Eu suspirei, antes de me virar e empurrar as portas do necrotério.

Ele era realmente apertado.

Haviam apenas seis gavetas, quando o normal seriam nove ou dez. No pequeno e estreito balcão da sala, apenas um microscópio. No que deveriam ser várias gavetas de instrumentos, era apenas uma, grande, com todos eles amontoados e espremidos como se fossem laranjas. E, na parede em frente à mesa cirúrgica, um retângulo com vidro transparente, que permitia que as pessoas da outra sala enxergassem todo o procedimento.

Coloquei minhas mãos na mesa que estava no centro do local e a empurrei em direção às geladeiras.

— Tudo pronto, Robin?— eu perguntei.

Uni duni duni tê...

— Tudo sim, doutora.

Salamê minguê...

— Ótimo.

O cadáver colorê...

— Tente ser rápida, doutora Foster — escutei a voz de Thomas saindo das pequenas caixas de som nos cantos da sala, que tinham quase o mesmo efeito que um interfone.

Escolhido foi...

— Eu sempre sou rápida, Walker — disse.

Vo...

— Não tenho dúvidas disso — ele retrucou.

Cê!

Geladeira número 005.

Eu abri, e de lá, puxei o primeiro corpo que eu iria examinar, até que ele estivesse sobre a mesa cirúrgica.

— Robin, pegue a ficha do 005 e leia para mim, por favor — pedi.

Logo escutei seus passos agitados e suas mãos procurando pela ficha, enquanto eu puxava a mesa de volta para o seu lugar, desta vez, com um corpo sobre ela.

— O nome dela era Violet Adams...— Robin começou, enquanto eu observava a mulher sem vida.— Ela tinha vinte e cinco anos e trabalhava na floricultura da cidade.

Prendo meu cabelo em um rabo de cavalo, tiro meu jaleco e coloco o avental.

— Ela foi encontra pela manhã, há uma semana atrás. Estava no estabelecimento que trabalhava. A chefe dela disse que a última vez que a viu, foi na noite passada ao assassinato. Elas haviam combinado que ela fecharia a floricultura no final do expediente, e abriria na manhã seguinte. Violet teria sido a última a sair e a primeira a entrar.

Eu assenti. Pego o par de luvas azuis, colocando-as em minhas mãos e volto minha atenção à garota. A cabeça raspada era um sinal de que nós realmente estávamos lidando com um assassino em série, que tinha algum tipo de fetiche com cabelos. Era muito comum assassinos colecionarem coisas de suas vítimas.

Já peguei um que colecionava dedos.

— Nos diga o que vê, Foster — a voz de Devan ecoou na sala.

Eu respirei fundo, analisando cada pedaço da anatomia da garota.

— Ok. Essa garota claramente morreu afogada. Eu não preciso nem checar seus pulmões para saber disso. Conseguem ver?— eu disse, mas aquela pergunta era retórica já que eu a respondi no mesmo instante.— Quando há uma morte por afogamento, a pele fica cianótica. Azulada. É por causa da falta de oxigenação. Fora que ela está com o corpo coberto por edemas, entendem? A quantidade de líquido que entrou dentro dos pulmões foi tão grande que o corpo inchou. Em casos de acidentes em mares e piscinas, o corpo geralmente afunda. Mas nós sabemos que esse afogamento foi provocado, não é?

— Alguém que trabalhe com piscinas? Que faça manutenção delas?— Blaine perguntou.

Eu comprimir os lábios, ainda analisando todos os traços dela.

— Hm... Não sei. Talvez. Mas seria muito óbvio, não seria? Quer dizer, morte por afogamento é um dos tipos de morte mais fáceis de diagnosticar. O assassino não mataria uma vítima afogada, sendo que as primeiras pessoas que desconfiaríamos seriam aqueles que trabalham com manutenção em piscinas.

— Ou talvez seja exatamente isso que ele quer que a gente pense — Caldwell disse.

Subi meu olhar para o vidro que nos separava. Caldwell estava de braços cruzados, o ombro apoiado no canto esquerdo do vidro. Ele tirou os olhos do corpo e os colocou em mim.

— É tão óbvio que nós nunca pensaríamos nisso, entende? — continuou.— O que mais encontrou aí, Foster?

Voltei meus olhos para o cadáver frio e encarei o braço esquerdo. A palavra "DEATH" também estava lá.

— Eu vou coletar uma amostra e analisar, mas...— comentei.— Eu tenho quase certeza de que isso foi escrito quando ela ainda estava viva. As letras estão meio tremidas, ela se debateu para se soltar dele. O assassino é um homem. Só assim para ter força o suficiente para prendê-la e ainda conseguir rasgar sua pele.

Estendi minha mão e Robin prontamente me entregou o bisturi. O levei até o tórax da garota, mas antes que eu começasse a incisão, meus olhos enxergaram outra coisa.

O pulso da garota estava com marcas roxas, provavelmente feitas pelas cordas ou correntes que a amarraram. Mas não foi isso que eu vi. O que eu vi foi uma joaninha pequena, desenhada da mesma forma que a palavra DEATH foi escrita, com algo cortante que arranhou sua pele delicadamente.

Pulso direito.

Joaninha.

Meus olhos seguiram o caminho até minha mão direita, que segurava o bisturi. A manga do avental e a luva cobriam meu pulso parcialmente, mas eu conseguia enxergar a linha negra que formava uma tatuagem.

Pulso direito.

Joaninha.

D E A T H (DEGUSTAÇÃO)Where stories live. Discover now