Capítulo Único

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O que diabos eu fiz?

Sinto meus lábios secos e rígidos. Dentro do bolso de meu moletom, minhas mãos tremem, e sei que não trata-se mais do frio de Nova York. Em seu olhar perdido, ele espera que eu responda-o. Ele espera, ao menos, que eu deixe de encará-lo da maneira que estou encarando-o naquele momento.

— Brooke... — seu timbre trêmulo alcança meus ouvidos no exato momento em que entreabro meus lábios.

— Não é verdade — corto-o, minha voz atravessando a sua de maneira espontânea. Atropelo ele e meus próprios pensamentos enquanto digo: — Não pode ser verdade.

A linha de expressão em sua testa enruga, as sobrancelhas franzidas.

— Eu...

— Retire o que disse — concluo, séria e firme. Dentro do bolso do moletom, minhas unhas fincam-se na palma da minha mão. Elas estão gélidas e quase não consigo sentir o meu próprio toque.

Durante alguns segundos, espero que ele retruque. Espero que ele tente dizer algo novamente, mas seus olhos castanhos encaram-me arduamente. Lentamente, sua expressão confusa se esvai enquanto ele parece estar analisando-me. Enquanto busca algo além da minha postura ereta e do meu maxilar rígido. E gradativamente, enquanto o tempo aparenta correr mais lentamente do lado de fora de nossa bolha, sinto-me irritada.

Porque eu sei o que ele está fazendo; ele está me enxergando. Seus olhos estão atravessando-me, como ninguém nunca faz. E sei que ele consegue chegar até o outro lado de mim com tranquilidade. Não há barreiras, e nem detectores que o impeçam. Quero dizer, há dentro de mim um esquema de segurança rígido o suficiente para permitir que ninguém nunca veja através de mim.

Mas todo os dispositivos são desconectados quando se trata dele.

E então, quando sinto-me invadida o suficiente, batuco o pé contra o chão algumas vezes, transparecendo a minha impaciência. E, involuntariamente, o meu medo. Eu quero pedir novamente para que ele diga que está mentindo. Eu quero implorar para ser apenas uma pequena brincadeira.

— Não há nada que você possa fazer ou dizer — é tudo o que ele diz enquanto encolhe os ombros em uma falsa postura de indiferença. E sei que é falsa porque também consigo ver através dele. — Não há nada que eu possa fazer. Eu não posso evitar, Brooklyn.

E então, seus belos olhos avermelham-se em minha frente, estáticos e conspícuos. Até que, perante ao pôr-do-sol, assisto-o chorar em minha frente. Silenciosamente, como uma pintura bela e triste.

Enquanto observo a maneira como as lágrimas contornam seu rosto e vasculho, desesperadamente, algo para dizer, percebo um pequeno detalhe; eu nunca tinha visto-o chorar. Desconsiderando uma vez em que éramos crianças, e dolorosos momentos melancólicos, nunca havíamos atingido aquele nível. Ele não chorava. Chorar não era do seu feitio. Eu teria passado tempo demais acostumando-me com este fato.

E dar-me conta disso deixou-me pior. Ainda mais quando sei que sou a razão dele estar chorando naquele momento. Eu nunca quis fazê-lo chorar. E no momento em que este pensamento atingi-me, percebo que também estou permitindo que lágrimas contornem minhas bochechas.

Embora chorar também não seja do meu feitio.

Por favor, imploro à ele em meus pensamentos. Diga que só está tentando me fazer rir. Talvez ainda há tempo de contarmos uma boa mentira para nós mesmos.

— Shawn... — arrisco um passo em sua direção.

— Acho melhor não, Brooke — ele murmura de volta enquanto recua. — Eu tenho certeza que qualquer coisa que você me disser será exatamente o que eu não preciso ouvir no momento.

— As coisas não precisam mudar — murmuro de volta, sentindo como se um nó embolasse-se em minha garganta, dificultando toda frase que escapa dos meus lábios. Revelando-as mais dolorosas do que gostaria. — Eu não quero — acrescento enfática, em um mísero sussurro que duvido que ele possa ter ouvido.

Ainda espero que ele retire o que disse. Espero que ainda tenhamos tempo.

Em resposta, ele abra-me um simples sorriso. E sei que não há uma mísera felicidade em seu gesto. E conseguir enxergá-lo encenar tão bem quebra-me inteira. E sinto-me tão desnorteada que não digo mais nada.

E permanecemos naquele silêncio até que, dando-se o assunto como finalizado, gira os calcanhares e caminha em direção oposta. Desespero-me no mesmo instante.

Não consigo visualizar o que perdi dentro das últimas horas. Em qual vácuo eu teria me perdido para que chegássemos àquele momento. Estávamos bem. Havíamos passado a noite toda acordados, presos em um de nossos próprios voos noturnos. Imersos em nossas próprias filosofias, e nada parecia que havia mudado.

Eu queria poder retirar o que eu teria dito que o fez mudar de ideia.

Então nada precisaria mudar hoje.

Apresso meus passos. Contorno seu corpo, desajeitadamente e tropeçando em meus próprios pés devido à visão turva. Antes que seu semblante mude para confusão, puxo-o contra meu corpo, abraçando-o em meio ao Central Park. E sem hesitar, ele abraça-me de volta.

Sinto como se estivéssemos desmoronando enquanto escurece e a noite abraça-nos também, como um reencontro de velhos amigos.

Não há nada que você possa fazer ou dizer.

— Eu não posso evitar, Brooke — ele sussurra ao pé do meu ouvido, desolado. — Eu não quero. Eu não quero, mas...

— Eu amo você.

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⏰ Last updated: Jun 11, 2019 ⏰

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