Mas então, como se tivesse voltado para a realidade, um pequeno saco plástico com um comprimido igualmente pequeno em cima da mesa chamou a minha atenção. Aproximei minha mão e peguei a embalagem, analisando com cautela o que era aquilo. Não demorei muito para perceber do que aquilo se tratava. Um comprimido de alguma droga pesada que provavelmente foi a causadora da cena a poucos metros de mim. Uma raiva começou a crescer no meu corpo, aos poucos.

Como ele pôde? Por que foi tão egoísta por ter usado aquelas merdas de comprimido? Por que decidiu pensar em si mesmo e não em mim? Na minha mãe? Ela teria uma parte despedaçada a partir de hoje, assim como eu. Eu não tinha lágrimas escorrendo pelo meu rosto naquele momento. Todas as perguntas e razões para ele ter feito o que fez cobriam toda a emoção que eu tinha, todo o amor pelo meu pai foi soterrado naquele momento, por raiva. Raiva que aumentou a cada confirmação de que o meu pai tinha, de fato, morrido. O mesmo pai que me levava para os lugares mais incríveis da minha infância. O pai que acordava de madrugada para comer besteiras na cozinha, escondido da minha mãe. O mesmo pai que na minha formatura de Ensino Médio, me abraçou e disse que tinha muito orgulho de mim, que eu seria um grande homem, um grande pai.

Um grande pai? Como eu seria um grande pai se o meu próprio fez isso comigo, com a minha mãe?

Eu não acreditava que poderia um dia perdoa-lo pelo que fez, pelas escolhas que tinha tomado. Enquanto isso, eu só precisava externar toda a minha raiva, até que não existisse mais. Até não haver nada e então, eu o perdoaria.

Bryan segurou nos meus ombros, tirando a minha atenção do rosto do cara que fazia parte de um dos motivos por eu ter entrado nesse galpão há dois anos atrás e acabar tanto com um cara, movido por algo dentro de mim, que quebrei alguns ossos do seu corpo e o desacordei por uma hora. Nesse momento, eu queria que o cara que terminasse todo fodido nessa arena fosse Rato.

- Você tem certeza que quer lutar com esse cara? Não acha perigoso? Arriscado? – Bryan continuava tentando me convencer a desistir de lutar com ele, mas agora que eu estava ali, tendo a oportunidade de acabar com Rato, como uma forma de vingança, como uma chance de poder externar toda a minha raiva, de poder matar o filho da puta, sem culpa, podendo dizer que foi acidente, eu não desistiria.

Eu tinha uma oportunidade de acabar com o cara que vendeu a droga que tinha matado o meu pai.

E eu não desistiria agora.

- Eu vou lutar, B.C. Nada vai me convencer de fazer o contrário. Nem mesmo você.

Bryan suspirou e então acenou com a cabeça na direção do segundo andar.

- Nem mesmo ela? – perguntou.

Movi instantaneamente os meus olhos para aquela direção, encontrando Giennah encostada na grade de ferro do camarote, olhando para mim, sem fazer ideia do que que aquilo significava. Que aquilo ali era muito mais do que uma simples luta clandestina. Seria um palco de vingança. Ela sorriu tão abertamente para mim, tão linda, que eu podia jurar que o meu coração tinha tropeçado nas batidas, como se quisesse sair do meu peito para correr até ela. Antes mesmo que eu pudesse responder Bryan, Dick chegou, dizendo para o meu amigo que já podia começar a luta. Bryan suspirou pesadamente, derrotado, me encarando.

- Se não vai desistir, então pelo menos não deixe ele acabar com você, irmão.

Sorri para o meu melhor amigo.

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