Tonico fortalecedor Crina-Forte (14)

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Era indescritível.

O navio vinha se aproximando da terra nas últimas horas e agora finalmente chegou ao porto. Haltr havia observando durante cada momento, e ainda assim, não conseguia entender bem o que via. Para quem havia passado a vida inteira em porto negro, uma vila pequena no meio do nada, Turach, era algo muito, muito estranho.

Haltr mal conseguia compreender o que estava vendo, tinha literalmente vertigens ao tentar compreender aquele lugar. Era enorme, era mais do que enorme, era colossal, ao menos na visão dele. O porto era a parte mais baixa da cidade, junto ao mar, mas ela parecia crescer, se espalhar montanha acima. Não morro acima, montanha acima. Ia se elevando e elevando até o cume distante. Deveria durar horas de caminhada para chegar até o topo. E em cada lugar que olhasse havia uma casa, elas pareciam se encarapitar uma em cima da outra, mas não apenas casas, torres, torreões, igrejas enormes de pedra, castelos e fortalezas - sim, mais de um - se destacavam acima das construções comuns. Pela inclinação parecia que alguns poderiam cair devido ao modo íngreme como se erguiam, e se caíssem descendo montanha abaixo levariam metade da cidade consigo. Havia uma explosão de cores, milhares, nas roupas que as pessoas usavam, nas roupas estendidas em varais, em bandeiras com brasões nobres. Até mesmo na sujeira se via cores, o limo verde que crescia em algumas muralhas, a fuligem preta em chaminés. E as pessoas, mais do que ele jamais viu juntas em um só lugar, andando pelas ruas íngremes que subiam a montanha, parecendo coisinhas pequenas que mal se via, lá em cima. E isso tudo ele viu ainda dentro do navio.

- Eu amo esse cheiro de bosta. Dizia Tegthan como se estivesse aliviado - O fedor de Turach.

Haltr sentiu também, não saberia dizer se era exatamente bosta, mas a cidade tinha um cheiro bem característico, praticamente com personalidade própria. A impressão geral até tendia a um cheiro ruim, mas era mais profundo do que um simples mal odor. Havia escondido naquele cheiro toda uma história, que falava sobre milhares de pessoas e animais, especiarias raras, perfumes, e nenhum esgoto. Fedor era uma palavra relativa quando se sentia aquele cheiro. A palavra cabia, mas era o mesmo que dizer que termalina era só uma rocha, tecnicamente estava certo, mas não fazia jus a verdade.

- Eu não sei não... - dizia Haltr fazendo uma uma leve careta - sempre cheira assim?

- Esse é o cheiro de uma cidade honesta. - Dizia Tegthan com orgulho, perto da mureta do navio.

- Honesta?! - questionou Halgen, que também estava próximo - Ouvi falar que o crime corre solto por esse lugar.

- Exato, é uma cidade que mostra para o que veio. Não esconde sua índole, ela simplesmente é.

- Hã? - Haltr não entendeu onde o cavaleiro queria chegar com aquilo, parecia mais um dos momentos em que Tegthan demonstrava seu lado excêntrico. - ela é honesta por que tem crime? Isso não faz sentido!

- Sempre há sujeira, em todo lugar, sempre. A diferença é que em Turach ninguém finge que sua merda não fede.

-Bem, fede mesmo! - Retrucou Haltr.

Halgen pareceu incomodado com aquela conversa, ele não ia com a cara de Tegthan desde que tudo aquilo que aconteceu em porto negro. Sempre o evitava e se recusava a falar do feiticeiro. Haltr achava que Halgen temia ele, acreditando que tinha tido algo haver com os enks.

- Depois que você junta um certo número de pessoas em um lugar, as que estão no fundo já não conseguem mais te ouvir. Se juntar dez vezes o primeiro número, as que estão no fundo já não conseguem mais te ver. Quando você junta o número de pessoas que há em Turach... - Tegthan deixou as palavras no ar e sorriu.

- O que acontece? - perguntou Haltr morrendo de curiosidade.

- O que acontece o que? - perguntou Tegthan distraído.

Entre a escuridão e a auroraOnde as histórias ganham vida. Descobre agora