— Entenda Doutora Clara... — Insiste o Gonçalo.
— Estou a falar! – Ergue a mão, exigindo silêncio — A próxima vez que forem tão insolentes aqui, será automaticamente registado no relatório de estágio! Depois vocês resolvam com os vossos coordenadores! – Faz uma pausa – Onde é que já se viu, dois veterinários promissores suspensos da formação devido a egos inflamados! Ganhem juízo e não voltem a brincar comigo! – Olha-nos irritada — Podem sair!
Agora ele foi longe de mais! Uma coisa são as nossas desavenças pessoais, outra é pôr em causa o meu árduo esforço de anos de trabalho, porque não sabe lidar com a rejeição!
— Tu, vestiário, já! – Estou completamente possessa.
— Doutora Mia... — Começa logo que ficámos a sós.
— Não venhas com "Doutora Mia" para cima de mim, vais continuar com esse espectáculo triste? Sinceramente julguei-te muito mal... és um fedelho mimado que não consegue lidar com um não!
— Um Não? – Levanta a voz — Tu humilhaste-me ao esfregar-me com aquele tipo na cara!
— Pois és tão nobre tu...
— E sou! E mesmo assim preferiste um idiota qualquer que apareceu na tua vida aos trambolhões, a mim! Eu, que te daria o Mundo e mais! Deves estar mesmo desesperada! — Fala com raiva e tem o maxilar contraído.
— Somos mesmo hipócritas, não somos? – Encurto a distância — Tu querias o mesmo que ele, a única diferença é que ele não andou para aí a fingir que era meu "amigo" só para me levar para a cama! Foste um falso a fazer-te de bonzinho e agora queres uma medalha por isso!
Cruza os braços, ficou sem argumentos.
— Vou-te fazer a vida negra aqui Mia! – Ameaça inquieto.
— Faz... faz o pior que conseguires! – Cerro os dentes — Contudo aviso-te que sou uma vencedora e nasci para percorrer este caminho e não és tu nem ninguém que me vai impedir de chegar ao meu destino! Nem que eu tenha de sair deste estágio e esperar mais um ano para obter nova vaga! No final, no plano geral da minha vida, não vais passar de uma má memória e serás facilmente esquecido!
— Tinhas coragem de abandonar o estágio? – Abre mais os olhos.
— Se não conseguir dar o melhor que consigo porque me estão a minar o trabalho, nem penso duas vezes! Não vou perder o meu tempo a conviver com pessoas como tu para ter uma avaliação medíocre!
— Vamos tentar ter um pouco de calma. – Fala baixo e abana as mãos. Não acredito que depois disto tudo, ele quer mesmo que eu me acalme? Quase que me faz rir.
— Eu dispenso qualquer tipo de sugestão vindo da tua parte, por isso fale comigo apenas o estritamente necessário Doutor Gonçalo. — Viro-lhe as costas.
E eis que aparece o metralha número dois! A Susana coloca-se entre mim e a porta.
— Não te vamos deixar em paz e já agora não tenho medo de ti! — Declara com uma boa dose de coragem. Deve ter ensaiado em casa a frase, imagino-a em frente ao espelho a praticar até achar que estava convincente!
Não escondo o riso perante aquela tentativa patética de intimidação. — Mas devias! — Aviso. E continuo a andar. Ela afasta-se rapidamente para o lado, caso contrário, furiosa como estou, vai á frente!
Abandono o vestiário, não quero estar nem mais um segundo perto daqueles dois! Esta conversa deixou-me com os nervos á flor da pele! Encaminho-me ao recobro, onde as gatinhas estão a recuperar da cirurgia, vou fazer-lhes companhia! Isso vai ajudar-me a relaxar!
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Até Que o Sol Nasça Para Todos
RomanceMia Aires é veterinária em formação e uma obstinada activista. Rodrigo Fontes é um jornalista, com os pés assentes na terra, cuja missão é fazer uma reportagem sobre a Causa da Mia e do seu grupo. Do encontro entre estes dois seres tão diferentes s...
17. Até que o Sol nasça para Todos
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