06 - Formando um exército

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Marcela não estava gostando do andamento das coisas. Nem acreditava que tinha topado ir com os amigos para aquele fim de mundo, distante da cidade só para fumar uns baseados. Odiava essa sensação. Odiava ser viciada. Mas, não resistiu, preferiu seguir os dois casais de amigos numa mata distante, longe da cidade, longe da polícia. Agora estava ela, lá, no meio do nada indo mudar a música do carro estacionado alguns quilômetros do local onde estavam fumando uns tragos.

— Merda... — sussurrou ela, sentindo o arrependimento tomar conta do seu peito.

Enquanto seus amigos namoravam em grupo, estava ela pagando de vela, e de empregada. Odiava essa condição.

Com certeza estavam transando aquela altura do campeonato — pensou.

Quando conseguiu chegar ao carro para mudar a música que os mesmos estavam achando ruim, Marcela ouviu gritos. Eram seus amigos.

Por um momento pensou que fosse a polícia invadindo a reserva e prendendo seu bando, contudo os gritos eram desesperadores, agonizantes, como se gritassem por suas vidas. Marcela pensou em correr, mas suas pernas não a obedeciam. Seu coração palpitava, seu instinto gritava, alertando-a do perigo que corria se ficasse naquele lugar.

Quando suas pernas, finalmente, tiveram forças para correr, a garota sentiu que algo estava errado naquele lugar. Sentia-se observada, apreendida de alguma forma, como se estivesse presa num cubo invisível.

O som de passos quebrando galhos, pisoteando folhas secas, eram ouvidos no breu que existia naquela floresta. Marcela não enxergava nada a sua frente, até mesmo a luz da lua estava distante, porém, apesar do escuro e da quietude, sentia que alguém estava por perto, observando-a.

Em um determinado ponto da floresta, ao qual tinha tirado forças para correr, os olhos da garota se arregalaram em espanto. Era um misto de ansiedade, medo e esperança. No meio do caminho, entre a densa neblina que se formava, Marcela viu parecer ser uma figura enigmática que se aproximava lentamente dela. Aparentava ser um homem com pela clara, alto, além de ser muito forte. O mesmo usava uma capa preta, a qual cobria sua cabeça. Estava de calça escura, sem camisa.

Assim que ele parou de caminhar, parando em frente dela, Marcela começou temer por sua vida. Aquele homem poderia ser o ceifador da sua estúpida existência.

O homem permaneceu parado, com a cabeça baixa em silêncio. Marcela não conseguia dizer uma única palavra. Era como ser sugada lentamente da realidade. Tentou por diversas vezes correr, gritar pedir ajuda, mas não conseguiu. Não tinha forças.

Silêncio.

Em um único movimento, a capa daquele homem foi retirada por ele, revelando seu rosto pálido. Tinha cabelos longos loiros, além de uma fisionomia sinistra. A cor de seus olhos pareciam mudar de cor. Seu rosto parecia ter vida própria, pois veias negras apareciam e sumiam do nada. Ele era belo, ao mesmo tempo, absurdamente assustador.

— Você... — começou ele a falar, direcionando o dedo indicador na direção dela.

O coração de Marcela estava acelerado. A cor de sua pele embranqueceu. Seus instintos mais íntimos gritavam pra ela correr, contudo, seu interior ainda insistia, afirmando que não tinha mais solução. Ela estaria morta em alguns minutos por algum maluco, algum tipo de psicopata... Seu corpo estaria nas capas dos jornais, seus familiares estariam horrorizados, sua mãe entraria em choque ao reconhecer o corpo da filha... Sua vida passou por seus olhos.

— ... Você foi convocada. — concluiu o homem.

E ali no meio da noite, ouvia-se o último grito de Marcela. Sua vida esgueirada na floresta por um sanguinário predador.

S&C

Danuta estava preocupada com o andamento das coisas. Tinha recebido uma mensagem urgente do Trono, ao qual teria sido pressionada para impedir essa aproximação entre Rafael e Esmeralda. Odiava ter que fazer isso, mas era seu dever como anjo protetor. Não poderia deixar que Esmeralda sofresse com as consequências das atitudes de um anjo apaixonado. Isso já estava passando dos limites.

— Danuta? — chamou Elice, aproximando-se da irmã.

Danuta desprendeu-se de seus pensamentos, voltando a atenção ao anjo que lhe chamava.

— Oi, Elice. No que posso ajudar?

— Você me parece preocupada, irmã.

— Estou, não posso negar.

Elice se aproximou ainda mais, sentando em uma das cadeiras da sala de estar da casa de Rafael. Era sua nova morada. Os anjos decidiram morar juntos para conseguirem obter maior poder. Eram mais fortes juntos.

— Será que nós não poderíamos deixa-los?

— Não, não podemos. — disse Danuta, cansada. — as coisas não são simples, assim.

Um pouco de silêncio.

— Você o ama, não é?

Danuta suspirou.

— Amo... E parece que piorou ao vir aqui. Não sei como vocês conseguiram viver na Terra por tantos anos...

Elice riu, seca.

— Os nossos sentimentos são intensificados aqui. É difícil no começo, mas logo nos acostumamos. — falou, cruzando as pernas, concentrando-se na sua irmã. — É difícil ser humano. Sentimos o que eles sentem. Tudo é mais intensificado. Parece, até mesmo erro de fábrica. — brincou.

— Nosso Pai nunca erra. — corrigiu, Danuta. — Tudo é mistério em suas mãos.

Elice assentiu, recebendo muito bem a repreensão de sua irmã, e líder. Os primeiros meses não foram fáceis pra Danuta. A vida humana é muito complicada. Um anjo recém-chegado tem muitas dificuldades para se adaptar no início. É muito diferente observar do alto, e conviver embaixo. Tudo é suscetível ao erro na Terra. Parece um teste contínuo, onde muitos podem confundir com provação ao inferno, mas, na verdade as coisas são simples, todavia cabe a nós decidirmos ser guiados pela emoção intensificada ou a sábia razão. O maior dom que se pode ter é manter o equilíbrio.

— Receio vir até você com mais notícias preocupantes. — Elice disse, mudando de assunto.

— Não me espanta. Sinto uma energia ruim em todo lugar dessa cidade.

— Pois é... Estamos recebendo muitas noticias de pessoas desaparecidas na região. Aqui é uma cidade pequena, não é normal tantos desaparecidos. — continuou. — Tememos que um caos se instaure entre os moradores.

— Não vamos permitir. — falou Danuta, sendo firme. — Convoque os meninos. Temos que tomar algumas atitudes investigativas. Convoque, também os anjos mais próximos. Vamos montar um plano de prevenção a uma suposta empestação de demônios.

Elice, assentiu, retirando-se da sala. Não quis preocupar ainda mais sua líder, mas acreditava que ela já estava pressentindo que uma nova guerra sobrenatural iria ocorrer naquela cidade. As forças do mal estavam intensificadas, desde Esmeralda e Rafael terem uma ligação mais íntima. Esmeralda ainda é a chave para a destruição do que há de bom na terra. Ela precisa ser mantida do lado certo dessa batalha, ou as consequências para a humanidade estará perdida.

— Vampiros... — Danuta sussurrou, sabendo do que tratava esses desaparecimentos. Só existe uma coisa para fazer pessoas desaparecerem sem deixar rastros, essa coisa era uma raça que vive na terra há milênios. Escravos do diabo, sujeitos a ordens de demônios.

Sangue & Cristais ( 2° Livro da série S&E)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora