Quarenta e Três - Tentativa e Erro

19.9K 1.8K 1.4K
                                    


Quando criança, Corey gostava de assistir a canais de documentário. Havia muita inutilidade em meio a informações importantes. Outras eram apenas... Interessantes. Corey se lembrava com perfeição de um desses documentários de informação interessante que, estranhamente, naquele momento, veio à sua cabeça.

A cena de uma mulher deitada em uma maca, em uma sala completamente branca, cheia de luzes azuis, era nítida. Em meio à narração de como havia acontecido sua morte, uma imagem translúcida da mulher se desprendia de seu corpo e, por fim, flutuava sobre ele. Corey se lembrava de ter escancarado a boca, assustado, e em seguida ter tampado os olhos com as mãos, deixando uma pequena brecha. Então uma imagem da mulher aparecia na tela, e ela contava como, nos breves segundos antes que a morte a atingisse, havia visto toda sua vida passar em frente a seus olhos, como um filme... A narração seguia para sua experiência pós-morte e a viagem que realizara pelo paraíso.

Corey ficara extasiado com aquele particular episódio de seu documentário favorito. Lembrava ainda da vontade absurda que teve de morrer e ressuscitar, apenas para vivenciar o que aquela mulher sortuda havia vivenciado. Corey queria ter a chance de ver toda sua – naquela época, breve – vida passando diante de seus olhos... Gostaria de relembrar suas festas de aniversário e o dia em que seu time de futebol havia sido campeão mundial. Gostaria de sair de seu próprio corpo, vagar por aí como uma alma, e depois retornar, guardando as lembranças de tudo o que havia aprendido no além.

No entanto, com o passar do tempo, Corey mudou bastante seus conceitos quanto à morte. A vida havia sido dura com ele nos últimos três anos, porém não queria que ela acabasse tão cedo. Não queria uma experiência pós-morte e muito menos ver toda a sua vida passando diante de seus olhos em um filme mal feito e retorcido... Contudo, a morte não era uma escolha, era um fato. E, de fatos, o ser humano simplesmente não pode fugir.

Sentado na cama velha daquela cabana, Corey começou, inconscientemente, a se recordar de momentos de sua vida. Lembranças antigas vinham tão nítidas, que era como se as tivesse vivido no dia anterior. Os anos felizes de sua infância, os anos rebeldes de sua adolescência, os poucos anos bem aproveitados de sua juventude... Os três anos de inferno que vivera preso no St. Marcus Institute... Os momentos com Melissa. Tudo se misturava em sua cabeça, em um turbilhão saudosista e, àquela altura, desesperador.

Esperava não ser a morte anunciando sua proximidade...

Corey sabia que algo daria errado, e não demoraria muito. Embora não acreditasse em baboseiras como "pressentimentos" e "premonições", entendia bem a razão de seu peito estar tão apertado há tanto tempo, que a respiração se tornava quase impossível; de seu coração bater tão acelerado, que achava que iria parar a qualquer segundo, cansado demais para continuar; de suas mãos suarem e tremerem, dominadas por uma inesperada crise de ansiedade.

Era difícil enfrentar o fato de que, depois de três anos, o fim do inferno que havia se transformado sua vida estava muito próximo. Corey sabia que, mesmo que saísse vivo, não estaria bem. Nunca mais estaria bem. Por mais que a presença de Melissa fosse um remédio poderoso contra sua insanidade, Corey sofrera chagas demais, para que não deixassem feias e grossas cicatrizes. Cicatrizes permanentes, que atormentariam sua vida, perturbariam a paz interior que há muito havia sido perdida. Contudo, ao pesar os prós e os contras, o fim era um alento, e ele estava feliz.

A espera, entretanto, era uma tortura pior do que a ansiedade de não saber o que aconteceria a partir dali. Se tudo o que havia sido planejado daria certo, ou se seria o fracasso que seu pessimismo acreditava piamente. Após a absurda fuga que, estranhamente, obtivera sucesso total, Corey não achava que teria a sorte de escapar ileso mais uma vez.

Porém, por uma questão de honra própria, lutaria até o fim, para sair com vida e fazer justiça com as próprias mãos. Fazer Danny Langdon confessar a barbaridade de sua autoria, que levara a vida de uma inocente. A vida de Barber.

Psicose (Livro I)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora