Prólogo

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A chuva de capelos começou logo que o orador escolhido pela turma soltou um grito de comemoração por finalmente terem chegado àquele momento. Sob os inúmeros capelos pretos, uma garota olhava para o céu completamente azul apreciando o momento tão esperado, ignorando o fato de ter se tornado uma piscina de suor sob aquela beca preta desconfortável. Ela recebeu os abraços de alguns colegas próximos, recebendo e dando os parabéns pela tão merecida formatura e para os planos do futuro, independentemente de quais fossem eles. Ela nunca fizera grandes amizades na faculdade, até tentara, mas no final a vida se dividiu entre estudos e o trabalho para se sustentar na grande cidade, e as amizades ficaram para os raros momentos de trabalhos em grupo.

Após recolher um capelo que ela julgou ser o seu, fez o caminho pela fileira de cadeiras até chegar ao final, ainda sorrindo e trocando congratulações com quem passasse por ela. Seus olhos estavam mais ocupados em procurar as três pessoas que havia convidado e de quem com certeza os parabéns interessariam mais. Não demorou para encontra-los sob uma árvore, aproveitando a sombra fresca que os protegia do sol do meio de tarde. De quem fora a ideia de fazer a entrega do diploma tão perto do meio-dia?

- Ai está nossa formanda! – Comemorou o rapaz, poucos anos mais novo que ela, recebendo-a de braços abertos para um abraço apertado. – Parabéns, Charls!

- Obrigada, Ted! – Respondeu a moça, sorrindo para o irmão enquanto recebia um beijo no rosto. Logo depois se dirigiu às outras duas pessoas, recebendo um abraço duplo.

- Parabéns, querida, estamos orgulhos de você. – O homem, bem mais velho, disse.

- Muito orgulhosos. – A mulher reforçou, fazendo a mais nova rir, tentando conter as lágrimas.

- Obrigada, pai, mãe. – Disse ela, puxando o irmão para um abraço entre a família.

O grupo ainda permaneceu ali mais um tempo, tendo que dar meia-volta quando ouviram a recém-formada ser chamada por um homem mais velho, a moça se desculpou, entregando a beca e o capelo para a mãe segurar e andou até onde o homem estava, mantendo o sorriso educado.

- Senhorita Davis, parabéns pela formatura.

- Obrigada, senhor Donnelly. – Respondeu a mulher, retribuindo o aperto de mão do professor.

- Gostaria de saber se podemos conversar sobre seu futuro aqui na universidade.

- Agora? – Perguntou Charlie.

- Se não tiver outros planos. – Ele olhou a família da mulher um pouco afastada. – Sua família?

- Sim, mas eles não vão se importar em esperar, não depois que souberem sobre o que se trata. – Charlie sorriu, virou para a família e fez um sinal indicando que eles esperassem. Ela e o professor se afastaram um pouco, o homem colocou as mãos nos bolsos e olhou para a ex-aluna.

- Eu li o seu projeto de pesquisa para o mestrado. – Começou ele. Charlie o olhava com atenção, as mãos se remexiam devido ao nervoso. – Você tem uma ótima visão, e é muito ousada, se me permite dizer.

- Ouvi muito isso durante a reta final do curso. – Disse a mulher, sorrindo sem graça.

- Espero que não de forma negativa. – O professor disse. – Se alguém lhe disse isso de forma negativa, saiba que pode ignorá-lo. – A mulher acenou, lembrando-se de alguns professores que haviam tentando fazer com que ela desistisse da visão que tinha para seu projeto final de pesquisa da graduação, e reforçavam a recomendação assim que ouviam a mulher falando que planejava dar continuidade ao projeto. – Eu gostei muito do seu projeto, a respeito por pensar fora da caixinha, como dizem por ai.

- Obrigada, senhor. – Disse ela, sentindo o coração batendo acelerado. O professor era seu favorito desde que tivera uma aula com ele no primeiro semestre, nos semestres seguintes, toda vez que tinha oportunidade ela tentava pegar outras disciplinas lecionadas por ele. – Isso significa muito vindo do senhor, acredite.

- Estou lisonjeado, senhorita Davis. – O professor disse, inclinando a cabeça levemente como forma de agradecimento. – Então, eu gostaria de saber se a senhorita já tem planos para dar continuidade aos estudos.

- Bem, como o senhor sabe, eu entreguei meu projeto de pesquisa para o mestrado assim que foi possível, e gostaria muito de dar continuidade se fosse possível. O senhor é o primeiro que vem conversar comigo a respeito.

- Ótimo. – Disse o professor. – Como a senhorita sabe, eu trabalho no Laboratório de Processamento de Linguagem aqui da universidade, e seu projeto se encaixa perfeitamente com minha linha de pesquisa. Gostaria de saber se a senhorita teria interesse em integrar meu grupo de pesquisa para dar continuidade aos seus estudos e nos auxiliar a melhorar nosso próprio projeto.

Charlie não conseguiu esconder a surpresa, sentindo as mãos suarem e tremerem, além do coração batendo acelerado. Era seu sonho, desde que entrara na universidade e conhecera o professor e sua linha de pesquisa, entrar no grupo que ele mantinha, e ali estava ela, recebendo um convite pessoal para poder realizar seu mestrado como integrante do grupo. Se não estivesse frente a frente ao homem, a mulher com certeza daria gritos, pulos e choraria de alegria. Mas naquela situação, ela se limitou a sorrir e agradecer imensamente ao professor pela grande oportunidade, aceitando-a de pronto, sem considerar que talvez pudesse receber outros convites. Ela sabia que nenhum outro seria melhor que esse. O professor lhe entregou o cartão que continha seu e-mail e anotou as informações que Charlie deveria enviar para ele para oficializar o processo do mestrado. Logo depois se despediram, com a mulher esperando o professor sumir na multidão para ir correndo até os pais e irmão e lhes contar a grande novidade.

- Você nunca vai parar de me deixar orgulhoso? – Perguntou Ted, abraçando a irmã que, apesar de mais velha, era mais baixa que ele.

- Tenho que ser um bom exemplo para você. – Disse a mulher, o sorriso mal cabendo em seu rosto.

Enquanto saiam da área onde a cerimônia havia ocorrido, Charlie parou e virou de costas para o grupo, contemplando o prédio imponente onde havia passado boa parte de seus dias nos últimos quatro anos, e onde passaria os próximos dois anos. A mulher sorriu e permitiu que algumas lágrimas de felicidade escorressem, estava tudo ocorrendo perfeitamente como ela havia planejado.

Babá por AcidenteWhere stories live. Discover now