Único

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A neve caía forte em Hogwarts, deixando um aspecto gelado e branco ao redor das dependências do castelo e intensificando o clima natalino que tomava conta da escola. Sendo quase meia-noite, o castelo inteiro estava imerso em um sono profundo, exceto Escórpio Malfoy. O garoto, incapaz de adormecer, muniu-se de um cobertor e dirigiu-se à cama do melhor amigo, Alvo Potter, sacudindo-o suavemente e sussurrando seu nome através das cortinas finas que envolviam a cama.

- Scorp? - chamou o garoto de cabelos negros ao abrir os olhos e se deparar com o amigo pairando sobre si. Ele não precisava adivinhar o motivo pelo qual ele estava ali chamando-o e não aninhado em seus cobertores naquele frio. - Noite ruim?

O loiro assentiu com a cabeça, e o Potter imediatamente saltou para fora da cama. Na ponta dos pés, o de cabelos negros agarrou um dos cobertores e um saquinho de Feijõezinhos de Todos os Sabores que encontrou em sua cabeceira, e fazendo sinal para que o amigo o seguisse, seguiu rumo à Sala Comunal.

Isso era o que mais apreciava no seu convívio com Scorpius, a capacidade dos dois de compreenderem e sentirem um ao outro sem palavra alguma ser dita. De saber o que o outro estava sentindo sem que sequer tivesse que explicar. E, sem pronunciar qualquer palavra, os dois chegaram à Sala Comunal da Sonserina, tomando cuidado para que ninguém ouvisse seus passos contra o chão frio.

A Sala estava imersa em fracas luzes verdes, como os dois haviam observado em todas as outras noites em que os dois garotos tinham estado por lá. Estava toda coberta por exageradas decorações natalinas. Mais cedo naquele dia eles haviam aceitado ajudar alguns alunos do primeiro ano a deixar a Sala Comunal - normalmente verde escura e razoavelmente sombria - com um clima mais festivo. Haviam passado a maior parte da tarde tentando convencê-los de que apenas algumas luzes coloridas eram o suficiente para alegrar o local, mas o esforço havia sido todo em vão. Agora, vários bonecos de neve os encaravam do escuro - o que era, no mínimo, um tanto perturbador - e um canto da sala insistia em nevar incessantemente, não bastasse toda a neve que caía sem parar do lado de fora.

Eles se sentaram no chão em frente à lareira, que sempre estava acesa, e ficaram logo ao lado da janela, de onde era possível observar os grossos flocos de neve que caíam lentamente, cobrindo o parapeito, o chão e as árvores lá fora. Os dois enrolaram-se no cobertor que Alvo havia trazido, e por algum tempo só se pôde ouvir o som do fogo crepitando e a respiração dos dois.

- Cera de ouvido. De novo. - disse Scorpius, quebrando o silêncio, após levar um dos feijõezinhos à boca e tirar um sabor ruim pelo que lhe pareceu a vigésima vez no dia. - Eu nunca tenho muita sorte com isso. - disse, fazendo uma careta.


-

Não mesmo. - Alvo respondeu, rindo, porém seu rosto logo ficou sério outra vez, deixando à mostra uma expressão preocupada. - Scorp… Você quer falar sobre isso?

A Sala novamente mergulhou em silêncio. Alvo fitou a janela, aproximando o rosto. Apesar do calor que emanava da lareira, era possível sentir o ar gélido escapar perto das bordas e castigar suas bochechas. Ele aspirou o ar frio, deixando as narinas congelarem, e encostou a testa no vidro gelado.

- Eu sonhei com… - Scorpius hesitou. Suas mãos brincavam com a barra do cobertor, num misto de inquietação e nervosismo que o amigo conhecia bem. - Minha mãe. Como as coisas eram antes que ela se fosse. O primeiro Natal… depois que ela se foi.

Alvo nunca sabia o que dizer quando o assunto era a mãe de Scorpius. Ele sentia como se nada que pudesse dizer fosse ajudar de alguma forma, ou que ele já não tivesse ouvido as mesmas palavras de alguma outra pessoa antes. Ele só sabia que aquilo doía no amigo mais do que ele podia imaginar, e que aquela dor toda o machucava também. Ver Scorpius sofrendo era doloroso. Ele só queria poder se sentir um pouco menos inútil e poder ajudar de alguma forma.

Foi só um sonho ruim. - disse, na tentativa de tranquilizá-lo, aproximando-se de Scorpius e mantendo os corpos encostados para que ambos pudessem aproveitar melhor o cobertor. - Vai ficar tudo bem.

-

O problema é esse - Scorpius respondeu, lançando-lhe um sorriso triste e com a voz perceptivelmente carregada de dor. - Não foi um sonho triste, foi um sonho feliz. E eu sinto tanta saudade… - a voz foi afinando até que sumisse por completo.

O garoto de cabelos negros sentiu vontade de estender a não e enxugar as lágrimas silenciosas que caíam dos olhos do garoto loiro. Tudo o que mais queria era que Scorpius não sofresse. Queria tirar a dor dele, fazer com que ele se sentisse bem, mesmo que para isso ele precisasse sofrer no lugar do melhor amigo. Porque vê-lo sofrer era ainda mais doloroso e assustador do que qualquer outra coisa, e ele faria qualquer coisa para que Scorp pudesse se sentir melhor. Como não havia nada que pudesse dizer, Alvo simplesmente segurou com suavidade a mão de Scorpius, que apertou com força ao invés de afastá-la de si.

- Sabe, passar o Natal em Hogwarts me parece um pouco estranho agora. - admitiu, só para quebrar o silêncio profundo que os tinha envolvido. De fato, era estranho estar ali, e se não fosse pela presença do Malfoy, ele tinha certeza de que estaria se sentindo completamente solitário e triste. Na verdade, só havia concordado em passar as festas na escola porque o amigo tinha prometido estar ali com ele. - Eu não gostava daqui, mas também não gostava de casa, porque… - as palavras perderam-se no ar.


-

Porque você odiava seu pai. - Scorpius concluiu.


-

É verdade. - ele ficou surpreso com si mesmo por não ter percebido antes, e disse em voz alta as palavras que nunca havia reunido coragem para dizer. - Eu odiava meu pai, mas também não o conhecia. Eu me sinto bastante idiota agora.


-

Você não é idiota, Alvo Severo Potter. - disse o garoto loiro. Alvo sacudiu a cabeça em negação. - Eu sou seu melhor amigo e estou dizendo que você não é um idiota, é melhor concordar comigo.


-

Certo. - ele riu, sentido a face corar. - OK, Scorpius Hyperion Malfoy, eu não sou um idiota. Melhor agora?


-

Melhor. - Scorpius também riu, assentindo com a cabeça e olhando nos olhos do melhor amigo. Sua cabeça inclinou-se levemente na direção da dele, e os lábios quentes de ambos se chocaram antes que qualquer um dos dois pudesse notar.

Alvo fechou os olhos e permitiu a si mesmo desfrutar do beijo repentino antes que Scorpius o quebrasse. Mas para sua surpresa, o loiro envolveu-o com os braços, um tanto inseguro, e Alvo fez o mesmo, segurando-o com delicadeza à medida que o beijo seguia. E beijar Scorpius era melhor do que ele poderia ter imaginado. Era como música, como uma melodia crescente que fazia despertar algo dentro de si. Era como milhares dos fogos que o tio Jorge fabricava explodindo em seu peito. Era uma mistura de sorrisos, abraços e sentimentos diversos que faziam seu coração derreter. Ele nunca havia experimentado nada como aquilo, e era tão enormemente maravilhoso. A única coisa capaz de separar os dois foi um estrondo vindo de cima, que os alarmou.

- Alvo? - chamou Scorpius, com a voz trêmula e a respiração ofegante.

- Sim, Scorp? - o outro respondeu.


- Quando acordamos na manhã de Natal, nossos presentes estão sempre lá. - Alvo o fitou, curioso, tentando entender o ponto daquela afirmação. - Acho que nós estamos atrapalhando a entrega.

Após uma prolongada troca de olhares, ambos recolheram do chão toda a bagunça dos Feijõezinhos e o cobertor que os envolvia. Subiram as escadas o mais rápido que puderam sem causar algum ruído, e logo se viram de volta ao dormitório, onde os poucos rapazes que haviam ficado para o Natal pareciam estar imersos em um sono profundo.

- Boa noite, Al - disse o Malfoy, incapaz de parar com os sorrisos enormes que ficavam brotando à sua face naquele momento - Feliz Natal.


-

Feliz Natal, Scorp - respondeu o Potter, encontrando-se igualmente incapaz de deixar de sorrir tão enormemente. - Boa noite.

Pelas próximas horas, nenhum dos dois foi capaz de dormir. Não porque estivessem tendo uma noite ruim, mas porque não paravam de pensar um no outro, e em como cada qual era o melhor presente de Natal que qualquer um pudesse querer.

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All I Want For Christmas Is You | scorbusOnde histórias criam vida. Descubra agora