Parte 3 | A Despedida

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Lucas está mexendo no botão do rádio desde que entramos no carro para fazer a viagem de volta. Ele não para de mudar de estação. Nunca. É como se nenhuma música no mundo fosse boa o bastante. Ou ele não pudesse suportar ter que fazer algo além de mexer no rádio. Algo como conversar comigo. Ou olhar para mim.

Ah, sim, não trocamos uma palavra desde o constrangedor momento em que acordamos nos braços um do outro.

Ou fizemos qualquer contato visual.

E eu estou morrendo. No sentido figurado. E talvez no literal também.

Os nós dos meus dedos estão brancos de segurar o volante com tanta força. E juro que posso ouvir meus dentes rangendo. Meus pensamentos são um zunido infinito desde o momento em que acordei. O que foi que eu fiz? Onde diabos estava com a cabeça ontem a noite? Quero chorar, mas agora já não me sinto mais segura com Lucas para derramar qualquer lágrima  na frente dele.

Tenho certeza que cometi a traição mais vil possível. Tenho certeza que agora Lucas me odeia. E, onde estiver, Gabriela me odeia também.

Esse pensamento é o bastante para formar um bolo gigante na minha garganta e sei que vou chorar a qualquer momento. É por isso que, ao avistar uma placa indicando uma parada na estrada, digo que vamos parar. Lucas apenas acena com a cabeça e eu corro para o banheiro mais próximo para desaguar.

Além dessa agonia esmagando meu peito, existe uma dor pungente martelando a minha cabeça. É o enjôo. Acho que, em todos esses anos lutando contra a depressão, nunca tive tanta vontade de morrer quanto tenho agora, por que essa é simplesmente a pior ressaca que já tive na vida. Tenho certeza que esse mal-estar anormal é o karma que veio a galope me acertar sem dó nem piedade.

Trancada no reservado do banheiro boto tudo pra fora. Além do choro, vomito um bocado. Coisas que nem lembrava de ter comido ontem. O dia anterior é um borrão confuso, mas tem algumas coisas que não conseguiria apagar da minha mente nem em um milhão de anos. Como a sensação das mãos de Lucas percorrendo as minhas costas. Ou o jeito que a luz da lua brilhava sobre seus cachos cor de bronze. Ou ainda como seus olhos me devoravam antes de sua boca o fazer.

Fecho os olhos e sinto um arrepio correr pela espinha. Cada um desses pensamentos é uma traição. Mas cada um deles desperta meu coração de um jeito diferente. É como se cada memória da noite de ontem trouxesse de volta uma parte de mim que achei ter perdido.

Baixo a tampa do vaso sanitário e me sento sobre ela, abraçando a mim mesma. Estou balançando para frente e para trás, tentando fazer meus pensamentos alcançarem alguma coerência. Não tenho condições de sair do banheiro nesse estado. Assim que colocar meus olhos em Lucas posso fazer duas coisas: a) agarrá-lo e beijá-lo; ou b) agarrá-lo e socá-lo; por que, de repente, percebo que não estava sozinha na noite passada. Não fiz nada sozinha. Pelo contrário, tenho bastante certeza de que foi ele quem começou tudo isso.

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