Alma? Pelos deuses!

– Toque nela e verá.

Suiko esticou um dedo na direção da testa da menininha e a tocou.

– Parece bem consistente para mim.

– Não pode ser!

A moça tocou mais uma vez, e colocou força a ponto de empurrar a cabeça da irmã para trás.

– Amabel? – Lurien chamou, pensando que poderia ser uma brincadeira de mau-gosto da irmã, mas logo viu que estava errado – Não, eu tenho certeza que isso aí é uma alma. Não sei como eu sei, mas eu sei que sei.

– Quando Amabel aprendeu a fazer almas sólidas?

– Não faço ideia.

– Viu só? É disso que estou falando. – falou Suiko, puxando o irmão para longe da alma – Amabel está aí fazendo almas enquanto dorme, o pressentimento sobre a viagem está cada vez pior.

– Se é que ela está dormindo, né?

Os dois se entreolharam e falaram quase ao mesmo tempo:

– Vamos lá ver.

Suiko tirou a alma de Amabel do caminho e abriu a porta cuidadosamente, Lurien foi em vão segurar a alma para ela não cair, mas ela se equilibrava perfeitamente, e ficava bem quieta, com os olhos mirados para o nada, parecia respirar lentamente. Assustadora.

Os dois estavam no corredor escuro, quando Lurien soltou um suspiro de alivio:

– Suiko, tem uma coisa que quero te dizer.

– Agora não! – respondeu logo a irmã, fazendo um movimento com a mão que pedia silêncio.

O rapaz apertou os dentes.

Suiko tinha uma expressão séria e preocupada, quase como a que Lurien havia visto durante o jantar. Eles passaram pela frente do quarto dos pais e Lurien encostou o ouvido na porta para tentar descobrir se eles estariam acordados, mas logo percebeu que era uma ideia tola e continuou seguindo a irmã. Suiko já estava tentando girar a maçaneta da forma mais cautelosa que conseguisse quando o menino se aproximou e sussurrou:

– Eu acho que... – mas ela não o deixou terminar fazendo movimentos bruscos com o braço, visivelmente irritada.

Ela entreabriu a porta e colocou a cabeça para dentro retirando-a logo em seguida. Ao sair virou-se para Lurien e fez um movimento horizontal com a mão que ele não entendeu muito bem, mas pôde ler em seus lábios: "dormindo" então balançou a cabeça positivamente. Suiko fez mais um movimento com as mãos que dessa vez queria dizer claramente que eles deveriam voltar para o quarto. E assim fizeram.

De volta ao quarto perceberam que a alma não estava mais lá.

– Suiko, olha... – recomeçou ele, apesar do rosto tenso a irmã prestava atenção – Aconteceu uma coisa estranha comigo hoje... Envolvendo minhas habilidades... – ao ouvir essas três últimas palavras Suiko levantou o supercilio – Lembra que você reclamou comigo quando demorei no banho? – a irmã assentiu curiosa – Então, eu estava fazendo uma experiência com a banheira e água quente. Queria tentar explorar os limites atuais das minhas habilidades colocando a mim mesmo numa situação de limite. Eu estava totalmente mergulhado na água quente e de repente a água da banheira sumiu de uma forma que não consigo explicar. E o mais importante é que para mim só se passaram alguns minutos. – os olhos de Suiko pareciam brilhar.

– Isso é... – ela procurou a palavra certa –... Importante! – mas falhou.

Os dois ficaram apenas se encarando, Lurien com cara de réu primário e Suiko apertava os próprios dedos numa mistura de preocupação e satisfação.

RecomeçoWhere stories live. Discover now