2 - Cantina de Doces

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Há algum tempo atrás atravessar as duas praias demorava bem menos, não pela distância, que era pouco mais de 1 quilômetro, mas pela quantidade de pessoas que caminhavam enquanto o verão estava no auge e as casas "quentinhas" não eram um destino final. A Vila era a parte burocrática daquele conjunto de praias, ficava ao centro, entre as duas praias: Ondina e Talassa, nela permaneciam os prédios públicos e a maior parte das residências.
As mansões lotadas e iluminadas em janeiro dormiam desde o oeste até a placa gigante com o nome da cidade: "Dois Amores". As pequenas calçadas de paralelepípedos se trançavam por meia dúzia de ruas escuras e cinzentas. O mar estava longe, dali se retiravam apenas a vista e alguns prédios públicos inspirados na escola "Art Déco", dizem que Attílio Corrêa Lima em suas passagens por São Miguel, apaixonara-se por "2 amores", deixando algumas inspirações nas construções locais em algum período dos anos 20.
Entender aquela faixa da cidade no verão não fazia sentindo, pois os espíritos aventureiros queriam qualquer coisa, menos voltar pra casa. A vila ficava longe dos bares, da areia e dos amores, era chata e sonolenta.
Quando o verão partia, aquele conjunto de cimento tornava-se exótico e curioso. Dizem que dali, da praia mais abaixo, era o lugar de onde mais pessoas partiam. O pequeno porto, da área mais vazia da cidade era depressivo e ponto de despedidas solitárias.
A noite avançava, e o único sinal de vida em meio às paredes cinzentas vinha da "Cantina de doces" ao lado da prefeitura. Ulisses, procurou por algum tempo alguém por trás da vidraça que refletia uma forte luz amarela.
Não conseguiu encontrar.
O macaron, mais conhecido como "doce da rainha" era a especialidade da casa, a cantina antiga se diferenciava do resto dos prédios apenas pela iluminação incandescente e as letras coloridas que sinalizavam os preços e as promoções do dia nas laterais em vidros do estabelecimento. Outra curiosidade do local é que mesmo após o verão, a pequena venda de doces ficava aberta até meia noite, todos os dias.
Bonne nuit. — Gritou alguém lá de dentro. — Ulisses reconheceu a voz.
Emmelyne circulou por trás de um balcão enorme, e trouxe consigo um sorriso gigante, do tamanho do seu coração.
— Posso dar um abraço? — Disse a morena de quase quarenta anos com seu sotaque francês da Guiana.
— Claro que sim. — ele a abraçou. O cheiro doce da mulher que o apertou trazia boas lembranças.
Emmelyne chegou em "2 amores" no final dos anos noventa. Seus dotes culinários e alguns "Francos" que carregava fizeram-na ancorar naquela pequena cidade vinda de Caiena, na Guiana Francesa. Ela era jovem e tinha o sonho de desbravar o mundo, mas terminou se prendendo aos pecados daquele conjunto de praias. Primeiramente macaron, éclair e os profiteroles eram seu "carro chefe", os doces por alguns verões conseguiram manter suas contas em dias, mas depois de um tempo, mesmo abrindo até meia noite, o negócio entrou em crise, e a morena adaptou o negócio, construiu quatro "quartinhos" antes da cozinha, acolheu meia dúzia de meninas que não sabiam cozinhar iguarias francesas, e a "Cantina de Doces" se transformou no maior e mais movimentado prostíbulo das praias do norte do Estado.

— Espero que não tenha desejado o macaron noturno. — Disse ela. Ele sorriu.
— Foi apenas uma coincidência, estou vindo de Ondina. Ulisses correu os olhos por trás dos ombros. Ela o observava.
Que deprimente. — Emmelyne abriu a porta desviando o olhar e cedendo como sempre. — Entre... Ainda não é meia noite.
— Certeza que posso entrar? Mesmo depois de tudo?
Je te pardonne. — ela tocou o braço do rapaz, sorriu com o canto da boca e seus olhos não negavam a saudade que carregava. — Eu te esperei o verão inteiro outra vez...
Os dois ficaram em silêncio.
— Vem, entra...
Ele entrou. "Fille du venti" tocava baixinho em um som ambiente.
— Pierre Groscolas? — Ele reconheceu.
Oui. — Respondeu ela com o sorriso mais bonito dos últimos verões. Ele sempre voltava.

O açúcar e o cheiro da massa choux eram familiar. O rapaz entrou naquele lugar a primeira vez quando tinha 15 anos. A "Cantina de Doces" foi seu presente de aniversário dado por um dos seus tios, foi uma noite terrível. Ulisses não conseguiu transformar oportunidade e dinheiro em excitação sexual.
Apenas o "macaron" o fez voltar, e algum tempo depois Emmelyne lhe deu uma cortesia sexual. A mulher apaixonara-se pelo garoto quase vinte anos mais jovem. Ela o ensinará tudo o que aprendera na cama.
Antes de seguir Ulisses, Emmelyne trocou a placa de entrada sinalizando que a cantina estava fechada. — "fermé".
Vocês sempre voltam quanto encontram o fracasso lá fora. — Disse a mulher se aproximando. Os olhos grandes fitaram o rapaz.
— Bem... Foi ao acaso minha visita. — Ulisses sempre contemplava cada espaço mínimo entre as cortinas as paredes de uma brancura peculiar.
— Acaso? Não, não. Você tinha que vir aqui. — Emmelyne deixou escapar uma lágrima. — Você não foi o primeiro que me fez chorar.
— Não sei o que dizer. — Ele baixou a vista enquanto ela o seduzia com os peitos fartos.
— Você só precisa ficar comigo esta noite. — Outra lágrima caiu.
— Quantos a fizeram chorar? — Ele a beijou no canto da boca. A mulher estremeceu.
— Três... Um me fez partir da minha terra, outro me fez ficar aqui e você me fez querer morrer. — Ela desabou. — Fica só mais esta noite...

Ulisses a pegou pela cintura, colocou sobre uma mesa e retirou seu vestido.
— Só mais uma noite! — Disse ele retirando o jeans a fazendo gemer. Ele a comeu em despedida.

•••

"DEPOIS DO VERÃO"Where stories live. Discover now