolar como se outra pessoa estivesse tomando decisões por mim. Era horrível ter que ver Dan todos os dias na escola, ter que riscar o cabeçalho do meu caderno, ver Lucas e Dani tendo que fazer malabarismos para dividir a atenção entre nós dois...

Dani acreditava na versão dele de que ele não agarrou a irmã de Alicia — e até eu acreditava nisso a julgar pela sua expressão confusa —, mas eu ainda estava ferida demais para dar o braço a torcer.

Depois de duas semanas, as pessoas pararam de falar sobre Dan e Aline na festa, a fofoca sendo substituída pela traição de um garoto da turma de Dani por sua namorada que já estava na faculdade.

A vida seguiu no seu ritmo natural e até Kaíque parecia mais silencioso que o costume, lançando olhares vitoriosos na minha direção, mas se mantendo afastado. Mais de uma vez eu o flagrei me encarando, porém quando fixava o olhar nele, sua expressão voltava a ser sonsa e dissimulada.

Eu precisava arrumar um confissão dele dizendo que Dan era inocente, que ele tinha plantado a maconha nas coisas do outro, mas como fazer isso se eu me arrepiava de medo só de encarar seus olhos escuros? Não encontrei nenhuma resposta.

Outra notícia varreu esses pensamentos da minha mente na sexta-feira.

Eu estava em casa depois do meu turno, assistindo um filme da Barbie com os gêmeos — bom, com Analu. Antônio não estava interessado o suficiente. Mamãe estava brincando de carrinho com ele na mesa de jantar, toda feliz com o horário normal que o doutor Giuseppe Ricci impunha a seus funcionários.

A mensagem veio do contato Dan Ricci e tinha apenas três palavras: Preciso de você.

Como ele se atrevia a me mandar uma mensagem depois do que fez?

Peguei o aparelho para mandar uma resposta pouco educada, mas o celular da minha mãe tocou.

— Marcelo! — mamãe cumprimentou o seu chefe direto toda simpática. — Giuseppe...?

Ergui a cabeça com o coração acelerado e meu estômago se revirou. Aquilo não podia ser coincidência, podia? Dan me mandou mensagem logo antes de mamãe receber uma ligação sobre o pai dele...  Quais eram as chances?

Minha mãe ficou branca por baixo da pele negra e se sentou de uma vez no sofá, ouvindo atentamente com uma mão no coração. O que era agora?

— E o pessoal do...? — ela se cortou no meio da frase, ouvindo com muita atenção. Ela assentiu minimamente.

Minha mãe pegou o controle e apertou um botão, colocando em um jornal local.

Na televisão um repórter usando capa de chuva amarela e cabelo despenteado como se tivesse se vestido às pressas estava diante de uma mata fechada e escura segurando o microfone e falando alguma coisa, mas eu não consegui prestar atenção em suas palavras, apenas na manchete: Helicóptero cai na mata. Duas pessoas estão desaparecidas.

— ... dono de uma das maiores empresas de inovações agrícolas do mundo ainda não foi encontrado, nem a piloto Mirian do Carmo. O Corpo de Bombeiros está concentrando as buscas em um raio de um quilômetro do local da queda, mas a falta de corpos os deixa otimistas. A repórter Alana de Souza traz mais informações.

Preciso de você.

Me levantei de uma vez só com uma mão na boca, entendendo exatamente o que aconteceu. O helicóptero do pai de Dan tinha caído. Meu Deus.

— O Dan já sabe?

Mamãe fez que sim, tão aturdida quanto eu.

— O Marcelo ligou para ele. Eu vou para a mansão e...

Mentira Perfeita [CONCLUÍDA]Onde as histórias ganham vida. Descobre agora