SERMÃO

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Álvaro Ventura nunca pensou que um dia teria que buscar um filho numa delegacia, mas quando os filhos crescem, os pais perdem totalmente o controle, por mais que pensem o contrário. Para ele, era como se o filho ainda fosse aquele garotinho inseguro, que ao tentar chutar a bola caía, chorava, protestava e não queria mais brincar. Aí, ele limpava a sujeira do pequeno, renovando o ânimo dele para que tentasse novamente e, finalmente ele acertava um chute leve, fazendo a bola rolar alguns centímetros, desabrochando um sorriso nos lábios do pai coruja, que abraçando o filho, dizia: Bom garoto! Mas agora, tudo era diferente, o filho já não era mais aquela criança indefesa e com medo. Ele já fazia parte do mundo dos adolescentes, onde esses, estão fazendo suas próprias descobertas, mentindo, experimentando os deleites e perigos da luxúria, seja na casa de um colega ou até mesmo nos sanitários da escola. Paco já havia passado da fase escolar, porém, tinha experimentado inúmeras coisas que os pais jamais cogitariam em suas inocentes mentes.

Paco, às vezes, usava sua beleza para provocar horror.

– Nunca imaginei que teria que buscar um filho numa delegacia! Onde você estava com a cabeça para agredir uma pessoa? Você come grama?

– Pai, ele me tocou – bufou o rapaz.

– Mentira, Paco! – Álvaro estava bastante estressado. – Eu conversei com o Juno por telefone. Olha, a Dra. Riane está aqui, porém solicitei a ela que desse uma boa aula antes de você sair daqui, para que isso jamais se repita.

– Aff, lá vem a metida!

– Metida ou não, veio para te tirar daqui e você vai ouvi-la!

Dra. Riane entrou e colocou sua refinada pasta preto carbono sobre a mesa, enquanto Álvaro deixava a pequena sala da delegacia.

– O senhor sabe que cometeu um crime? – Ela sentou-se de frente para o cliente e prosseguiu. – Pois bem, todo ato tem uma consequência. O Crime que o senhor cometeu foi de Lesão Corporal Leve, crime este de menor potencial ofensivo, previsto no artigo 129 do Código Penal, com uma pena de detenção, de três meses a um ano. O Senhor teve "sorte" que a lesão não causou nenhuma gravidade à vítima, caso tivesse ocorrido a sua pena poderia chegar a até 12 anos de reclusão. Diante disso, como prevê a Lei 9.099/95 (Juizados Especiais), o Ministério Público poderá oferecer a transação penal que comporta: a imediata aplicação de pena restritiva de direitos, prestação pecuniária, perda de bens e valores, prestação de serviços à comunidade ou entidades públicas, interdição temporária de direitos ou limitação de fim de semana, na forma do artigo 43 do Código Penal, ou multa. E não acaba por aí. A sua prática delituosa é passível de reparação. A vítima já entrou com pedido de danos morais e materiais na justiça. Se prepare para gastar todo o dinheiro que tem na poupança. A vítima trabalha com a imagem e terá que ficar afastada do próximo desfile do São Paulo Fashion Week, devido às lesões. Não tenha dúvidas que o Juiz vai pesar a caneta, ah, vai. Enfim, o importante é que o Senhor não ficará preso...

– Que saco! – Paco interrompeu Riane. – Tenho que ouvir essa ladainha toda?

– Sim senhor! Trate de pensar antes de agir de forma inconsequente, você não é mais um garotinho. Tem vinte anos. Era só isso que eu desejava falar. Agora, por gentileza, levante-se e vamos, preciso tomar um café expresso.

– Ok, Sra. Dra. Riane. Olha no que deu uma bolsa e uma cota! – disse Paco, mas em pensamento: Ok, sua vaca bolsista.

– Você foi irônico, mas acho chique quem não usa palavrões, apesar de saber que mentalmente você acabou de usar um.

Ela estava bem alinhada. Uma bela imagem de mulher empoderada, independente e possivelmente realizada em todas as áreas da vida. Era negra e filha de pais humildes, mas graças a uma oportunidade mudou de vida e agora era uma bem sucedida advogada.

7mbro EternoWhere stories live. Discover now