Corvo - Parte 3

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Não foi realmente preciso que Pança voltasse da vanguarda para nos dizer que estávamos perto. De todo o horizonte à nossa frente brotavam altas e inclinadas espirais de fumaça. Esta parte de Forsberg era plana, aberta e maravilhosamente verde. Contra o céu azul-turquesa, os pilares oleosos eram uma abominação.

Não havia muita brisa. A tarde prometia ser abrasadora.

Pança emparelhou com o Tenente. Elmo e eu paramos de trocar velhas e surradas mentiras e escutamos. Pança indicou uma das torres de fumaça.

— Ainda há alguns homens do Manco naquela vila, senhor.

— Falou com eles?

— Não, senhor. O Cabeça achou que o senhor não iria gostar. Ele está esperando perto da cidade.

— Quantos deles?

— Vinte, 25. Bêbados e cruéis. O oficial era pior que seus homens.

O Tenente olhou por sobre o ombro.

— Ah, Elmo. É seu dia de sorte. Pegue dez homens e vá com Pança. Dê uma olhada.

— Merda — murmurou Elmo. Ele é um bom homem, mas dias ensolarados de primavera o deixam preguiçoso. — Certo. Otto. Calado. Pirralho. Branquelo. Bode. Corvo...

Tossi discretamente.

— Você deve estar maluco, Chagas. Tudo bem. — Ele contou rapidamente nos dedos e chamou mais três. Entramos em formação fora da coluna. Elmo nos deu instruções rápidas, para ter certeza de que todos sabiam o que fariam. — Vamos lá.

Partimos adiante da coluna. Pança nos levou até um bosque com vista para a aldeia devastada. Cabeça e um sujeito chamado Fanfarrão nos esperavam lá.

— Alguma novidade? — indagou Elmo.

Fanfarrão, um sarcástico profissional, respondeu:

— Os incêndios estão morrendo.

Olhamos para a aldeia. Tudo que vi embrulhou meu estômago. Animais de criação abatidos. Gatos e cachorros massacrados. As silhuetas pequenas e partidas de crianças mortas.

— Não as crianças — disse eu, sem perceber que estava falando. — Não os bebês de novo.

Elmo me olhou espantado, não porque não estivesse comovido também, mas porque eu estava demonstrando uma solidariedade incomum. Já tinha visto muitos homens mortos. Não me expliquei. Para mim há uma grande diferença entre adultos e crianças.

— Elmo, eu tenho que ir até lá.

— Não seja burro, Chagas. O que você poderá fazer?

— Se eu puder salvar só uma criança...

— Eu vou com ele — anunciou Corvo. Uma faca apareceu na mão dele. Deve ter aprendido o truque com um conjurador. Faz isso sempre que está nervoso ou com raiva.

— Vocês acham que podem enganar 25 homens?

— Chagas tem razão, Elmo. — Corvo deu de ombros. — Isso precisa ser feito. Algumas coisas não podem ser toleradas.

— Então vamos todos — Elmo se rendeu. — Torçam para que eles não estejam bêbados demais para diferenciar amigos de inimigos.

Corvo saiu a galope.

A aldeia era de bom tamanho. Ela tivera mais de duzentas casas antes da chegada do Manco. Metade estava queimada ou queimando. Cadáveres jaziam espalhados pelas ruas. Ao redor de seus olhos sem vida moscas se aglomeravam.

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