Apresentação

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Não gostamos de sentir dor, mas todos nós a experimentamos em algum nível.

Seja na perda de um familiar. Perda da mãe, da avó, perda de um filho, perda do pai.

Ou talvez, perda de um dedo, perda de um braço, perda das duas pernas.

Até a perda da dignidade, perda da honra, perda de um amor, perda da esperança.

Perda de um emprego, perda de um bem. Perda de um objeto, para algumas pessoas é uma dor dolorosa demais. Depende de quanto valor damos a cada coisa que ocupa espaço entre nossas posses. Quanto maior o valor, maior a dor. Mentimos para nós. Odiamos perder! Perder é doloroso.

A palmada no filho, dói no filho e dói no pai. Educar, também causa dor.

Uma bofetada pode doer, quando ela não é merecida, dói mais que uma facada.

Quando que sentimos dor? Sempre!

Uns admitem que a vida dá mais do que tira e foda-se.

Outros vão à Igreja, pedir ressarcimento, cura e consolação. Da mesma forma é a atribuição pelas conquistas ou desgraças: à Deus, aos santos, ao governo ou a si. Perdoem-me, mas esse último é o único responsável. Benção e maldição são coisas humanas.

Até onde vou e até onde fui para conhecer do que sou capaz?

Prefiro aceitar a simplicidade das coisas ou as explicações fantásticas?

Prefiro ir além, mas tenho medo do que posso descobrir?

Prefiro ir tão fundo quanto for possível? Será que tenho coragem?

Sem um pouco de sacrifício, prosseguimos no raso, com a água pela canela. Saímos da água e tudo que sobra é secarmo-nos.

Mais profundamente, descobriremos coisas horríveis e também maravilhosas, e com isso a resiliência.

Conhecemos a nós?

Em que nível?

Todos temos a mesma profundidade.

Não nos exploramos. Nunca conheceremos o EU mais escondido de nós.

Nem todos conhecemos nossas camadas mais profundas.

Não conhecemo-nos profundamente.

Somos rasos para uns. Somos profundos para outros. Somos nosso próprio Universo.

Até onde vai nossa coragem?

Amarrado e dominado pelo medo, eu não podia ser insolente. Mas eu fui, porque precisava desafiá-lo a fim de conhecer seus limites. Minha nudez lhe incentivava a ser perverso, mas ele não prosseguiria sem que eu o provocasse. Foram tantos anos comigo a lhe dominar, lhe pisar e sufocar que nunca esperei o revide.

Estou atado à cruz de Santo André, onde lhe prendia para os açoites que o levavam aos urros de um tipo de prazer animalesco e selvagem. O rebatizei de Vênus, pois desejava punir a entidade que morava dentro de seu corpo. O demônio da luxúria, o touro representante da virilidade, o carneiro que representa a fertilidade... Na sua cabeça eu punha uma pesada máscara de touro, montando-o e penetrando de forma punitiva, mantendo-o de quatro como um bicho selvagem ao chegar em minha morada.

Hoje ele quer me golpear, mas hesita. Que me solte para ser punido por sua insolência, a qual passou a temer quando se esqueceu de seu nome. Vênus, eu lhe cuspo na cara, ele se enfurece e me esbofeteia. Rio tão alto, ele passa a bufar com ódio. Não há leveza aqui em nossa "casinha", me corrijo, no nosso covil.

Ele sempre perde quando tenta tomar meu lugar, é fraco, logo sua posição é merecida. Será castigado como ama e odeia... tão logo me soltar.

Vênus me solta, é tão débil... há medo no olhar escuro, há medo nas pernas nuas que fraquejam, há medo no cair de joelhos frente a cruz na qual me atou quando se tornou desesperado, há medo no sangue que escorre do último ferimento em suas costas, eu vejo quando ele cai de bruços em minha frente e chora... tantas cicatrizes que me remetem a lembranças dolorosas e excitantes. Cada risco que ali gravei, cada xingamento que a mordaça dele absorveu e cada olhar mortífero que recebi, cada uma dessas coisas nos aproximou.

A loucura nos aproximou. Provamos que jamais suportaríamos o limite de todas as coisas, porque a carne não resiste e o espírito precisa dela.

Ele conhece a mim como o conheço. Nem são tantos anos assim. Porque o tempo é uma contagem e não um fator que determina o conhecer. Conheço-o e o possuo, tanto quanto ele nem imagina me possuir.

...

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