Rasgo - Parte 3

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Dei um passo atrás, tentando estimar a magnitude do investimento do Apanhador de Almas. Pude ver ouro em meio à montanha de prata. Uma das bolsas sangrava gemas brutas.

— Os cabelos — exigiu o Apanhador.

Caolho pegou os fios. O Apanhador os colocou nas laterais da cavidade, que tinha o tamanho de uma cabeça. Deu um passo atrás e deu as mãos a Caolho e Duende.

Eles fizeram magia.

Tesouro, mesa e pedra começaram a emitir um brilho dourado.

Nosso arqui-inimigo era um homem morto. Metade do mundo ia tentar receber aquela recompensa. Era grande demais para resistir. Até seu próprio pessoal ia se virar contra ele.

Eu vislumbrei uma única e mínima chance para Rasgo. Ele poderia roubar o tesouro para si mesmo. Seria difícil, porém. Nenhum profeta rebelde conseguiria derrotar as magias de um Tomado.

Eles completaram o encantamento.

— Alguém teste o feitiço — pediu Caolho.

Houve um estalo maligno quando a ponta da adaga de Corvo penetrou o plano das pernas da mesa. Ele praguejou, fez uma careta para a arma. Elmo estocou com a espada. Crack! A ponta da lâmina emitia um brilho branco.

— Excelente — concluiu o Apanhador de Almas. — Levem a carroça daqui.

Elmo designou um soldado. O resto fugiu para o quarto que Duende tinha alugado.

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Primeiro nós nos ajuntamos na janela, esperando que alguma coisa acontecesse. Isso ficou chato muito rápido. A cidade de Rosas só foi descobrir a condenação que preparamos para Rasgo depois do amanhecer.

Empreendedores cautelosos encontraram cem maneiras de tentar faturar o dinheiro. Multidões vieram apenas para assistir. Um bando dedicado começou a escavar a rua para chegar ao local por baixo. A polícia os expulsou.

O Apanhador de Almas se sentou ao lado da janela e não saiu dali.

— Tenho que modificar os feitiços. Não antecipei tamanha engenhosidade — disse-me certa vez.

Surpreso com minha própria audácia, perguntei:

— Como é a Dama? — Eu tinha acabado de escrever um dos meus rascunhos de fantasias.

Ele se virou devagar e me fitou brevemente.

— Algo que morderá aço. — Era uma voz de mulher despeitada. Uma resposta estranha. Então: — Tenho que impedi-los de usar ferramentas.

E lá se foi minha chance de conseguir um testemunho em primeira mão. Eu deveria ter imaginado. Nós mortais somos apenas meros objetos para os Tomados. Nossas curiosidades lhes são supremamente indiferentes. Eu me retirei para meu reino secreto e seu círculo de Damas imaginárias.

O Apanhador de Almas modificou as magias protetoras naquela noite. Na manhã seguinte havia cadáveres na praça.

Caolho me acordou na terceira noite.

— Temos um cliente.

— Hum?

— Um cara com uma cabeça. — Ele estava satisfeito.

Cambaleei até a janela. Duende e Corvo já estavam lá. Nós nos esprememos em um canto. Ninguém queria chegar muito perto do Apanhador.

Um homem atravessou a praça abaixo. Uma cabeça pendia da mão esquerda dele, presa pelos cabelos.

— Eu me perguntei quanto tempo ia demorar antes que isso começasse — comentei.

— Silêncio — sibilou o Apanhador. — Ele está lá fora.

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