05

7.4K 1K 403
                                    

Meus olhos negros estavam sem brilho.

Nunca tiveram.

As olheiras abaixo deles estavam profundas.

Sempre estiveram.

Meus cabelos pretos ondulados e levemente volumosos, desciam completamente sem vida até metade de minhas costas.

Nunca tiveram.

Minhas sardas, que enfeitavam meu nariz e uma parte das maçãs do meu rosto estavam estupidamente apagadas.

Sempre estiveram.

Sem vida.

Sem brilho.

Apagada.

Profundamente ridícula eu era.

O espelho redondo do banheiro minúsculo revelava a imagem de uma mulher cansada. Já deveria ter me acostumado com essa imagem, eu a via todos os malditos dias quando acordava e quando ia dormir.

Nunca fui a garota mais bonita, ou a mais feliz, ou a mais iluminada. Eu não fazia muita diferença. Na verdade, eu poderia facilmente ser comparada a um Apêndice. Ter minha presença ou não ter era quase a mesma coisa, mas, enquanto o Apêndice era só o abrigo de bactérias boas para o organismo, eu transbordava coisas ruins. Escuridão. Podridão. Só que, assim como ele, se eu me inflamasse demais, causaria estragos.

Eu explodiria.

E toda a podridão se espalharia tão rápido quanto fumaça.

Contaminaria tudo e todos à minha volta. Causaria uma infecção tão grande, que nem o melhor dos antibióticos poderia curar. Nem o melhor dos médicos poderia controlar.

E eu sorriria com os olhos brilhando, dizendo o quanto aquela destruição era linda.

Respire fundo, Sadie.

É só uma temporada na cidade.

Depois você pode voltar à sua vida patética e cômoda.

Abri a torneira e formei uma concha com as mãos, abrigando a maior quantidade de água que conseguia.

Joguei em meu rosto.

Mais duas conchas de água e eu já estava pronta para abrir a porta, e fingir enfrentar o mundo lá fora.

Sequei meu rosto, destranquei a porta e saí do banheiro.

O silêncio do avião era interrompido apenas por alguns cochichos. Uma comissária de bordo elegante, com um vestido social tão vermelho quanto o batom em seus lábios, caminhava pelo corredor empurrando um carrinho preenchido de bolachas, lanches pequenos, chás, cafés e algumas garrafas minúsculas de uísque.

Minha cabeça doía só de pensar em álcool.

Eu não deveria ter tomado aquela garrafa inteira.

Ainda estava tentando descobrir se o enjoo que eu sentia era por conta da ressaca, ou pelo fato de estar voando diretamente e literalmente para o inferno.

Forcei meus pés a caminharem pelo corredor estreito, por entre as poltronas, em direção à minha, ao lado de Robin. No meio do percurso, uma mulher alta e loira se levantou de uma delas, ajeitando seus cabelos. Os olhos verdes de Katherine Green me mediram de cima abaixo, antes de me lançar um sorriso esnobe e passar por mim, trombando propositalmente em meu ombro.

O enjoo aumentou.

A equipe era pequena. Éramos eu, Robin, Blaine — o gênio da computação —, Thomas e Caldwell. Eu não entendia a necessidade de Katherine nessa viagem também.

D E A T H (DEGUSTAÇÃO)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora