A noite na Vila

5 0 0
                                    


— Viu só como é bom usar cueca de vez em quando! — insinuei.

Claro que eu fugia dele, evitando ser alcançado por suas traquinagens. Não estava a fim de molhar minha única roupa.


À noite na vila.


Meia hora depois, suas roupas ainda estavam molhadas e ao subirmos para a residência da chácara, ele decidiu leva-las nas mãos.

Chegando ao grande quintal, ele pendurou tais vestes no varal de arame liso.

— Larga de ser preguiçoso, moleque! — chamei-lhe a atenção. — Essas roupas estão encardidas. Passe elas na água.

— Acha! E eu vou ficar pelado até quando?

— O que é que tem! A vovó nem enxerga! O vovô e o titio são homens!

— Fique você, pelado, pra ver!

— Eu não! Minhas roupas estão sequinhas!

— Bem que você poderia me emprestar sua cueca pra mim tirar esta molhada!

— Credo! — protestei. — Roupas íntimas a gente não se empresta!

— Então empresta a calça!

— E eu ficar de cueca! Nem morto!

— E eu vou ficar molhado até quando?

Pensei um pouco e acabei decidindo, tirando minha calça curta e entregando a ele:

— Pode usar! Pra ajudar você eu ficaria até pelado!

— Então empresta também a cueca!

— Eu não! — protestei. — Foi apenas uma expressão!

Apanhei suas roupas no varal, inclusive sua cueca, a qual ele tirou ali mesmo no quintal, nem se preocupando caso alguém lá da rua tivesse olhando, já que o muro era muito baixo, joguei tudo no tanque de vovó, apanhei um balde de água de seu poço com bomba de sucção manual, ajudei Regis a lavá-las e tornamos a pendura-las no varal para secar, aproveitando o Sol não muito quente deste período de início do mês de Maio.

Passamos agora a correr pelo quintal lateral da residência, subindo em suas escoras de concreto de posição inclinada que ajudavam a segurar o muro da divisa com a rua, já que o mesmo era responsável para segurar centenas de toneladas de terra da rua em outro nível bem mais alto do que o quintal.

Como a roupa estava demorando para secar, resolvemos entrar para tomar um copo de água, tomando de uma caneca feita com lata de massa de tomate vazia, enfiando a mão sobre a boca larga do pote de barro branco na cozinha e levando aquela preciosidade na boca, ao qual o maninho fez tremenda careta protestando:

— Credo, que água horrível!

Vovó, sentada em sua cadeira da copa riu do jeito do menino.

— Esta água é salobra — lembrei-me eu. — Aqui em toda nossa região do estado de São Paulo, apenas nossa cidade tem água de gosto agradável ao paladar. Apenas lá tem a verdadeira água insípida, incolor e inodora.

— Ino...o quê?

— Incolor, insípida e inodora — ri por sua ignorância de assunto ao qual ainda iria estudar. —Sem cor, sem cheiro e sem sabor. Do jeito que a água precisa ser.

Através das Barreiras do tempoWhere stories live. Discover now