– Eu achei seu Instagram e depois disso foi fácil encontrar onde você trabalha e onde mora. A tecnologia não é uma benção? – seu tom era divertido, mas ela continuou séria. Algo agora a incomodava e antes que pudesse filtrar, as palavras já deslizavam amargas pela sua língua.

– Por que agora?

– Eu assinei um contrato de três anos sem relacionamentos e depois que ele acabou eu quis procurar por você, mas não sabia direito o que fazer... – Jinyoung passou a língua pelos lábios, enquanto olhava para os seus dedos entrelaçados sobre o colo, parecia de fato nervoso e ela apreciava aquilo, mesmo que a própria não fosse um exemplo de calmaria.

– Aí você escreveu uma música e teve a brilhante ideia de me convidar? – perguntou como se continuasse a sua linha de raciocínio e ele soltou uma risada.

Você não sabe do terço a metade, Suri. Era o que os olhos dele diziam, mas logo sua postura mudou e ele parecia... miserável.

– Eu vi você chorar e aquela não era a minha intenção, procurei por você depois da apresentação e... – ele fez uma pausa, como se fosse uma memória ruim. – Não te encontrei.

– Não é como se fosse fácil pra mim. – Ela deu de ombros, se encolhendo no sofá.

– Eu sei – foi rápido em responder. – E eu sinto muito, sinto muito porque não sei se ainda sou bem-vindo na sua vida e talvez eu esteja invadindo completamente seu espaço agora.

Então Suri passou um tempo o encarando, agora que ele estava de fato ali, era difícil absorver qualquer coisa quando existia o fator passado na equação. O passado que tiveram deixava claro o quanto a distância entre dois era real, em todos os sentidos, mas ela também sabia que de alguma forma esse mesmo passado os unia. Só eles sabiam o que viveram, sentiram, sofreram e ela acreditava piamente que as coisas aconteciam como deviam acontecer, sem mais, nem menos. Não que fosse fácil aceitar, no entanto.

– Suri? – seu nome foi entoado de novo, como a melhor parte de uma canção, e ela piscou os olhos, saindo de seu devaneio.

– Antes eu perguntei por que agora, mas agora eu preciso entender... Por que você está aqui? – foi direta e Jinyoung abriu a boca, antes de franzir a testa e fechar os olhos, parecia estar arquitetando suas próximas palavras e ela secretamente apreciou aquele momento.

– Passei as últimas semanas me enganando de que precisava te ver mais uma vez e era só isso, mas bem lá no fundo eu sabia de cor e salteado que só te ver não seria o suficiente. – Ele fez uma pausa, falava olhando bem nos olhos dela porque ambos sabiam que aquilo era um jogo perigoso, um passo em falso e os dois cairiam. – Eu quero saber como você realmente está, quero saber como foi a sua faculdade, quero saber do seu trabalho, quero admirar cada obra sua... Eu quero mesmo fazer parte da sua vida... – e ela podia escutar o "mas" que morreu na boca dele, afinal ela não era a única com medo ali.

– Mas? – incentivou ele a continuar, ciente que era uma jogada arriscada e inevitável.

– Se você não quiser, se eu não for mais bem-vindo, eu saio por essa porta agora e vou respeitar a sua decisão – disse e a expressão dela que antes era dura, suavizou. – Por favor, eu espero que pense com carinho.

– Você, por um acaso, está implorando, Park Jinyoung? – ela semicerrou os olhos e dessa vez foi a vez dele relaxar no sofá, cruzando os braços com a mudança de postura dela.

– Eu não imploro – respondeu –, mas pra tudo na vida existe uma exceção.

E então o sorriso dela veio, amenizando um pouco a tensão que tinha inundado a sala. Por mais que fosse dolorido encarar as cicatrizes, ela não queria perdê-lo de novo, porém, agora que tinha a chance, era justo fazê-lo implorar.

– Eu senti sua falta desde o momento que eu soube que algo estava errado, cada dia depois daquilo foi uma tortura e até hoje eu acho que nunca cheguei a me acostumar com o fato de que não teria mais você. Eu não quero passar por isso de novo, Jinyoung, deveria ser proibido alguém ter tanta importância na vida de outra pessoa como você teve na minha. Não que eu precise de você pra viver, mas você entendeu, não é? – Ele balançou a cabeça e ela continuou. – Então, por favor, implore.

Suri estava jogando pesado, porém tinha sido sincera em cada palavra e quando Jinyoung sorriu, antes de voltar as orbes escuras à ela, ela sabia que de alguma forma estava acabado.

– Uma vez me perguntaram qual era o meu tipo ideal e quando eu vi tinha te descrito por completo, tive que pedir desculpas por ser tão detalhista, mas te vendo agora... É como um sonho se tornando realidade e eu não vou deixar que essa oportunidade deslize feito água pelos meus dedos – disse e se levantou do sofá, tirando o sobretudo e deixando em cima do estofado em seguida.

– Um striptease é a sua maneira de implorar? – dessa vez foi ela que cruzou os braços, levantando o queixo para que ficasse claro que aquilo definitivamente não ia dar certo.

Jinyoung deu uma risada alta, dobrando a blusa de frio nos cotovelos e se aproximando dela. – O que aconteceu com você, Suri? Sua mente não era tão suja assim.

Ela deu de ombros, segurando um sorriso quando ele se agachou na sua frente e estendeu a sua mão, como um perfeito cavalheiro saído de um livro.

Por favor, por favor, por favor – repetiu a palavra três vezes e ele não precisava dizer mais nada para que ela soubesse tudo o que ele queria que ela compreendesse.

E de novo o tempo deixou de existir, ainda mais quando Suri aceitou segurar a sua mão e sentiu o coração se aquecer, como ele tinha escrito na música para ela. A primavera em meio ao inverno, o calor derretendo todo o gelo que havia ao redor e pela primeira vez depois de tanto tempo não faltava nada.

Por favor – Jinyoung pediu novamente depois de um longo momento e tudo que ela pode fazer foi concordar com a cabeça, dando o sinal verde para que ele se sentasse ao seu lado, oferecendo agora a mão direita.

A mesma mão que ela adorava ter colada a sua, gostava de quando aqueles mesmos dedos tocavam com tanta paixão as notas no piano, se lembrava de cada vez que dedilhavam a sua pele, fazendo música com o seu corpo. Então Suri pegou a sua mão, observando atentamente as linhas e montando um desenho mental. Daquela vez, iria pintar flores amarelas, porque como Van Gogh um dia tinha dito: o quão amável é o amarelo. E o amarelo combinava com o homem que tinha se sentado ao seu lado, tão amável quanto.

Ela espalhou ainda mais o seu material sobre a mesa da sala e puxou para perto, enquanto ele observava ela fazer uma bagunça com tintas de diversos tons, pincéis e fazia da palma da sua mão o seu canvas. Mas a cada pincelada era uma lembrança dolorida que queimava em seu coração como uma ferida que lutava para ser curada e ambos sabiam que deviam deixar aquilo ir, deviam se perdoar, deviam deixar todo o sofrimento ir porque estavam em uma nova fase da vida. Uma em que já tinham escalado uma montanha por caminhos diferentes, já tinham passado pelo pior e podiam ver o pôr do sol lá de cima, porém, por mais que tivessem se separado no meio da trilha, se encontraram no topo. E juntos chegaram a conclusão de que valera a pena.

Ainda que doesse, ainda que ele carregasse tantas marcas quanto ela, estavam juntos.

E isso a fez levantar o olhar, não para encontrar os olhos dele, mas para lembrar mais uma vez do bilhete que ele tinha deixado antes de ir atrás uma última vez do seu sonho.

Good things happen. Love is real. We will be okay.

Eles acreditaram em cada palavra, eles foram resilientes e, no fim, quando ela terminou de desenhar o jardim de margaridas na mão dele soube que tinha um significado muito maior. E ele parecia sentir o mesmo porque sorria, sorria de todas as formas possíveis, sorria com o corpo, com o coração e com a alma.

Sorria.

Porque aquelas flores era o jardim enfim cultivado.

Era o florescer de algo forte.

Era amor.

FIM

I'm SorryWhere stories live. Discover now