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— Vamos matá-lo. – Amábile se levantou do sofá, dando efeito às suas palavras, como se estivesse em um palco. Aquela não era a reação que estava esperando ao contar detalhes da minha vida que ninguém conhecia.

— Você tá brincando, não é?

— Não. Se existe algo que eu odeie no mundo, é escrotice. Ele não merece a vida. E depois que a gente se livrar dele, poderemos ter nossa noite de sexo em paz.

— Você é muito louca. – Tive que rir. Como ela ainda conseguia pensar em sexo? Amábile conseguia ser convincente mesmo quando as maiores maluquices saíam de sua boca. Naquele momento, eu decidi que gostava dela.

— Não sou louca. Eu sou interessante. – Deu então uma pausa de efeito, olhando-me em seguida. – Você sabe que estou falando sério, não?

— Você tá bêbada. Você não quer mesmo matar alguém...

— Eu vou queimar no inferno de qualquer forma... Nesse momento, quero ir para lá com estilo. – Ela piscou com um dos olhos em minha direção.

— Você é doente.

— Defina doente. – Foi a resposta que recebi ao que deveria ser o mais perto de um insulto que já saiu da minha boca. Eu não estava pronta para o seu sarcasmo, o que não seria novidade para ninguém, então a definição requisitada foi dada através do meu silêncio. Amábile deu de ombros. – Quero um sorvete, tá afim?



Duas semanas depois, Amábile estava com o plano em mãos. Aliás, mais do que um, mas ela tinha um favorito. O plano era simples: veneno. Como ela conseguiu o potinho de arsênico que me entregou em tão pouco tempo eram outros quinhentos. Eu preferi não perguntar. Na verdade, apenas aceitei escutar seu plano, pois ela decidiu contá-lo em sua casa. Usei como desculpa para ver Gael.

Amábile me segredara que não havia mais chance de ele voltar com a Júlia. Como Gael estava em seu momento de fossa, tentando se recuperar do término real, começou a passar as tardes com nós duas. Amábile não gostava muito da ideia; logo notei que ela era um pouco possessiva em relação a ele. Um pouco não, muito. Mas eu já não me importava muito em não incomodar Amábile. Nem eu, nem Gael. Gostava da presença dele.

Só tomava o cuidado de não deixar que ele descobrisse nossos planos. Amábile, por sua vez, não tinha o mesmo cuidado. Às vezes parecia que ela fazia questão de tentar tocar no assunto toda vez que ele estava por perto, como se quisesse incluí-lo... ou talvez afastá-lo.

Quando, contudo, não percebi que ela acidentalmente deixou nossas anotações à vista, o plano de deixar Gael a par do nosso desejo de matar Tomás foi concretizado. O que ela não esperava era o que viria depois.

— Quem é Tomás?

— Padrasto dela...

Gael analisou os papéis enquanto caminhava de um lado para outro. Foram longos minutos de torturante silêncio. Achei que ali acabara minhas chances com ele. Se eu tivesse colhões para matar meu padrasto, podia matar qualquer outro que se relacionasse comigo.

— Tem só um problema. Arsênico é detectável. Não demoraria até chegarem até a gente... Ou melhor... – Ele apontou para mim – Você não está querendo se livrar dela também, está? – Não tinha parado para pensar no que aconteceria depois que Tomás morresse. Tinha pensado, ingenuamente, que tudo terminaria com a morte dele. Toda a dor. Mas era óbvio que haveria uma investigação.

— Por que todo mundo sempre assume o pior de mim? – Amábile perguntou, fazendo uma expressão de vítima.

— Chama-se gerenciamento de tempo. – Gael respondeu, sentando-se entre nós duas.

— Ha-ha-há, engraçadinho. Qual a sua sugestão?

— Vamos fazer parecer um acidente...

AmábileWhere stories live. Discover now