Ponto de Inflexão

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– Fiquei evitando pensar nele, e por causa disso fui esquecendo dos detalhes. – Suiko constantemente desviava o olhar como se procurasse as palavras – Você estava lá, Lurien. Rafael também, mas eu não o vi – o irmão engoliu em seco – e eu sei que ele não era uma estátua. Ele tinha feito algo comigo, e eu estava morrendo. – Suiko encrespou os lábios ao lembrar – Você estava tentando usar suas habilidades para me salvar, mas nada fazia efeito.

A menina se calou, deixando o silêncio pesar sobre a cabeça dos dois irmãos. Lurien apertava os dedos sem perceber, com o pensamento de ter sido impotente ao tentar salvar a irmã. Ele não sabia exatamente o que aquilo significava para ela; ter um sonho em que o único disponível para a ajudar era aquele que não tinha capacidade de fazê-lo.

– Outra coisa – continuou Suiko – que está aumentando minha preocupação é algo que eu não deveria te dizer, mas direi de qualquer forma. – Lurien continuou calado – Eu sei qual foi o tema da reunião que aconteceu ontem. Lucius detectou uma possível evolução de suas habilidades, e o uso dela pode ter péssimas consequências.

Lurien sentiu o corpo retesar. Suiko continuou sem pestanejar.

– Lucius acredita que você possa se tornar capaz de criar realidades alternativas ao manipular a linha do tempo das coisas; ou que você talvez já seja capaz, só que ainda não foi vista nenhuma evidencia disso!

– Realidades... alternativas... – gaguejou o menino.

– Lurien, e se você criar uma realidade em que Rafael nunca se tornou uma estátua?

– Eu não faria isso.

– Não estou dizendo que faria, mas a reunião aconteceu justamente porque essa habilidade pode se manifestar sem que você perceba. Não lembra das almas sólidas da Amabel vagando pela casa enquanto ela dormia?

Lurien deixou o queixo cair.

– Mas se Rafael deixar de ser uma estátua de repente por causa de uma manipulação todo mundo vai perceber, não é?

– Aí é que está! Não necessariamente, por que ao tornar a realidade em que Rafael não é uma estátua a realidade corrente ninguém, exceto você, vai lembrar da outra realidade. Para o resto do mundo Rafael nunca foi uma estátua...

– É o quê...?

– Isso porque estou assumindo que você vai lembrar da outra realidade.

– Suiko, do que é que você está falando?

– Suas habilidades, Lurien!

Lurien já tinha deixado a mente vagar pelas implicações que aquela revelação trazia.

– Se Rafael não se tornou uma estátua, significa que Ninih nunca voltou, com isso Elina e Telia jamais nasceriam.

Suiko interveio.

– Você ainda não pensou a fundo o suficiente. Ramon pode nunca ter morrido, fazendo com que Rafael não se torne o sabe-tudo que ele um dia foi, mas isso ainda traria consequências feias para nosso lado na Guerra de Raziel. Ou talvez nunca tenhamos perdido a Guerra do Gatilho, fazendo o Refúgio nunca ser fundado, talvez nossos pais jamais se conhecessem se esse for o caso. Podemos ficar aqui o dia todo pensando nas inúmeras possibilidades, mas acho que você já entendeu meu ponto.

– Não Suiko... eu não quero ficar pensando sobre isso. – de fato, Lurien já estava sentindo sua cabeça esquentar com aquilo – E também não quero ficar alimentando essa fantasia de Rafael só porque você está com medo de um sonho.

– Não foi um sonho qualquer, Lurien! – Suiko levantou-se do chão e agarrou os próprios cabelos em frustração. – Mas não importa o que você pensa agora, só me prometa que vai tomar muito cuidado.

RecomeçoWhere stories live. Discover now