– Olá! Como estão? – ouvi minha mulher dizer na porta. – Sejam bem-vindos.

Levantei e fui até lá. Não queria bancar o mal educado.

– Boa-noite – eu disse, cumprimentando o casal e a criança na minha frente. Até que eles pareciam legais. A senhora me deu três beijos molhados. Geralmente só dou um, mas retribui diante do exagero. O senhor quase destroncou minha mão com uma força que mais parecia querer esmagá-la. Quando percebi, tentei desviar do abraço a tempo, mas ele me agarrou e estapeou minhas costas, que já não estavam muito bem depois de um dia inteiro sentado na frente do computador. O menino, que não deveria ter mais que seis anos, não parecia fazer a mesma questão de me cumprimentar. Sorri simpático, mas ele apenas me ignorou, dando às costas.

Meu cunhado e a namorada estavam logo atrás.

– Venham à cozinha – disse Clara, apontando a mesa. – Já estou quase terminando a janta.

– Vinho? – ofereci.

– Com certeza – disse Seu Cláudio, agarrando uma taça.

– Só uma taça, Cláudio! – disse a mulher em tom autoritário.

– Só uma taça, só uma taça.

– Vai demorar muito? – perguntou o moleque a mãe.

– Não, meu amor. Não ouviu a tia dizer que o jantar está quase pronto?

– Estou fazendo Fondue, Carlinhos – disse Clara, tentando agradar a criança.

– Mãe, você não disse em casa que a comida ia ser boa?

Dona Vera nos olhou envergonhada.

– Carlinhos, que isso! Olhe os modos. A comida é ótima. Precisa ver como a tia Clara cozinha.

– Mas a senhora já provou a comida dela? – perguntei de propósito, já sabendo a resposta.

A mulher ficou ainda mais roxa e Clara me fuzilou com os olhos, como se eu fosse um estúpido.

As três mulheres se ocuparam com o fogão enquanto nós – os homens – ficamos na mesa jogando conversa fora. Seu Cláudio e meu cunhado Rafael começaram um longo debate sobre futebol e eu participei interessado. A criança se revezava correndo e interrompendo nossa conversa aos gritos, sem esperar.

– Pode aguardar seu pai e eu conversarmos? – eu tive de pedir, já irritado.

– Silêncio, Carlinhos! – disse Seu Cláudio – Já não te ensinei a deixar os adultos terminarem de falar?

Logo a conversa estava como toda refeição em família. Aos poucos, o assunto era cada um apontando os defeitos do companheiro. Dona Vera começou a reclamar que o marido não parava de encher a taça. Ele lamentou por não ter casado com uma muda e ter escolhido uma mulher que não para de falar. Rafael e Irene também começaram a apontar seus defeitos e até Clara e eu já estávamos entrando na disputa com bom-humor, mas todos pararam quando Vera ficou extremamente ofendida e passou a discutir seriamente com Cláudio.

– Está achando ruim? Ainda dá tempo de trocar.

– Não sei, não. Na minha idade o divórcio é complicado. Quem vai lavar minhas roupas?

Dona Vera se irritou ainda mais com o machismo.

– Oras, arranje uma piranha dessas para te servir. Vamos ver se você consegue.

As Mentiras que os Honestos ContamWhere stories live. Discover now